quarta-feira, 27 de outubro de 2010

EXPOSIÇÃO SOBRE EFÉSIOS



CAPÍTULO 27

CIDADANIA CELESTIAL

Por. D. M. Lloyd Jones

"Assim que já não sois estrangeiros, nem forasteiros, mas concidadãos dos santos, e da família de Deus." - Efésios 2:19

Com estas palavras o apóstolo coloca diante de nós as glórias, os privilégios e as vantagens de ser membro da Igreja Cristã. Esse é, na verdade, o tema de todo o capítulo. Anteriormente ele estivera interes¬sado em tratar do mecanismo, da maneira pela qual isso fora tornado possível tanto a judeus como a gentios, e agora ele medita na realidade propriamente dita, e está desejoso de que estes efésios a usufruam com ele e venham a entendê-la e a dar-se conta do seu significado. Ele sabe, e lhes dissera no capítulo primeiro, que isto somente será possível quando "os olhos do seu entendimento forem iluminados". Sem isso, é completamente impossível.
Para as pessoas cujos olhos não foram iluminados pelo Espírito Santo, a Igreja é tão-somente uma instituição. Eles podem gostar dela como instituição, podem gloriar nela como instituição, mas não é isso que o apóstolo gostaria que estas pessoas vissem. Ele ora no sentido de que os olhos do seu entendimento fossem iluminados para que elas soubessem qual "a esperança da sua vocação, e quais as riquezas da glória da sua herança nos santos; e qual a sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos" (1: 18). Já iniciamos a nossa conside¬ração deste versículo mostrando como o apóstolo ressalta a vital importância de estarmos absolutamente certos de que estamos na posição descrita neste versículo. Não podemos esperar compreender os privilégios da posição se não soubermos em que consiste a posição, e se não estivermos completamente seguros de que estamos nela. Vimos a importância de saber com certeza que não somos mais estranhos e estrangeiros, de saber, como me aventurei a colocá-lo, que não residi¬mos mais baseados num passaporte, e sim que realmente nós temos as nossas certidões de nascimento, que realmente somos membros da Igreja. A minha opinião é que, se tão-somente nos déssemos conta do que é ser cristão e membro da Igreja Cristã, muitos dos nossos proble¬mas, senão todos seriam imediatamente resolvidos. Se tão-somente pudéssemos subir às alturas da nossa alta vocação em Cristo Jesus e dar¬-nos conta de que ocupamos esta posição, as picuinhas e os problemas se tomariam inimagináveis; despencariam, seriam indignos de conside¬ração. Pois bem, em certo sentido, esse é o argumento de todas as Epístolas do Novo Testamento. Todas essas Epístolas foram escritas para igrejas, para membros das igrejas, e o que cada uma delas faz é precisamente o que venho dizendo. Todas elas começam dando-nos um quadro descritivo da nossa posição como membros da Igreja Cristã, e depois, tendo feito isso, elas dizem: bem, agora, à luz disso, obviamente é assim que você tem que viver. Essa é a análise de cada uma das Epístolas do Novo Testamento.
Portanto, certamente não há nada que seja mais importante hoje, de todos os pontos de vista, do que compreendermos estas coisas. É importante para nós pessoalmente. Muitas das nossas aflições, dificul¬dades e tribulações, muitos dos nossos problemas seriam encarados de maneira inteiramente diferente, se de fato nos víssemos como somos em Cristo. E, mais importante ainda, se toda a Igreja simplesmente compre¬endesse o que ela é, já estaria na estrada real de chegada a um verdadeiro avivamento e a um poderoso despertamento espiritual. É porque deixamos de compreender estas coisas que não oramos por avivamento como devíamos, e não o buscamos e não ansiamos por ele. Não é de admirar, então, que o apóstolo dê tanta ênfase a isto. Aqui ele o coloca na forma de várias figuras. Temos as três figuras apresentadas juntas, quase concomitantemente: a primeira, a Igreja como um grande Estado ou reino; sim, mas ela é também uma família; sim, e também um templo. Ele já nos dera antes uma figura na qual compara a Igreja a um corpo, um só corpo, um só novo homem. E vocês verão que, no capítulo cinco desta Epístola, ele usa ainda outra ilustração, pois nessa passagem ele diz que a relação entre a Igreja e o Senhor Jesus Cristo é a que existe entre uma esposa e o seu esposo. É interessante notar que, desse modo, o apóstolo usa uma variedade de figuras e ilustrações; e é importante entender a razão pela qual ele o faz. Toda e qualquer ilustração é insuficiente.


A verdade é tão grande, tão multifacetada, tão gloriosa, que ele se vê forçado a multiplicar as suas figuras e imagens. Cada uma delas comunica algum aspecto particular, e nos habilita a ver uma faceta peculiar da verdade não transmitida muito bem pelas outras ilustrações e figuras.





"Não sois estranhos e estran¬geiros"!
"Concidadãos dos santos"!

Passemos agora à primeira figura. "Não sois estranhos e estran¬geiros"! (V A), diz o apóstolo. Bem, nesse caso, o que somos? "Concidadãos dos santos"! Essa é a primeira figura. Que é que isso nos diz? Ensino deveras rico! Aqui ele compara a Igreja a uma cidade, ou a um Estado, ou a um reino. Não nos surpreende que o apóstolo tenha feito Isso. Naqueles tempos antigos havia grandes cidades-Estados, ou Estados-cidades; certas cidades eram, em si mesmas, verdadeiros Estados. Mas, acima e além disso, naturalmente, havia grandes Estados, grandes reinos, grandes impérios. Na ocasião em que escreveu esta carta, provavelmente o apóstolo era prisioneiro em Roma, a própria metrópole e centro nervoso do grande Império Romano. Roma era a capital, e tinha os seus povos espalhados por todo o mundo civilizado da época, com governadores e outros funcionários importantes pondo em execução as ordens e instruções do governo central e, em última instância, do imperador. Não admira, pois, que o apóstolo tenha pensado na Igreja como algo semelhante a isso. Ela é como um grande Estado, um grande império, um grande reino, e ele usa a ilustração para transmitir a estes efésios um ensino muito precioso.
Não se trata de uma nova idéia que de repente ocorreu ao apóstolo Paulo. É uma concepção muito importante que se acha na Bíblia toda. Há grandes seções das Escrituras que simplesmente não poderemos entender, a não ser que captemos esta idéia particular. Na vocação de Abraão - que é um dos grandes pontos divisórios da história - Deus estava dando os primeiros passos para a formação de uma nação para Ele próprio. Até aquela altura Deus tratava com o mundo inteiro, por assim dizer. Os onze primeiros capítulos do livro de Gênesis tratam do mundo todo e da história do mundo todo e de toda a sua população. Mas, no começo do capítulo doze de Gênesis, no chamamento de Abraão, o registro começa a tratar especial e especificamente da história de uma única nação. Ali nos é apresentada logo a idéia de que o povo de Deus é reino de Deus, nação de Deus - toda esta concepção de Estado. No capítulo dezenove de Êxodo repete-se muito claramente a mesma coisa. Pouco antes da entrega dos Dez Mandamentos e da lei moral, Deus disse a Moisés que o povo devia dar-se conta de que era uma "nação santa", que eles eram "cidadãos de Deus", que pertenciam a Ele, que Ele era o seu Rei, e eles o Seu povo. Isso deveria dominar toda a perspectiva dos filhos de Israel. Antes de levá-los e introduzi-los na terra prometida, Ele queria que eles compreendessem isso. Toda a tragédia dos israelitas foi que não o compreenderam. Nunca se aperceberam precisamente disso, que eles eram reino de Deus, um reino de sacerdotes, uma nação santa para Deus. E por causa da sua incompreensão, toda a sua tragédia desceu sobre eles, e deixou esculpida a triste imagem que deles vemos descrita no Velho Testamento. Contudo, ainda, se vocês forem ao livro de Daniel, verão esta concepção exposta de maneira sumamente admirável. É a grande mensagem daquele livro. Em todo ele lemos sobre reinos, lutas entre reinos e a relação deste reino de Deus com aqueles outros reinos; os animais que representam aqueles outros poderes - a Babilônia, que já existia, a Medo-Pérsia, a Grécia, e Roma, que surgiram mais tarde, ¬e este reino. Na verdade, a mensagem de todos os profetas era uma tentativa de inculcar nos filhos de Israel a sua peculiar relação com Deus como cidadãos do Seu reino eterno. Depois, quando vocês chegam ao Novo Testamento, vocês vêem que este é um tema central do ensino do nosso Senhor e Salvador Jesus Cristo. Vejam as Suas parábolas do reino. Ele sempre pensava em termos do reino. Ele dizia que tinha vindo para estabelecer um reino. Ele Se dizia Rei - e foi crucificado por dizê-lo, num sentido, num nível puramente secular. Todo o Seu ensino é sobre o reino e sobre pessoas entrando em Seu reino. Ele começa dizendo a Nicodemos: "Aquele que não nascer de novo, não pode ver o reino de Deus". Esse tema integra a Sua mensagem toda. O Sermão do Monte tem sido acertadamente descrito como o manifesto desse reino. E o tema se vê constantemente nos escritos do apóstolo Paulo. Vocês o verão igualmente na Primeira Epístola de Pedro. Ele cita as palavras do Êxodo, capítulo 19, e acrescenta: "Vós, que em outro tempo não éreis povo, mas agora sois povo de Deus" (l Pedro 2:9-10). Ele aplica isso a todos os membros da Igreja Cristã. E no livro de Apocalipse vocês vêem exatamente a mesma coisa. Está claro, então, que esta é uma doutrina vital na Bíblia; e, como povo cristão, convém que a estudemos, a compreendamos e a apliquemos a nós mesmos, para que nos gloriemos e nos regozijemos nela, como se espera que façamos. Qual é, então, o ensino?

Examinemo-lo assim: o que é que isso nos fala acerca de nós mesmos? Que espécie de definição da Igreja isto nos dá? É muito simples, se vocês tiverem uma clara concepção de um Estado ou reino ou cidade. A primeira coisa que este ensino salienta é que nós somos um povo que foi separado e tornado distinto de todos os outros. As cidades antigas tinham todas um muro ao seu redor, o muro da cidade. Vocês ainda podem ver restos e remanescentes destes muros em diversas cidades. Ainda existe uma parte desta cidade de Londres chamada Muro de Londres, e há outras cidades, como Cantuária e Chester, onde se vê a mesma coisa. Qual era o propósito do muro? Bem, era para separar os cidadãos. O muro os mantinha dentro e os outros fora. Havia portas que davam passagem através do muro da cidade; as portas eram fechadas numa certa hora e eram abertas noutra hora, na manhã seguinte. Toda a concepção da cidade, da comunidade política, dá a idéia de separar, retirar, pôr à parte, circunscrever, e até mesmo encerrar.
Ou, se vocês não quiserem pensar em termos de cidade, mas preferirem pensar em termos de países ou de Estados, sempre há limites ou fronteiras. Pode ser o mar, pode ser um rio ou uma cadeia de montanhas, ou pode ser uma linha de demarcação imaginária traçada por autoridades. Não importa qual seja, contudo sempre tem fronteira, e não se pode passar de um Estado a outro sem cruzar a fronteira. Você terá que passar pela alfândega e mostrar o seu passaporte e deixar que examinem os seus objetos, porque está na fronteira! Não se pode pensar num Estado ou numa cidade ou num reino sem fronteiras. E o dever das fronteiras é dizer a certas pessoas: até aqui, sim, mas não além deste ponto; e dizer aos que estão dentro das fronteiras: esta é a sua cidade, este é o seu país, esta é a terra a que vocês pertencem.
A importância desta doutrina deveria ser evidente por si mesma. Você não pode ser cristão sem ser uma pessoa separada. Você não pode estar no reino “de Deus” e, ao mesmo tempo, no reino "do mundo". Há este "ou - ou" fundamental, gostemos ou não. Este mesmo apóstolo lembra aos gálatas que Deus, no Senhor Jesus Cristo, livrou-nos do "presente século mau" (Gálatas I :4). Escrevendo aos colossenses ele diz: "O qual nos tirou da potestade das trevas, e nos transportou para o reino do Filho do seu amor" (1: 13). Que concepção tremendamente Importante é essa! Se somos cristãos, somos separados, não somos mais como os outros todos. Entretanto alguém poderá perguntar: mas isso não é ser farisaico? Não é ser orgulhoso? Nada disso! O fariseu separou-se, porém o fez de modo errado; o erro não estava na separação, estava no espírito com que ele a fez. Não estou defendendo a atitude do sou¬-melhor-que-você, mas o que estou dizendo é que, como cidadão do reino dos céus, sou diferente dos que não são cidadãos desse reino. Quão prontos estamos para afirmar isso ao nível nacional- sou inglês, ou lá o que seja! Temos todo o cuidado de ressaltar a distinção, que não somos outra coisa. E, todavia, quando passamos à esfera espiritual, há os que se opõem. Isso é ser estreito, dizem eles, é ser causador de divisão. Mas, sejamos coerentes, sejamos lógicos, acima de tudo sejamos bíblicos. Seja qual for o nosso pensamento a respeito, o fato é que, como cristão, como membro da Igreja, você foi tirado do mundo, você foi separado. E, se você não se der conta disso e não se regozijar nisso, haverá bom motivo para questionar se você é cristão afinal. É básico, é fundamental, é uma das primeiras coisas que deveriam ser óbvias.

“Os cidadãos estão ligados pela obedi¬ência a um governante”

Passemos a outra coisa, porém. O segundo ponto que sobressai necessariamente é que, portanto, os cidadãos estão ligados pela obedi¬ência a um governante, às autoridades, à lei e a certo modo de vida. Isto sempre caracteriza uma cidade, um Estado, um reino. Sendo assim separados, fomos separados para certos objetivos e propósitos especí¬ficos. Toda cidade sempre teve um chefe. Podia ser um rei ou alguém designado para isso, mas sempre havia um chefe. Todo Estado sempre teve um chefe, todo reino sempre teve um rei. Não há sentido em falar em reino se este não tiver rei. E são cidadãos do reino os que estão ligados pela obediência comum a esse Estado, a esse rei, a essa autoridade, presidente ou o que for. Como cidadãos, todos nós juntos reconhecemos isso. Há este vínculo comum, esta lealdade; temos estes interesses em comum.
Vemos a importância disso quando aplicamos o conceito à Igreja. Todos nós reconhecemos o mesmo Chefe, o mesmo Rei, eterno, sempiterno. Temos interesses comuns, os mesmos interesses. Reco¬nhecemos as mesmas leis. E por causa disso também temos lealdade uns para com os outros. Como direta conseqüência, há certas coisas que nos são peculiares e que não se aplicam aos outros. Isso é tão elementar que não tenho necessidade de salientá-lo. Naturalmente, é vital que compre¬endamos que não estamos falando simplesmente da Igreja externa, visível. O apóstolo, no contexto geral desta declaração, deixa claro que está pensando espiritualmente. Nunca percamos de vista este fato. Não estamos falando simplesmente da Igreja como organização, como uma organização externa, visível; a idéia do apóstolo é espiritual, mística e orgânica. Expressa-se externamente, mas o que é vital é este princípio interno. Pois, é possível ser membro da Igreja visível, externa, e, contudo, ter ignorância de Cristo, não conhecê-lO, não estar verdadei¬ramente, vitalmente relacionado com Ele. Que lástima! Sempre houve pessoas assim, e ainda há; foram criadas na igreja local, é tradição, é algo que faz parte da esfera social e suas modas, mas não é algo vívido, não é real. O coração delas está no mundo, não na Igreja.
Em certo sentido, a maior tragédia ocorrida na história da Igreja foi quando o cristianismo se tornou a religião oficial do Império Romano, e começou aquela fatal associação entre a Igreja e o Estado que daí em diante obscureceu e confundiu a situação. Perdeu-se esta idéia de separação, e o povo passou a pensar em termos de países cristãos, presumindo que todos os que são de um tal país são cristãos. Quão completamente contrário ao ensino de Paulo! Não, não é meramente o externo. O que Paulo quer dizer é que, como cristãos, somos cidadãos do reino de Cristo. Onde está o reino de Cristo? O reino de Cristo está onde quer que Cristo reine; portanto, o reino de Cristo pode estar no coração do indivíduo. Cristo reina nos corações de todos os que Lhe pertencem e se submetem a Ele. O reino de Cristo está na terra e no céu, em Seu povo. Seu reino não é deste mundo, é provisoriamente invisível, mas é real. O reinado, o governo e a autoridade de Cristo, onde quer que estejam, é o Seu reino. É disso que o apóstolo está falando. Cristo é o nosso Profeta, o nosso Sacerdote e o nosso Rei, e todos os que reconhecem o Seu governo e se inclinam diante dEle em obediência, são cidadãos do Seu reino eterno. O valor e a importância de se ver este assunto desse modo torna-se evidente quando nos damos conta de que ele nos diz que aqui e agora podemos ser cidadãos daquele reino, que durará para todo o sempre. Entramos nele agora, e continuaremos nele por toda a eternidade.

“os privilégios da nossa cidadania neste reino glorioso”

Vejamos agora um terceiro ponto, que é: os privilégios da nossa cidadania neste reino glorioso. Todos nós nos interessamos por privilégios, não é? Você conhece o tipo de homem que gosta de gabar¬-se de os ter e de que ele está "de bem" com os grandes. Ele poderá apresentar você, diz ele. Privilégios! Como os desejamos! Como gostaríamos de tê-los! Todo o mundo está louco por privilégios hoje. É resultado do pecado. Todavia, se você está interessado em privilégios, ouça isto: quais são os privilégios desta cidadania? O primeiro e maior privilégio é este - o nosso Rei. As pessoas se ufanam da sua cidadania, dos seus países e de certas coisas em particular. Citam a sua história, falam dos seus heróis; erigem monumentos em honra deles, escrevem sobre eles em livros. Orgulham-se da sua ligação com eles. Mas tudo isso empalidece, chegando à insignificância, quando comparado com os nossos privilégios como cidadãos do reino do céu. Acima de tudo o mais, nós nos gloriamos no fato de que temos um Rei que é "o Rei dos reis, e o Senhor dos senhores", o próprio Filho de Deus - o Rei do céu.
No entanto, continuemos a considerar a esfera deste reino. E este é um tema sumamente fascinante e maravilhoso. A esfera de todos os reinos terrenos é a terra, e o seu centro, a capital, é sempre na terra. Pertencemos à Grã- Bretanha, a uma comunidade de nações, e costumá¬vamos gabar-nos do fato de que os seus cidadãos estavam espalhados por toda a terra, e que o sol nunca se punha sobre o Império Britânico. Quão extenso, quão maravilhoso! E temos uma capital- Londres. E outras nações gabam-se de coisas semelhantes. Londres - Paris - Washington! Capitais! Poder sobre extensos territórios, amplo império e domínio! As nações têm grande orgulho disso, e muitas vezes as suas rivalidades e invejas as levam a conflitos. Isso mostra como apreciam o privilégio, e o orgulho que sentem pela esfera e pela extensão dos seus reinos. Mas por certo vocês recordam como o nosso bendito Senhor definiu e descreveu o Seu reino neste aspecto. Ele disse: "O meu reino não é deste mundo". Referiu-Se a ele como o reino do céu, ou "o reino dos céus". E o apóstolo, escrevendo aos Filipenses, diz: "A nossa cidade está nos céus" (3:20). Estamos na terra, porém a nossa cidadania é lá. Alguém traduziu essa frase com as palavras: "Somos uma colônia do céu". Sim, estamos na terra, mas agora simplesmente uma colônia; a nossa capital não é Londres, Paris ou Nova York, e sim o próprio céu.
A que cidade eu e você, como cristãos, pertencemos? Segundo o livro de Apocalipse, é a Nova Jerusalém, que vai descer do céu e estabelecer-se na terra - a Nova Jerusalém! É onde vive o Rei, onde Ele está assentado à mão direita da glória neste momento. Não uma Jerusalém terrestre, mas uma Jerusalém celeste, uma Jerusalém sempi¬terna. Que privilégio, pertencer a tão grande império, a tão amplo domínio! Contudo não é só verdade dizer que o quartel-general, a capital, é no céu. Os cidadãos deste reino estão espalhados pela terra toda. Inclui homens e mulheres "de todas as nações, e tribos, e povos, e línguas" (Apocalipse 7:9). Na expressão de Isaac Watts -

Povos de toda língua, e de toda nação,
Cantam sublime canto, em Seu amor estão.

Que reino! Que esfera! O romano orgulhava-se de ser cidadão romano. Os homens pertencentes a grandes impérios sempre mostraram o mesmo orgulho. Cristãos, apercebam-se de que são cidadãos de um reino como este! Quartel-general no céu; o Rei eterno, imortal, invisível, como o seu Rei! E cidadãos em todos os reinos, terras, continentes e climas! Onde quer que vivamos e seja qual for a nossa nacionalidade, não faz diferença. Pertencemos a Ele, o quartel-general é o mesmo - a Jerusalém celeste. Que reino glorioso! Que privilégio, ser cidadão de tal cidade!
Entretanto deixem-me mencionar outra coisa. Vocês notam como o apóstolo fala da nossa concidadania. "Assim que já não sois estranhos, nem estrangeiros, mas concidadãos dos santos" (V A). Pensem em seus concidadãos! Dos santos, diz ele - vocês são concidadãos deles. Quem são eles? Não é a nação de Israel como tal, porque "nem todos os que são de Israel são israelitas". Ele está pensando nos santos entre os filhos de Israel. O que Paulo quer dizer aqui é o que o homem que escreveu o Salmo oitenta e sete, versículos cinco e seis, tinha em mente quando disse: "E de Sião se dirá: este e aquele nasceram ali; e o mesmo Altíssimo a estabelecerá. O Senhor contará na descrição dos povos que este homem nasceu ali". Vocês vêem o que ele quer dizer? Ao nível natural, os homens se orgulham de pertencer a uma nação capaz de produzir um *Shakespeare - a terra de Shakespeare! A terra de Marlborough!* A terra de Wellington; a terra de Pitt; a terra de Cromwell - a terra desses gigantes que foram estadistas, poetas, artistas etc.! Que orgulho, pertencer a uma nação como esta- tais homens nasceram aqui, foram criados em nossa terra, ossos dos nossos ossos, por assim dizer, e carne da nossa carne. Mas a Bíblia diz: "O Senhor contará na descrição dos povos que este homem nasceu ali". É esse o povo ao qual pertencemos. Somos concidadãos de Abraão, o maior cavalheiro que já viveu, aquele que teve a distinção de ser chamado "amigo de Deus". Não seria uma coisa maravilhosa entender e saber que você pertence à mesma cidade, ao mesmo reino a que Abraão pertenceu? E não somente Abraão, mas também Moisés, Davi, Isaías, Jeremias, e todos aqueles valorosos homens do Velho Testamento. Pertencemos a eles, estamos na mesma cidade, temos estes interesses comuns e esta lealdade comum. Devo confessar que para mim é, talvez, a maior emoção perceber que sou um concidadão do apóstolo Paulo, que, como cristãos somos um com ele, que temos os seus interesses em nossos corações, e que as mesmas coisas que os moviam nos movem. E o veremos e passaremos a eternidade com ele, e com todos os outros apóstolos.
Pois bem, considerem a história da Igreja. Alegra-me pertencer ao mesmo grupo, ao mesmo reino a que pertenceram Agostinho, João Calvino, Martinho Lutero, John Knox, os puritanos, Whitefield, Wesley, e tantos outros mais. Somos todos um, pertencemos àquele grupo de pessoas. Já não somos do mundo, pertencemos a este reino separado, a este reino de sacerdotes, a esta nação santa. Permitam-me lembrar-lhes os versículos 22-24 do capítulo doze da Epístola aos Hebreus, que expressa isso com perfeição: "Mas chegastes ao monte de Sião, e à cidade do Deus vivo, à Jerusalém celestial, e aos muitos milhares de anjos; à universal assembléia e igreja dos primogênitos, que estão inscritos no céus,e a Deus, o Juiz de todos, e aos espíritos dos justos aperfeiçoados; e a Jesus, o Mediador de uma Nova Aliança ... ". É para onde vamos. Pertencemos a este lugar. Já não somos um pequeno reino na terra, aos pés do monte Sinai. Chegamos à Jerusalém celestial, a aos muitos milhares de concidadãos.
Mas, finalmente, para completar a figura, o último privilégio é compreender algo das expectativas futuras e da futura glória do reino. No presente ele parece fraco. Grandes multidões estão fora da Igreja, e muito cristão tolo é tentado a perguntar: devo continuar com isso, haverá de fato algo aí? Vou à igreja ou não vou? Quem diz isso não viu o real significado deste reino. Hoje somos uns poucos rejeitados e despreza¬dos, talvez, mas há uma glória vindoura. "Em ti", disse Deus a Abraão no princípio, "serão benditas todas as famílias da terra." Conte as estrelas do céu, se é que pode, disse Deus a Abraão; numerosa assim, e mais, será a sua posteridade. Conte os grãos de areia da praia do mar; inumeráveis assim serão os cidadãos do reino que se formará de você e da sua semente. Entretanto considerem também a mensagem dada ao profeta Daniel. Acaso vocês se lembram da visão que foi dada ao rei, a visão daquele grande poder que iria dominar o mundo e esmagar o povo de Deus - uma imagem com cabeça de ouro, peito e braços de prata, o ventre e as coxas de cobre, as pernas de ferro, e os pés em parte de ferro e em parte de barro? Esse poder deveria dominar altaneiro sobre a terra como um verdadeiro colosso. Mas esse não foi o fim. "Escrevas vendo isto", diz Daniel a Nabucodonosor, "quando uma pedra foi cortada, sem mão, a qual feriu a estátua nos pés de ferro e de barro, e os esmiuçou. Então foi juntamente esmiuçado o ferro, o barro, o cobre, a prata e o ouro, os quais se fizeram como a pragana das eiras no estio, e o vento os levou, e não se achou lugar algum para eles; mas a pedra, que feriu a estátua, se fez um grande monte, e encheu toda a terra" (Daniel 2:34-35). Esse é o reino de Deus, que começa como uma pedra desprezada, e como nada, diante de um poder colossal; porém ela o fere e o esmiúça, e ele desaparece; e a pedra se torna um grande monte, que enche a terra toda. Virá o dia, diz Paulo aos Filipenses-, em que "ao nome de Jesus todo joelho, dos que estão nos céus e dos que estão na terra, se dobrará, e toda língua confessará que Jesus Cristo é Senhor, para a glória de Deus o Pai" (2: 10-11). Diz João, no livro de Apocalipse: "O sétimo anjo tocou a sua trombeta, e houve no céu grandes vozes, que diziam: os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre" (11 : 15). E eu e você somos cidadãos desse reino. Este vencerá, prevalecerá.

Jesus reinará onde o sol
Faz seu sucessivo percurso.

E vocês sabem disso? Sabem que eu e vocês vamos reinar com Ele? E o que Paulo diz em 1 Coríntios, capítulo 6: "Não sabeis vós que os santos hão de julgar o mundo? Não sabeis vós que havemos de julgar os anjos?" É um reino inabalável. É um reino que não terá fim. É o reino eterno de Deus e do Seu Cristo. E eu e vocês, se somos cristãos, já estamos nEle, já somos seus cidadãos. Graças a Deus, ''já não somos estranhos e estrangeiros, mas concidadãos dos santos".

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