Capítulo 1
“Dignos da nossa Vocação”
Ef 4:1-3
Estas palavras introduzem não somente um novo capítulo, mas também uma nova e importante divisão desta Epístola aos Efésios. Para nossa conveniência, a Epístola foi dividida em seis capítulos, e o seu ensino pode ser dividido em duas partes de três capítulos cada.
A primeira seção, que consiste dos três primeiros capítulos, foi inteiramente doutrinária. O apóstolo esteve demonstrando as grandes doutrinas essenciais da fé cristã, tudo aquilo que é central e vital para a compreensão do meio de salvação. Pois bem, havendo feito isso, o apóstolo agora parte para a aplicação prática da sua doutrina; vai mostrar como a doutrina se relaciona com o modo de viver diário.
Ao empregar a palavra "pois", o apóstolo mostra claramente a conexão entre a fé e a prática. Ele firmara a doutrina; agora é preciso que ela seja aplicada. Então o apóstolo começa a fazer um grande apelo aos crentes efésios para que ponham em ação as coisas que lhes estivera ensinando. O meio de que Paulo se utiliza para fazê-lo é a palavra "pois". Veja Ef 1:1:
“Rogo-vos, pois, eu o preso do Senhor...”
"Pois" é uma palavra que, de maneira muito prática, diz-nos como ler as Escrituras. Devemos ler as Escrituras completas, cada parte das Escrituras. A palavra “pois” insiste em que devo aplicar esse ensino e prosseguir.
Esta palavra, pois é uma conjunção que nos leva adiante, e nos indica a vida que devemos viver a luz das doutrinas que já consideramos. Lembra-nos que a vida que nos compete viver é uma vida que sempre resulta da aplicação da doutrina. “Portanto” não somente me diz que eu tenho que me engajar na vida e no viver prático; diz-me também que o caráter e a natureza da vida que devo viver são determinados pela doutrina, e resultam da aplicação da doutrina. A doutrina sempre deve vir primeiro; e nunca devemos inverter essa ordem. Assim temos o direito de dizer que esta palavra “portanto” ou “pois” prepara-nos para a doutrina da santificação.
Os três primeiros capítulos da nossa Epístola, com todo o seu estupendo ensino, não trataram da “doutrina da santificação” como tal. É o "pois" do capítulo 4, versículo 1 º, que nos introduz na doutrina da santificação.
A doutrina do selo do Espírito, conhecer o amor de Cristo, ser cheio de toda a plenitude de Deus não é santificação. Essas coisas promovem a santificação, encorajam a santificação e nos dão motivos para a santificação; no entanto não “são” a santificação propriamente dita.
À luz desta palavra “portanto”, devemos dizer que a santificação não é um dom a ser recebido; é, antes, algo que tem que ser desenvolvido à luz da doutrina. É um imperativo, uma ordem. Todas as grandes experiências, às quais o apóstolo estivera fazendo referência e acerca das quais nos estivera ensinando, são simplesmente destinadas a incentivar-nos a "desenvolver" a nossa santificação, a nossa salvação. As doutrinas e as experiências dão-nos o motivo para a santificação. Sua intenção e objetivo é criar dentro de nós um desejo de santificação. Destinam-se a mostrar-nos a possibilidade de santificação, lembrando-nos o poder que opera em nós para podermos desenvolvê-la.
O apóstolo nos falara dAquele "que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além daquilo que pedimos ou pensamos, segundo o poder que em nós opera". Havendo nos lembrado isso, ele efetivamente diz: "A luz desta verdade, rogo-vos, desenvolvei-o, ponde-o em prática, ponde-o em ação".
Diz o apóstolo que lhes está rogando, está instando com eles, com o fim de estimulá-los. Ele entra em detalhes, ele exorta os efésios, repreende-os, ordena-lhes, apela para eles, argumenta com eles, lança os seus grandes imperativos.
Devemos ver as coisas para as quais fomos chamados, as gloriosas possibilidades que foram abertas para nós; e quanto mais as entendermos e as captarmos, mais prontos e deveras ansiosos estaremos para desenvolvê-las na prática. Queira Deus conceder-nos graça para entendermos o significado dessa poderosa palavra "portanto"! A nossa santificação é o resultado inevitável da doutrina e da experiência, graças à vida de Deus em nossas almas.
A nossa Vocação
Tendo visto como um verdadeiro entendimento da doutrina e da experiência cristãs leva ao desejo de viver uma vida santa, passamos agora a considerar o caráter da vida que devemos viver.
O caráter geral da vida é que ela deve ser "digna da vocação com que fostes chamados". Começamos, pois, com a descrição geral que Paulo faz do caráter da vida cristã: “Rogo-vos, pois, eu, o prisioneiro no Senhor, que andeis de modo digno da vocação a que fostes chamados”. Se tão-somente soubéssemos o que significam estas palavras, a maioria dos nossos problemas seriam resolvidos imediatamente. Cada palavra aqui é de grande importância e significação, de modo que devemos examiná-las uma a uma.
A primeira palavra é "digno", que significa: dignamente. Contêm duas idéias básicas, ambas importantes: A primeira idéia é a de igual peso, equilíbrio. Essa era a derivação original da palavra aqui traduzida por "como é digno". Paulo está rogando e exortando no sentido de que sempre atribuam suas vidas igual peso à doutrina e a prática. Os efésios deviam fazer tudo para ver que os “pratos da balança” estivesse perfeitamente equilibrados. É preciso haver verdadeiro equilíbrio, devemos ser "dignos da vocação com a qual fomos chamados". Veja o que o escritor aos hebreus diz a esse respeito, Hb 6:9-11:
“Quanto a vós outros, todavia, ó amados, estamos persuadidos das coisas que são melhores e pertencentes à salvação, ainda que falamos desta maneira. Porque Deus não é injusto para ficar esquecido do vosso trabalho e do amor que evidenciastes para com o seu nome, pois servistes e ainda servis aos santos. Desejamos, porém, continue cada um de vós mostrando, até ao fim, a mesma diligência para a plena certeza da esperança”
O autor de hebreus os recomenda por terem sido maravilhosamente diligentes para com o lado prático da suas vidas, porém depois os concita a mostrarem a mesma diligência na questão de captarem as doutrinas da fé. Aqueles cristãos hebreus estavam em dificuldade porque tinham deixado de manter o equilíbrio entre a doutrina e a prática; não estavam sendo "dignos" da vocação.
A segunda idéia contida nessa palavra é de algo que "combina". Algo "condizente" com a vocação. Veja essa idéia em Fp 1:27:
“Vivei, acima de tudo, de modo condizente do evangelho de Cristo...”
É exatamente a mesma idéia. A idéia comunicada é de igualar-se, de vestir uma peça de roupa que combina com outra. Há certas cores que não combinam, que não devem andar juntas. Jamais deverá haver um conflito entre a nossa doutrina e a nossa prática.
Sua exortação é que sempre devemos ser cuidadosos para que as nossas decorações, os nossos ornamentos, sejam sempre apropriados a esta veste básica de que já nos vestimos. A doutrina é o fundamento; a vida é o ornamento. O apelo é sempre em termos da doutrina; a vida deve fluir dela, deve sempre a harmonizar-se com ela. Devemos viver uma espécie de vida que adorne a doutrina.
O apóstolo começa logo a dizer-nos o que a doutrina é. É a “vocação", o “chamamento” com que fostes chamados. Devemos ser dignos da vocação com que fomos chamados. A doutrina que ela comunica é que devemos viver essa espécie de vida pela razão de que somos "os chamados". Os cristãos são "os chamados de Jesus Cristo". A igreja nada é senão a reunião dos "chamados". O propósito do termo grego para a igreja é "ekklesia", que significa "os chamados para fora". Os cristãos são os que foram chamados para fora do mundo. Veja em 1 Pe 2:9:
“Vós, porém, sois raça eleita, sacerdócio real, nação santa, povo de propriedade exclusiva de Deus, a fim de proclamardes as virtudes daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz”
Nunca se deve pensar no cristão como alguém que resolveu adotar um certo tipo de vida. Nunca se deve pensar na vida cristã em termos de algo que decidimos adotar. É exatamente o oposto, é algo para o que fomos "chamados". Nós até usamos mal a palavra "vocação" e falamos de alguém adotando uma vocação. Mas ninguém adota uma vocação verdadeira; é algo para o que a pessoa é chamada. Assim, o ensino do apóstolo é que o modo pelo qual devemos viver a vida cristã, é, primeiramente, lembrar sempre que fomos chamados para ela, chamados das trevas, chamados para a luz. O apóstolo estivera salientando essa idéia desde o começo da Epístola. Veja isso em Ef 1:4:
“assim como nos escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele”
A principal a razão pela qual devemos viver uma vida de pureza e de santificação é que somos "os chamados". Devemos viver uma vida Santa porque fomos "chamados" para isso. Veja o que o apóstolo diz em Rm 6:4:
“Fomos, pois, sepultados com ele na morte pelo batismo...”
Nós, os cristãos, somos o "chamados" da morte e do túmulo do pecado. Quando ainda estávamos mortos em ofensas e pecados, veio a Palavra poderosa e nos, "chamou", e nos capacitou a ouvir. A palavra nos vivificou e pôs vida em nós. Vivificar é dar vida. O apóstolo Pedro diz a mesma coisa em 1 Pe 1:23:
“pois fostes regenerados não de semente corruptível, mas de incorruptível, mediante a palavra de Deus, a qual vive e é permanente”.
Temos que viver como quem compreende que fomos chamados por Deus para esta vocação celestial. Fomos chamados para esta maravilhosa e elevada vocação, e as nossas vidas devem combinar com a vocação, e está em conformidade com ela. É tudo em Cristo; estamos nEle, e Ele está em nós. E sempre devemos lembrar-nos deste fato, e devemos viver de maneira que o ilustre. Deus nos escolheu não apenas para que não fôssemos para o inferno, e não somente para que soubéssemos que os nossos pecados estão perdoados. Ele nos escolheu "para sermos santos", e para sermos "irrepreensíveis" diante Dele em amor. Essa é a vida para a qual ele nos chamou.
Somos chamados para a família de Deus; somos filhos de Deus. E devemos viver de modo que faça recair honra e glória na família e em nosso Pai. Assim devemos viver, como sempre lembrados de que vem o dia em nossas vidas em que seremos levados a presença de Deus. Devemos viver como apercebidos de que vamos para a glória. Devemos viver como estando cientes de que estamos assentados nos lugares celestiais precisamente neste momento. E então sempre devemos lembrar-nos de que Cristo habita em nossos corações pela fé, e que há algo da plenitude de Deus em nós. Esse é o caminho para a santificação, para a santidade. Esse é o modo de viver - dar-nos conta de que essas coisas são verdadeiras.
Observem, finalmente, que o apóstolo faz este apelo como "o prisioneiro do Senhor". Ele me chamou, e eu sou Seu escravo, Seu servo, Seu prisioneiro, e vocês deve viver como prisioneiros de Jesus Cristo. Veja 1 Co 6:20:
“Porque fostes comprados por preço...”
Não temos direito de viver como queremos e como nos agrada. Éramos prisioneiro de Satanás; e agora somos prisioneiros de Jesus Cristo. Se tão-somente enxergássemos e captássemos o significado do nosso chamamento, em todas as suas partes, não teríamos problema com a vida cristã.
Oremos....
“Senhor, eu quero ter o privilégio, pela graça, de participar de tudo aquilo que o Senhor intentou no Seu coração”
Nenhum comentário:
Postar um comentário