quinta-feira, 28 de abril de 2011

ESTUDO DA EPÍSTOLA DE PAULO AOS EFÉSIOS

CAPÍTULO 15

Por: D.M. Lloyd Jones

“FUNDADOS EM AMOR”

"Para que Cristo habite pela fé nos vossos corações. Afim de, estando arraigados e fundados em amor"Efésios 3:17

Continuando o nosso estudo da frase, “estando arraigados e fundados em amor", lembramo-nos de que a proposição fundamental é que todo o viver deve basear-se no amor; deve haurir sua vida, suas forças, seu poder, sua nutrição deste princípio cristão do amor. Se Cristo habita em nossos corações, o amor também tem que estar em nossos corações, no centro do nosso ser. Como já, vimos o apóstolo apresenta esta verdade na forma de duas figuras, a de uma árvore e também a de um edifício.

Vimos que há certas coisas comuns ás duas figuras e que cada uma delas acentua certas particularidades. Portanto, agora dirigimos a atenção àqueles aspectos deste assunto que são ilustrados pela figura de um edifício. Não somente devemos estar “arraigados” em amor, mas também devemos estar “fundados” em amor, precisamente como um grande edifício requer um alicerce profundo e sólido.

Vários princípios óbvios emergem desta figura particular. O primeiro é a importância de assegurar-nos de que o alicerce foi bem feito, e foi feito corretamente. O apóstolo fala de si próprio como “sábio arquiteto” – não apenas arquiteto “sábio”, em 1 Co 3:10, vejamos:

“Segundo a graça de Deus que me foi dada, pus eu, como sábio arquiteto, o fundamento

Não apenas arquiteto, porém um arquiteto “sábio”. O sinal de excelência de um sábio arquiteto é que ele dá muita atenção ao alicerce. Ele não se precipita ao levantar um edifício; quer um edifício estável e duradouro; um edifício sólido, no qual possa morar a vida toda. Assim, como sábio arquiteto, dará muita atenção ao alicerce, tomará tempo com ele, analisa o tipo de solo com que vai lidar e se há a possibilidade de uma inclinação ou deslizamento mais tarde. Num sentido, a qualidade do edifício vai depender disso, razão pela qual o alicerce deve ser bem feito, e corretamente.

Isto é particularmente verdadeiro se o projeto é de um edifício muito grande ou muito alto. Quanto maior e mais alto for o edifício, mais importância terá o alicerce. Se a intenção for construir um barracão de madeira não será necessário ser muito minucioso quanto ao alicerce. No entanto, se a intenção for erguer um edifício de grandes dimensões, um arranha-céu, então será absolutamente essencial um alicerce firme e sólido, e será preciso ter o máximo cuidado para habilitá-lo a resistir tensões e pressões às quais o edifício estará sujeito.

Dá-se grande proeminência a este princípio no Novo Testamento. O apóstolo está interessado em que os efésios alcancem grande altura na experiência, em que, de fato, sejam “cheios de toda a plenitude de Deus”. E ele sabe que, se isto se há de realizar, muito tempo terá que ser gasto no preparo de um alicerce adequado. Se você quer uma grande altura, precisa cavar, cavar muito. A altura acima da terra deve corresponder à profundidade debaixo da terra! De igual modo, é preciso que a altura e o peso de um edifício correspondam ao alicerce em que ele repousa.

Certamente é esse o princípio que o apóstolo está anunciando aqui. Ele está preparando o caminho para “a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade, e conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento, para que sejais tomados de toda a plenitude de Deus.” Como essa deve ser a qualidade do edifício, diz ele, não se apresse no seu alicerce. Gaste tempo com isso, assegure-se de que ele será adequado. O nosso próprio Senhor disse isso perfeitamente, uma vez por todas, na parábola das duas casas, no final do Sermão do Monte (Mt 7:24). O que Ele salienta de maneira tão notável é a importância vital do alicerce. A mesma parábola temos em Lucas 6:47,48, que diz:

“Todo aquele que vem a mim, e ouve as minhas palavras, e as pratica, eu vos mostrarei a quem é semelhante. É semelhante a um homem que, edificando uma casa, cavou, abriu profunda vala e lançou o alicerce sobre a rocha; e, vindo a enchente, arrojou-se o rio contra aquela casa e não a pôde abalar, por ter sido bem construída.”

Lucas acrescenta a informação de que este homem particular “cavou, e abriu bem fundo” a fim de colocar o alicerce sobre a rocha. O contraste é com o homem que edificou a sua casa sobre a areia. Ele estava interessado só em casas, não em alicerces; construiu sobre a areia. Mas quando sobrevieram os temporais e provações, a sua pobre casa, que parecia tão maravilhosa, foi demolida. O ponto acentuado pelo nosso Senhor é que, se você realmente quiser viver uma vida correspondente às bem-aventuranças, ou se quiser ser Seu discípulo, terá que cavar fundo e lançar um sólido alicerce sobre a rocha.

Este é o princípio ao qual, o apóstolo dá ênfase aqui. Temos que compreender que não há atalhos na vida espiritual. Estas coisas levam tempo. O apóstolo não ora meramente por estas pessoas para que sejam cheias de toda a plenitude de Deus; ele sabe que isso não pode acontecer repentinamente e sem preparação. Precisamos ser fortalecidos com poder pelo Espírito no homem interior e pôr-nos a estabelecer um sólido alicerce. Temos que cavar fundo e depois, despejar o concreto para fazer um alicerce volumoso e sólido. Devemos ter sempre em mente o peso da superestrutura que está para ser erigida.

Ninguém pode passar precipitadamente por estas coisas e dizer: quero esta experiência aqui e agora. Sem o fortalecimento com poder pelo Espírito, sem a habitação de Cristo no coração, sem estarmos arraigados e fundados em amor, não tempos esperança de conhecer as mais altas experiências da vida cristã. Só se obtêm pelo método de Deus. Há regras para a construção da vida e experiência cristã: e esta é uma das mais vitais de todas elas.

Para nos dirigirmos aos pormenores: que significa este alicerce? Como deve ser construído? A primeira resposta é que todas as relações da vida cristã devem basear-se no amor. Tudo deve estar baseado, fundado no amor. Isto é verdade, primeiramente, quanto às suas relações com Deus. Jamais conhecerei o amor de Deus, a não ser que a minha relação com Ele seja uma relação de amor. Isto é deveras básico. Se a nossa atitude para com Deus for apenas “teórica e intelectual”, não temos nenhuma esperança de sermos “cheios de toda a plenitude de Deus”, ou de conhecer realmente a Seu amor e as “insondáveis riquezas de Cristo”. Diz-nos o nosso Senhor em Mc 12:30:

“Amarás, pois, o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todo o teu entendimento e de toda a tua força.”

A Bíblia nos exorta, não somente crer em Deus, mas também a amá-l0: ela exige de nós um relacionamento pessoal. Deus não é impessoal. Deus é uma pessoa e, portanto, se estamos na relação cristã com Deus, esta será uma relação de amor, inevitavelmente. Eu amo a Deus? O amor governa a minha maneira de pensar nEle e a minha relação com Ele?

Exatamente do mesmo modo, a minha atitude para com Deus não deve ser de receio ou medo. Naturalmente, sempre haverá um temor reverente; porém este não é “o temor que tem consigo pena”, pois “o perfeito amor lança fora o medo”. A relação do cristão com Deus deve ser a de um filho para com o seu Pai. Para os cristãos, Deus não é apenas algum grande poder distante nos céus; ele é nosso Pai. Veja o que Paulo nos diz em Ef 3:14,15:

Por esta causa, me ponho de joelhos diante do Pai, de quem toma o nome toda família, tanto no céu como sobre a terra

Só oramos de verdade quando sabemos que estamos falando com o nosso Pai. Ele nos ama e nós O amamos porque Ele é o nosso Pai. Muito mais importante que fazer as nossas orações, é a nossa atitude para com Deus quando Lhe dirigimos as nossas orações. Às vezes inclinar-nos simplesmente e ficar em Sua presença sem dizer nada, mostra melhor a correta relação com Ele. “extasiar-me, e extasiar-me diante de Ti”, como expressa F.W. Faber. A contemplação de Deus, a adoração e o culto são as mais altas expressões do nosso amor a Deus. O que o apóstolo pede na oração por estes efésios é que toda a vida deles esteja baseada neste alicerce. Nós só passamos a amar a Deus quando compreendemos profundamente a verdade sobre Ele e o que Ele fez por nós em Seu Filho.

Todavia, não devemos deter-nos no amor a Deus; também devemos amar-nos uns aos outros, devemos “amar os irmãos”. O segundo grande mandamento que se segue a amar ao Senhor nosso Deus de todo o nosso coração, alma e força é:

“Amarás o teu próximo como a ti mesmo.”

Na verdade, o ensino do nosso Senhor vai além, e diz:

“... amai os vossos inimigos...”

Seja o que for que tenham falado de vocês falsamente, e por mais ofensivamente que os tenham injustiçado ou difamado, vocês devem “amar os vossos inimigos”. No Sermão do Monte, como vemos em Mateus 5: 43-48, Ele contrasta o Seu modo de pensar com todos os demais, diz Ele:

“43 Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. 44 Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem; 45 para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos46 Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo? 47 E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo? 48 Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste.”

Essa é a base da vida cristã. É o que nos diferencia do melhor não cristão. No próprio alicerce da vida cristã está esse amor aos nossos inimigos; e enquanto não estivermos firmados neste alicerce, estaremos perdendo tempo na busca de quaisquer experiências mais elevadas. Esse é o argumento desta oração que Paulo oferece em favor dos cristãos efésios.

O apóstolo dá uma nobre expressão a isto em sua Epístola aos Filipenses 2:4,5:

“Não tenha cada um em vista o que é propriamente seu, senão também cada qual o que é dos outros. Tende em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus,”

Esse “sentimento”, como o apóstolo explica, levou nosso Senhor que estava no céu “em forma de Deus” e desfrutava essa posição desde a eternidade, a vir à terra e a humilhar-Se, porque não considerou essa posição como uma presa a que “agarrar-se” e que devesse “reter”. Ele abandonou os símbolos da Sua glória e veio a este mundo “na forma de homem”, na semelhança de carne pecaminosa. Ele Se fez servo, e humilhou-Se até à morte de cruz. Fez isso tudo por nós, não porque fôssemos bons e merecedores de amor aos Seus olhos, nem porque O amássemos. A situação era exatamente o oposto. Foi apesar de nós, apesar do fato de que éramos rebeldes e “cheios de ódio e odiando-nos uns aos outros”, e odiando ao Senhor. A que outro é o “sentimento” que deve existir em nós.

Estou tendo amor pelos meus inimigos? Devo considerar isto cuidadosamente, e não devo dar-me por satisfeito enquanto não puder dizer com sinceridade que os amo, que oro para que Deus tenha misericórdia deles e lhes abra os olhos, e os atraia a Si. Enquanto não fizer isso, de nada me valerá procurar uma experiência mais elevada. Quão importante é o alicerce!

Ademais, a nossa atitude para com os mandamentos e exigências da vida cristã deve ser também uma atitude de amor, se de fato queremos ver este grande edifício erigido. Por isso devemos interrogar-nos se amamos os mandamentos do Senhor. Recordem o que o salmista (Sl 119:97, 127), podia dizer sobre isto, apesar de estar sob a antiga dispensação. Cristo ainda não tinha vindo; o Espírito Santo “ainda não fora dado”. Mas ele podia dizer:

“Quanto amo a tua lei! É a minha meditação, todo o dia!”

Se ele pôde amar a lei de Deus no tempo dele, estamos nós, como cristãos, amado a lei de Deus em nosso tempo? Veja o que o apóstolo João diz em sua primeira Epístola 5:3:

“Porque este é o amor de Deus: que guardemos os seus mandamentos; ora, os seus mandamentos não são penosos,”

Se vocês desejam realmente conhecer o amor de Cristo “que excede todo o entendimento” e declarar que o seu maior desejo é serem “cheios de toda a plenitude de Deus”, devem enfrentar uma questão preliminar: vocês amam os mandamentos de Deus? Uma parte do alicerce de amor é que desejamos e amamos a lei de Deus. Philip Doddridge expressa isto perfeitamente quando diz:

Meu supremo deleite considero

Teus ditados ouvir e obedecer.

Nosso último princípio é que o alicerce sempre surge estabilidade. Portanto, eu o exponho como princípio, dando ênfase a que o nosso amor não seja variável. Deve ser estável e constante, como um alicerce que nunca se abala e nunca se move. Vocês sabem o que é ter ocasionais lampejos de amor a Deus. Como resultado de algo que nos sucede, ou em certas circunstâncias, sentimos que realmente amamos a Deus. Todavia a experiência logo se desvanece, e logo no dia seguinte pode parecer que jamais tenha ocorrido; nosso amor vai e vem. Isso não é um alicerce sólido, pois a nossa vida deve estar fundamentada, “fundada” no amor.

O perfeito amor de Deus é produzido por Ele mesmo; não depende de coisa alguma fora dEle. É por isso que Deus amou o mundo de tal maneira que deu o Seu filho unigênito. Foi o Seu próprio amor, nascido dEle mesmo e se derramando copiosamente. O nosso amor deve ser assim também. E o será quando a nossa vida estiver fundada no amor. O nosso amor deve ser tão firme, e deve esta tão fixamente firmado neste alicerce, que nada seja capaz de movê-lo, secudi-lo ou afetá-lo nem um pouco. Esta, devemos todos concordar, é a prova de um sólido alicerce.

O amor que se altera, varia e muda é o amor humano, “erótico”, é o amor natural. Não é o “ágape” do Novo Testamento, este amor de deus no coração. Este não muda; permanece o mesmo, apesar dos homens. Nada, senão um profundo amor a Deus, pode resistir às provações e ás pressões, aos riscos e às tensões da vida.

Quão vitalmente importante é que tomemos tempo com o alicerce e nos certifiquemos de que estamos “arraigados e fundados em amor”. É só quando as nossas vidas tiverem este alicerce, que realmente se aplicará a nós a petição do apóstolo:

“a fim de poderdes compreender, com todos os santos... o amor de Cristo, que excede todo entendimento

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