quarta-feira, 30 de maio de 2012

O ministério do Espírito – parte 2


Capítulo VII

O Espírito nas reuniões da Igreja

A partir do dia de Pentecostes, o Espírito Santo ocupa uma posição inteiramente nova. Toda a administração dos assuntos da Igreja de Cristo, desde aquele dia, foi delegada a Ele... ofício que Ele exercerá soberanamente, de acordo com as necessidades que surgirem. Há somente um outro grande evento para o qual as Escrituras nos ordenam que olhemos, a segunda vinda do Senhor. Até lá, vivemos na era de Pentecostes, e sob o governo do Espírito Santo. — James Elder Cumming, D. D.

2. O Espírito Santo na adoração e nas reuniões da igreja.

Haverá alguma coisa que somos chamados a fazer, da mais elevada à mais simples, em relação à casa de Deus, da qual o Espírito Santo não é o agente nomeado? É verdade que os crentes são os instrumentos pelos quais Ele age; mas eles não têm função nenhuma à parte da inspiração e da direção dEle. Para tornar isso claro, vamos considerar as várias partes das reuniões da igreja como normalmente são conduzidas, reparando a ligação que têm com o seu divino Ministro.
(1)  A pregação - é, por consentimento geral, um importante fator da obra do ministério, tanto do pastor como do evangelista. Em que consiste a sua inspiração e autoridade? Pedro expõe de forma simples o método apostólico: (1 Pe 1.12).

pelo Espírito Santo enviado do céu, vos pregaram o evangelho

O verdadeiro pregador não é o que usa o Espírito Santo, mas é aquele que é usado pelo Espírito. Ele fala como alguém que se move no elemento e na atmosfera do Espírito Santo, e que é controlado pelo Seu divino poder.
É nesse aspecto que o sermão se diferencia infinitamente do discurso, e o pregador, do orador. Paulo enfatiza claramente esse contraste na carta aos coríntios. O único assunto da sua pregação, diz ele, era “Jesus Cristo e este crucificado”, e a única inspiração da sua pregação, o Espírito Santo: (1 Co 2.4).

“A minha palavra e a minha pregação não consistiram em linguagem persuasiva de sabedoria, mas em demonstração do Espírito e de poder

O que quis dizer Philip Henry, quando resolveu “pregar Cristo crucificado de forma crucificada”? Possivelmente mais do que ele pensou ou sabia. Ele “dará testemunho de mim”, é o que Jesus diz a respeito do Paráclito prometido. O Consolador dá testemunho dAquele que foi crucificado. Nenhum outro assunto no púlpito tem assegurada a Sua cooperação. Filosofia, poesia, arte, literatura, sociologia, ética e história são assuntos que atraem a atenção de muita gente, e aqueles que lidam com esses temas no púlpito podem até apresentá-los com palavras atraentes da genialidade humana; mas não há garantia de que o Espírito Santo dê o aval do Seu testemunho a essa apresentação. A pregação da Cruz possui a garantia da demonstração do Espírito, como não o tem nenhum discurso secular, ou moral, ou mesmo religioso. Quando Paulo escreve aos tessalonicenses: (1 Ts 1.5),

“o nosso evangelho não chegou até vós tão-somente em palavra, mas, sobretudo, em poder, no Espírito Santo e em plena convicção

Precisamos lembrar que “nosso evangelho” significava uma única coisa para Paulo, a apresentação de Jesus Cristo crucificado no meio do povo. Se virmos isso, teremos encontrado o segredo do poder do Evangelho. Não deverá ser, então, essa a suprema questão do pregador, os assuntos que com certeza garantem o testemunho do Espírito Santo, em vez dos assuntos que atraem a atenção do povo? Coloquemos lado a lado o pregador popular e o pregador apostólico, e avaliemos qual recompensa queremos escolher: admiração geral do povo, ou o testemunho de Deus, “por sinais, e milagres, e várias maravilhas, e dons do Espírito Santo, distribuídos por sua vontade” (Hb 2.4)? O sermão aprovado com aplausos e aclamações, ou a Palavra recebida “com alegria do Espírito Santo” (1 Ts 1.6)? Admiração pelo pregador por parte de todos os que ouviram o discurso, ou cair “o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra” (At 10.44)? Não há palavras que descrevam a gravidade do assunto que estamos ventilando. A presente geração está rapidamente perdendo a compreensão do sobrenatural; como conseqüência disso, o púlpito está rapidamente descendo ao nível da plataforma do discurso. E cremos que esse declínio deve-se, mais do que a qualquer outra coisa, à desconsideração do Espírito Santo como o supremo inspirador da pregação. Queremos ver um grande orador no púlpito, esquecendo-nos que o menor expositor da Palavra, quando cheio do Espírito Santo, é maior do que ele. Com certeza, queremos o evangelho; mas na tenaz tentativa de que seja apresentado de acordo com o “espírito desta era”, desconsideramos a supremacia do “Espírito de Deus”. E o método do discurso logo se impõe nesse assunto. Não há como manter por muito tempo a verdade no púlpito depois que perdemos ali “o Espírito da verdade”. Vinet diz: “Aquele que não possui a totalidade da vida também não possui a verdade por completo”.
Em tudo que dissemos, não estamos desconsiderando o elemento humano na pregação, nem subestimando o estudo e o treinamento mental santificado como preparação desse nobre ofício. Estamos unicamente destacando o extremo perigo de considerar como principal aquilo que Deus fez inferior. O Espírito Santo é quem ergue o pregador muito acima do homem extremamente capacitado. O pregador que levou com um só sermão três mil pessoas à fé no Cristo crucificado, respondeu por antecipação a pergunta daqueles que, reparando apenas na elaboração humana do seu sermão, talvez perguntem qual foi o segredo do seu poder. Ele revela o segredo numa simples e curta frase:

“pelo Espírito Santo enviado do céu”.

(2)  A oração - é um dos elementos mais vitais da adoração na igreja de Deus. “Senhor, ensina-nos a orar como também João ensinou aos seus discípulos”. Jesus satisfez literalmente esse pedido dos Seus discípulos. Assim como João, sob a lei, podia somente dar regras e noções, por não haver ainda chegado a dispensação da graça e do Espírito, assim Jesus lhes deu um modelo de oração, uma lição sobre a “técnica de adoração”. Mas é somente quando chega à noite anterior à Sua morte, quando anuncia a chegada do Consolador, que Ele introduz os discípulos ao coração e ao mistério do grande assunto, ensinando-os a orar como João não podia ter ensinado aos seus discípulos. “Até agora nada tendes pedido em meu nome”, disse Jesus em Seu discurso pascal. Mas agora que Ele estava prestes a começar o Seu ofício mediatório à direita de Deus, e prestes a enviar o Consolador para os Seus discípulos, Ele podia conceder esse alegre privilégio: (Jo 16.23).

“se pedirdes alguma coisa ao Pai, ele vo-la concederá em meu nome” [1] Essa expressão equivale a dizer “em mim”.

É evidente que não significa usar o nome de Jesus como uma senha ou como amuleto, mas é participar da Sua pessoa e adequar-se à vontade dEle; de forma que quando oramos será como se o próprio Jesus estivesse na presença de Deus intercedendo. Nem é “como se” — é o próprio fato. Somos identificados com Cristo por meio do Espírito que foi enviado, e a Sua vontade é forjada dentro de nós pelo Espírito Santo, de tal forma que pedir a Ele aquilo que desejamos é pedir aquilo que Ele deseja para nós. Ficamos cheios da Sua vontade porque somos inspirados pelo Seu Espírito, que vive e sussurra dentro de nós. É por isso que podemos saber que somos sempre ouvidos, uma vez que estamos nAquele que pode dizer com toda ousadia ao Pai: “Eu bem sei que sempre me ouves”. É a mediação de Cristo para com o Pai, e a mediação do Espírito Santo para conosco, que nos dá o alto privilégio de orar em nome de Jesus, como está escrito:

“porque, por ele, ambos temos acesso ao Pai em um Espírito”.

Por isso, quando lemos mais tarde, nas epístolas, onde a doutrina é exposta mais plenamente, “com toda oração e súplica, orando em todo tempo no Espírito” (Ef 6.18), e “orando no Espírito Santo” (Jd 20), entendemos que essas são simplesmente admoestações para usar o privilégio de pedir em nome de Jesus. Pois estar no Espírito é estar em Cristo, unido à Sua pessoa, identificado com a Sua vontade, revestido da Sua justiça, de forma que estamos diante do Pai como se fosse o próprio Senhor Jesus.
Em Romanos 8, onde encontramos a mais completa exposição da doutrina do Espírito, vemos claramente que o ministério do Consolador consiste em operar em nós aquilo que Cristo realiza por nós no trono. Isso é especialmente verdade com respeito à oração. Na Epístola aos Hebreus, lemos: (Hb 7.25).

“Por isso, também pode salvar totalmente os que por ele se chegam a Deus, vivendo sempre para interceder por eles”

Na Epístola aos Romanos, lemos: (Rm 8.26,27).

“Também o Espírito, semelhantemente, nos assiste em nossa fraqueza; porque não sabemos orar como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós sobremaneira, com gemidos inexprimíveis. E aquele que sonda os corações sabe qual é a mente do Espírito, porque segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos

Essas passagens, lidas em conjunto, claramente mostram o Espírito fazendo em nós a mesma coisa que Cristo está fazendo no céu por nós. E, além disso, elas nos revelam o método usado pelo Cristo glorificado para ajudar aqueles que não sabem como orar quando devem orar, ensinando-os, não por meio de um método exterior, mas pela direção interior. De fato, a oração inspirada pelo Espírito Santo muitas vezes é tão profunda que não pode ser expressa em palavras comuns, mas chegam aos ouvidos do Pai unicamente em suspiros sem palavras, em gemidos inexprimíveis (oh, Senhor). A tônica de toda intercessão verdadeira é a vontade de Deus. Na oração dos discípulos, como o Senhor lhes ensinou, ouve-se distintamente essa nota: “faça-se a tua vontade, assim na terra como no céu”. Na oração que o Salvador fez no Getsêmani, ouve-se outra vez essa nota, quando com forte clamor e lágrimas o Filho de Deus exclama: “não seja como eu quero, e sim como tu queres”. E na revelação da doutrina da oração por meio de um apóstolo inspirado lemos: “se lhe pedirmos alguma coisa conforme a sua vontade, ele nos ouve”. A mais profunda obra do Espírito Santo no crente é harmonizar a sua mente a essa elevada nota, uma vez que “segundo a vontade de Deus é que ele intercede pelos santos”. Há uma promessa que todos os discípulos gostam de citar quando querem segurança nas orações: (Mt 18.19).

“Em verdade também vos digo que, se dois dentre vós, sobre a terra, concordarem a respeito de qualquer coisa que, porventura, pedirem, ser-lhes-á concedida por meu Pai, que está nos céus”

A palavra traduzida como “concordarem” é muito significativa. É a palavra grega “sumfwnhswsin”, de onde vem nossa palavra “sinfonia”. Se dois estão de acordo ou estão em sinfonia quanto ao que pedem, eles têm a promessa de que serão atendidos. Mas, da mesma forma que todas as notas de um órgão precisam estar ajustadas ao diapasão, senão se torna impossível a harmonia, assim também acontece com a oração. Não basta que dois discípulos concordem um com o outro; eles precisam estar em harmonia com a terceira Pessoao justo e santo Senhor — para que possam concordar em intercessão no verdadeiro sentido bíblico. É possível haver concordância em assuntos inteiramente pecaminosos, em total discordância da vontade de Deus, como se vê na pergunta de Pedro a Safira, esposa de Ananias: (At 5.9).

“Por que entrastes em acordo [sunefwnhyh a mesma palavra] para tentar o Espírito do Senhor?”

Ali havia mútuo acordo, mas flagrante desacordo com o Espírito Santo. Ao contrário do que aconteceu nesse incidente, é o ministério do Espírito Santo harmonizar a nossa vontade com a de Deus; e é somente assim que se pode orar no Espírito.
Por essa razão, não é possível dar ênfase demasiada ao ministério do Espírito na direção do culto na casa de Deus. Usar formas litúrgicas é recair no legalismo, é consentir em ser ensinado a orar “como João ensinou aos seus discípulos”. É verdade que pode haver formas improvisadas bem como formas escritas, orações decoradas bem como orações lidas num livro. A esses hábitos nós contrapomos o mais elevado ensino do Espírito, que é privilégio da atual dispensação, na qual o Pai procura adoradores que o adorem “em Espírito e em verdade”. Orar de forma correta é a mais alta das realizações. E isso é assim porque o segredo se encontra entre estes dois opostos: um espírito intensamente ativo e ao mesmo tempo intensamente passivo (submisso); um coração que prevalece diante de Deus porque foi conquistado por Deus. Vemos isso na oração de um grande santo:

“Ó Senhor! Meu espírito, esta manhã, era como uma harpa, produzindo música diante de Ti, porque Tu primeiro afinaste o instrumento pelo Espírito Santo, e então escolheste o salmo de louvor que devia ser tocado nele”.

São extremamente solenes e sugestivas as palavras do Senhor Jesus: “são estes que o Pai procura para seus adoradores”. Em meio a toda repetição de formas e monotonia das liturgias, quão intensamente o Altíssimo procura aquele que O adora em espírito, com um coração contrito diante de Deus, com um espírito tão sensível às operações secretas do Espírito Santo que, quando os lábios falam, o fazem expressando a oração eficaz que pode muito em seus efeitos!
Se alguém argumentar que aquilo que estamos dizendo é elevado demais para ser prático, talvez seja bom confirmar nossa posição com o testemunho da experiência. As coisas que dissemos não se referem especificamente às orações feitas no púlpito. O sacerdócio universal dos crentes, tão claramente ensinado pelas Escrituras, constitui a base da intercessão comum, pois “orar uns pelos outros” é a característica distintiva da dispensação do Espírito Santo. Por isso, a reunião de oração, na qual o corpo todo dos crentes participa, provavelmente se aproxime mais do padrão da adoração dos cristãos primitivos do que qualquer outra atividade que temos como igreja. Se aplicarmos o nosso princípio aqui, então, qual é o método mais satisfatório? Será que o culto deve ser planejado de antemão, uma pessoa escolhida para orar, outra para exortar; e durante o andamento da adoração, deve alguém ser chamado para dirigir as orações, e depois outro em seguida? Em resumo, deve-se planejar a reunião com antecedência e determinar como deve desenvolver-se, conforme se acha conveniente e oportuno? Alguém, depois de muitos anos de experiência, pode dar poderoso testemunho do valor de outro caminho — o caminho de exaltar o ministério do Espírito Santo como o condutor da reunião, e dessa forma restringir a pressão humana na assembléia, para que o Espírito tenha a mais alta liberdade de mover um para orar e outro para dar testemunho, este para cantar e aquele para dizer “amém depois da tua ação de graças”, conforme a Sua própria soberana vontade. (2 Co 3:17) 

“Ora, o Senhor é o Espírito; e, onde está o Espírito do Senhor, aí há liberdade”.

Aqui não estamos falando de teoria, mas de forma prática, experimental. O fervor e a espiritualidade e a doce naturalidade deste último método tem-se mostrado muito mais do que uma possibilidade, e isso depois de prolongadas tentativas em ambos os caminhos, o primeiro sendo trilhado por desconhecer caminho melhor, em constante esforço e inquietação e aflição, e este último com indizível calma e conforto e refrigério espiritual.

Q             Honremos o Espírito Santo como o Senhor da assembléia;
Q             Apliquemo-nos para conhecer o segredo da entrega a Ele;
Q             Cultivemos um ouvido pronto para ouvir a Sua voz interior e uma língua pronta para dar o Seu testemunho audível;
Q             Sejamos submissos para guardar silêncio quando Ele proíbe, bem como para falar quando Ele ordena, e aprenderemos quão melhor é o caminho de Deus do que o caminho do homem, ao conduzir a adoração da Sua casa[2].

“Continua..........”




[1] Enquanto o Senhor Jesus não tinha sido glorificado, era impossível orar ao Pai em nome dEle. A possibilidade de fazê-lo é um privilégio peculiar à dispensação do Espírito Santo. — Alford.
[2] Seríamos muito beneficiados se prestássemos mais atenção à voz da história cristã em questões como esta. É muito sugestivo o surgimento de seitas como os “Quietistas”, os “Místicos”, os “Amigos”, e os “Irmãos”, que dão ênfase à “voz tranquila” e à “direção interior”. Se nós não avançamos tanto quanto alguns desses avançam na insistência de falar apenas quando são movidos de maneira perceptível pelo Espírito, talvez precisemos ser admoestados quanto à forma rígida, artificial e humana de adoração, que tornou necessário o protesto dessas seitas.

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