quinta-feira, 28 de julho de 2011

ESTUDO DA EPÍSTOLA DE PAULO AOS EFÉSIOS

CAPÍTULO 22

A Experiência da Plenitude

“... e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” (Ef 3:19)

Ao darmos continuidade a este grande assunto, gostaria de insistir em que nos lembrássemos de que estamos tratando de algo essencialmente prático. O apóstolo que escreveu estas palavras era um mestre e um pastor. Ele não escreveu com a finalidade de incentivá-los a discutirem doutrina; escreveu sua epístola com o fim de ajudá-los em sua vida e em seu viver diário. Algo essencialmente prático, uma realidade concreta, está aqui diante de nós. Esta oração do apóstolo em favor dos efésios é a questão mais urgentemente prática para a consideração da Igreja Cristã na hora presente.

Receio que é próprio acrescentar que a Igreja não percebe isso, pois, temos a idéia que ser prático é entregar-se à atividades. Não é esse o ensino do Novo Testamento. Se realmente desejamos fazer algo para Deus, então, de acordo com o ensino do Novo Testamento, não devemos começar de imediato; primeiro devemos certificar-nos que somos cheios da plenitude de Deus, e do poder que, disso resulta. Um exemplo disso é o próprio apóstolo Paulo, não começou a agir a partir do momento em que foi convertido. Antes de começar seu ministério passou três anos na Arábia. Todavia, quando se retirou da Arábia, veio cheio da plenitude de Deus e de poder. Ele não subscreveu o moderno lema: “dê ao recém-convertido algo para fazer”.

A mesma coisa tem-se repetido muitas vezes na história doutros servos de Deus através dos séculos. Em certo sentido, nunca houve homem mais ocupado que João Wesley antes de 1738; quando da sua experiência singular na Rua Aldersgate, Londres, quando seu coração “aqueceu-se estranhamente” todo o seu ministério mudou. Percebia que lhe faltava poder, e especialmente que lhe faltava o conhecimento de Cristo que certos irmãos morávios tinham. Foi só depois que lhe foi dada a certeza de que os seus pecados foram perdoados, que Deus o usou de maneira extraordinária.

O homem verdadeiramente prático não é o que está sempre alvoroçado, mas sim, é o que está sendo usado por Deus o Espírito Santo. Ah, se a Igreja fosse levada a compreender isso! Este é o avivamento de que a Igreja necessita. Somente quando ela for avivada pelo Espírito é que se tornará poderosa. A Igreja precisa da plenitude de Deus – a única maneira pela qual ela poderá ser levada à verdadeira atividade prática.

Recentemente dei com uma declaração que me pareceu atingir em cheio a verdade de muitos cristãos dos dias atuais. O escritor escreveu: “A religião parece fazer parte do quintal da vida, não examinado e quase não utilizado”. Ele se referia aos que estão na Igreja. Sua religião parece estar nos fundos, e não na frente das suas vidas, no centro. Não é isso que o apóstolo pede em oração para os efésios? A fé cristã não é um fundo de reserva a que você possa recorrer. Não é algo que se possa descrever como “não examinado e quase não utilizado”.

Sabemos o que é ser “fortalecidos com poder” pelo Seu Espírito no homem interior? Estaria Cristo habitando “... pela fé em nossos corações”? Sabemos nós, com todos os santos o “comprimento e a largura, a altura e a profundidade” deste amor de Cristo que ultrapassa o conhecimento, para que sejamos “cheios de toda a plenitude de Deus”? É central em nosso pensamento? Onde o cristianismo entra em nossas vidas? É algo que só lembramos domingo de manhã, e que nos esquecemos durante toda a semana? É algo de que você só se lembra de vez em quando? Ou é o centro, “a razão de ser” da nossa vida, existência e atividade? Paulo ora para que seja isso; para que, de fato, conheçamos toda a plenitude de Deus.

No entanto, que é que isso significa na prática? Que significa experimentalmente? Já examinamos o assunto doutrinariamente; agora vamos examiná-lo experimentalmente e de um ponto de vista prático. Que será próprio de um homem cheio de toda a plenitude? Significa que Deus domina o nosso pensar, as nossas emoções e as nossas ações externas. Deve-se pensar no homem em termos da sua mente, do seu coração e da sua vontade. Se somos cheios de toda a plenitude, significa que Deus está no controle.

Tudo isso significa, primeiro e acima de tudo, que o nosso pensamento é dominado por Deus e pela mente de Deus. Tomem, por exemplo, a declaração de Paulo aos Romanos 12:2:

“E não vos conformeis com este século, mas transformai-vos pela renovação da vossa mente, para que experimenteis qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus.”

Notem a menção que Paulo faz da “renovação da mente”. As nossas mentes nunca são livres. Não existe isso de “livre pensamento”. Alguns afirmam que a mente do homem é livre, porém isso não passa de uma ilusão do homem em pecado. Por natureza, e como resultado do pecado, a mente é sempre dominada pelo mundo e pela perspectiva do mundo. A diferença entre o cristão e o incrédulo é que, a mente do incrédulo é dominada pelo mundo, a do cristão foi “transformada” e “renovada” pelo Espírito Santo. O resultado é que agora o cristão pode pensar de maneira espiritual, ao passo que anteriormente não podia. Vê-se uma exposição clara desta verdade em 1 Coríntios 2:16:

“Pois quem conheceu a mente do Senhor, que o possa instruir? Nós, porém, temos a mente de Cristo.”

O apóstolo quer dizer que, se formos cheios de toda a plenitude de Deus, e se Cristo habitar pela fé em nossos corações, então teremos “a mente de Cristo”. Isto é inevitável! O homem que é cheio de toda a plenitude de Deus é que pode “pensar espiritualmente”. Acaso está claro para nós a diferença entre pensar naturalmente e pensar espiritualmente? O cristão não tem somente uma nova perspectiva, tem também o novo modo de pensar, um novo tipo de pensamento. Segue-se disso uma boa prova essa porção da Escritura que estamos considerando, sentimo-la estranha, ou ela nos fala? O apóstolo pensava de modo espiritual, e ele não escreve segundo as palavras do pensamento do homem, mas de acordo com o Espírito. Naturalmente, se não tivermos a mente renovada, transformada, estas coisas serão loucura para nós. Entretanto, para o homem em que “Cristo habita”, que tem em si esta “plenitude de Deus”, cuja mente agora está sendo dominada e governada por Deus, estas coisas são “tudo” e são o seu “maior deleite”.

É por isso que o homem cujo intelecto foi revestido da graça de Deus pode pensar espiritualmente e compreender as Escrituras. O novo homem em Cristo tem um sentido espiritual, uma percepção espiritual, que o capacita a seguir e a compreender a verdade espiritual a qual não significa nada para o homem natural.

O segundo elemento posto sob domínio é a parte emocional do nosso ser, onde sedia a emoção. O homem em quem habita toda a plenitude de Deus é dominado pelo amor de Deus. Noutras palavras, quando Deus domina os nossos corações, deixamos de ser governados pelo ego. Quando o amor de Deus entra, o ego sai. Vemos isso no apóstolo Paulo em 1 Coríntios 4:3, nos diz assim:

“Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós ou por tribunal humano; nem eu tampouco julgo a mim mesmo.”

Que transformação! Houve tempo em que ele era sensível ao julgamento e á crítica. Ele julgava os outros, mas detestava ser julgado. Mas tudo mudara. Por quê? Porque fora cheio do amor de Deus! O antigo amor do ego tinha desaparecido. Ele foi dominado por Deus.

Da mesma maneira, a vontade é dominada por Deus, bem como todas as nossas ações e atividades. O nosso senhor diz de si em João 6:38:

“Porque eu desci do céu, não para fazer a minha própria vontade, e sim a vontade daquele que me enviou.”

O Filho de Deus não Se agarrou ás Suas prerrogativas; humilhou-Se, fez-Se um servo, pôs de lado a Sua vontade, e tudo quanto dizia e fazia era determinada pela vontade do Pai.

Isto caracterizava também o apóstolo Paulo. Veja o que nos diz em Atos 20:22-24, quando se despedia dos presbíteros da igreja de Éfeso:

“E, agora, constrangido em meu espírito, vou para Jerusalém, não sabendo o que ali me acontecerá, senão que o Espírito Santo, de cidade em cidade, me assegura que me esperam cadeias e tribulações. Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para testemunhar o evangelho da graça de Deus.”

Sua vontade perdera-se inteiramente na vontade do se Senhor. Mais adiante em Atos 21:13, vemos uma repetição do que dissera em Éfeso:

“Que fazeis chorando e quebrantando-me o coração? Pois estou pronto não só para ser preso, mas até para morrer em Jerusalém pelo nome do Senhor Jesus.”

Ele não tinha vontade própria; sua vontade se absorvera na do seu Senhor; ele a entregara, e na dEle ela desaparecera. Ele era inteiramente governado pela mente, pelo coração e pela vontade do Senhor Jesus Cristo que habitava pela fé em seu coração.

Tudo isso é o primeiro resultado de sermos “cheios de toda a plenitude de Deus”. Quando a plenitude de Deus habita em nós. A mente, o coração e a vontade são subjugadas e governadas pelo Senhor Jesus Cristo.

No momento em que nascemos de novo, que somos regenerados, em que este novo princípio é posto em nós, no momento em que nos tornamos participantes da natureza divina, novos instintos, desejos, alvos, objetivos vêm à existência. Estes começam a agitar-se dentro de nós! No momento em que temos esta vida em nós, começamos a ter um desejo que nunca tínhamos conhecido antes de conhecermos a Deus. Não digo conhecer “acerca de Deus”, mas “conhecê-lO”. Este era o conhecimento que o salmista nos revela (Sl 42:1-2):

“Como suspira a corça pelas correntes das águas, assim, por ti, ó Deus, suspira a minha alma. A minha alma tem sede de Deus, do Deus vivo; quando irei e me verei perante a face de Deus?”

Conhecemos este desejo? Este desejo está sendo satisfeito? Não conhecer algo acerca dEle abstratamente, teoricamente, de modo que se pode falar e discutir sobre Ele, porém uma intimidade, algo direto, um verdadeiro conhecimento de Deus!

Nalgum grau, este desejo deve estar em todo Filho de Deus. Ele continua tendo interesse por outras formas de conhecimento; no entanto, são todas “secundárias”, em relação a este desejo de conhecer o Senhor. Deveria ser este o assunto da nossa meditação diária.

Outro desejo instintivo é o anseio por ter capacidade para servir ao Senhor e glorificar o Seu nome. Mais poderosamente ainda, Paulo conta como era governado por isso em Colossenses 1:28,29:

“o qual nós anunciamos, advertindo a todo homem e ensinando a todo homem em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos todo homem perfeito em Cristo; para isso é que eu também me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo a sua eficácia que opera eficientemente em mim.”

O apóstolo sabia o que era ser movido pelo emocionante poder de Deus mediante o Espírito Santo. Permita-me dizer que não há nada debaixo do céu que seja mais bem-aventurado do que conhecer algo do poder do Espírito Santo. Lamento por aqueles que nunca o experimentaram quando pregavam e procuravam expor as escrituras. Há uma diferença quase inexprimível entre pregar com o próprio poder, pregar com o poder do Espírito. Quando somos cheios de toda a plenitude de Deus, todos os nossos instintos e alvos espirituais são satisfeitos. O hino de Johann Caspar diz assim:

“Ó Senhor Jesus Cristo, cresce tu em mim e as outras coisas se retirarão

Expressa o anseio por ser liberto, por ser posto em liberdade do ego e do pecado, da vergonha, do fracasso e da fraqueza, e ser “cheio de toda a plenitude de Deus. Todos estes novos instintos são satisfeitos quando somos cheios dessa plenitude.

Finalmente, quando um homem é “cheio de toda a plenitude de Deus”, vai-se toda a sensação de carência, de vazio, de insuficiência. Lembra o que o nosso Senhor disse à mulher samaritana em João 4:13,14:

“Quem beber desta água tornará a ter sede; aquele, porém, que beber da água que eu lhe der nunca mais terá sede; pelo contrário, a água que eu lhe der será nele uma fonte a jorrar para a vida eterna

Nunca terá sede”! Como poderão ter sede, se estão “cheios de toda a plenitude de Deus. Mas o nosso Senhor não se contentou em dizer isso uma só vez. Ele repete em João 6:35:

“Eu sou o pão da vida; o que vem a mim jamais terá fome; e o que crê em mim jamais terá sede.”

Você está com fome? Está com sede? É infeliz? Não está bem? Se você se sente assim significa que você não se mantém na busca do Senhor Jesus. “Aquele que vem a mim” significa “aquele que persevera em vir a mim”. Como é que pode ter fome ou sede, se a própria vida, a vida de verdade, a vida mais abundante, está dentro de você?

Paulo disse na prisão “bastante tenho recebido, e tenho em abundância”. “Cheio estou! Naturalmente que está! Ele está cheio de toda a plenitude de Deus.

Isto é pessoal, é Deus, Cristo habitando em nós. Portanto, concentre-se na Pessoa. Dirija-se à Pessoa do Senhor. Fale com Ele. Espere nEle, passe tempo com Ele. Ele lhe dará da Sua plenitude. Isso é cristianismo.


Por: D.M Lloyd Jones

Nenhum comentário: