Capítulo XVIII
E aquele que examina os corações sabe
qual é a intenção do Espírito;
e é ele que segundo Deus intercede
pelos santos.
Romanos 8:27
Dos ofícios do Espírito Santo, aquele que nos leva mais profundamente ao
entendimento do Seu lugar na economia da graça divina e do mistério da Santa
Trindade é a obra que Ele faz como o Espírito de intercessão. Temos o Pai para quem intercedemos e que ouve a
intercessão. Temos o Filho através de
quem intercedemos e através de quem recebemos e nos apropriamos da resposta por
causa de nossa união com Ele. E temos o Espírito Santo por quem intercedemos, que intercede em nós, de acordo com a
vontade de Deus, com sons tão profundos, inexprimíveis, que Deus escrutina
nossos corações para conhecer a mente do Espírito. Tão graciosa e real quanto a
divina obra de Deus no trono, ouvindo graciosamente nossas preces, é a obra do
Filho assegurando e transmitindo a resposta do alto, e a obra do Espírito Santo
em nós, intercedendo em nosso favor. A intercessão interior é tão divina quanto
a intercessão do alto. Vejamos por que razão é assim, e o que isso nos ensina.
Na criação do mundo vemos como foi obra do Espírito colocar-Se em
contato com a matéria escura, caótica e sem vida e por Sua energia avivadora
conceder a ela o poder da vida e da frugalidade. Foi somente depois de ser
vitalizada por Ele que a Palavra de Deus a esculpiu e originou as várias formas
de vida e beleza de que agora desfrutamos. Da mesma forma, na criação do homem
foi o Espírito que foi soprado no corpo que havia sido formado da terra e que
se uniu àquilo que, doutra feita, seria apenas matéria morta. Mesmo na pessoa
de Jesus, um corpo foi preparado para Ele através da obra do Espírito. Através
do Espírito Seu corpo ressurgiu do túmulo e é através do Espírito que nossos
corpos são tornados templos de Deus – os próprios membros de nosso corpo,
membros de Cristo. Pensamos no Espírito em relação com a natureza espiritual do
ser divino, distante da vileza e fragilidade da substância física. Mas é obra
do Espírito unir-Se especificamente com o que é material, elevá-lo à Sua
própria natureza espiritual, e assim criar a mais elevada forma de perfeição –
um corpo espiritual.
Esta visão da obra do Espírito é essencial para o entendimento do lugar
que Ele tem na divina obra da redenção. Em cada parte dessa obra há um ofício
especial designado para cada uma das três pessoas da Trindade. O Pai é o Deus
invisível, o Autor de tudo. O Filho de Deus é a forma de Deus revelada, tornada
manifesta, e trazida para perto de nós. O Espírito de Deus é o poder de Deus
habitando em Seu povo e operando nele o que o Pai e o Filho desejam para nós.
Não só individualmente, mas na igreja como um todo, o que o Pai propôs e o
Filho buscou, pode ser apropriado e levado a termo no corpo de Cristo somente
através da intervenção contínua e da operação ativa do Espírito Santo.
Isto é especialmente verdadeiro a respeito da oração intercessória. A
vinda do reino de Deus, o crescimento na graça, conhecimento e santidade nos
crentes, sua crescente devoção à obra de Deus, a obra efetiva do poder de Deus
nos não convertidos através dos meios de graça – tudo isso Deus tem para nós
através de Cristo. Mas essas coisas não podem vir a menos que sejam desejadas e
buscadas, ansiadas, cridas e esperadas. Esta é a maravilhosa posição que o
Espírito Santo ocupa – para Ele foi designada a tarefa de preparar o corpo de
Cristo para alcançar, receber e se assegurar daquilo que foi providenciado na
plenitude de Cristo, nosso Cabeça. Para que sejam comunicados o amor e a bênção
do Pai, tanto o Filho quanto o Espírito têm de trabalhar. O Filho recebe do
Pai, revela e nos aproxima; o Espírito interior desperta a alma para ter com
seu Senhor. Tão indispensável quanto a obra incessante de Cristo, pedindo e
recebendo do Pai, é a incessante intercessão do Espírito.
A luz que é lançada sobre este santo mistério pelas palavras do texto
que tomamos é impressionante. Na vida de fé e oração há operações do Espírito
nas quais a Palavra de Deus é esclarecida ao nosso entendimento, e nossa fé
aprende a expressar aquilo que pede e de que precisa. Mas há também operações
do Espírito, mais profundas que os pensamentos ou sentimentos, em que Ele produz desejos e
anseios no nosso espírito, nas fontes secretas da vida, que só Deus pode
descobrir e entender. Há o desejo por “conhecer o amor de Cristo, que excede
todo o entendimento” e de ser “cheios de toda a plenitude de Deus”, a esperança
Naquele “que é poderoso para fazer tudo muito mais abundantemente além do que
pedimos ou pensamos” (Efésios 3:19-20), mesmo o que “não subiu ao coração do
homem” (I Coríntios 2:9). Quando essas aspirações tomam posse de nós, começamos
a orar pelo que não pode ser expresso, e nosso único conforto é que o Espírito
intercede em nós com gemidos inexprimíveis numa língua que só Ele conhece e
entende.
Aos Coríntios, Paulo diz: “Orarei com o espírito, mas também orarei com
o entendimento” (I Coríntios 14:15). Sob a influência do mover do Espírito
Santo e de Seus miraculosos dons, o perigo era negligenciar o entendimento. O
perigo nesses últimos dias é o oposto, orar com o entendimento é universal.
Devemos nos lembrar que junto com a oração do entendimento deve haver oração no
Espírito (Judas 1:20, Efésios 6:18). Devemos dar o lugar devido à cada uma das
operações do Espírito. A Palavra de Deus deve habitar ricamente em nós, nossa
fé deve se agarrar clara e inteligentemente a ela, e nós devemos pleiteá-la em oração. Devemos
ainda nos lembrarque no santuário mais íntimo do nosso ser, na área do
inexprimível e inconcebível, o Espírito intercede por nós aquilo que não
sabemos e não conseguimos expressar (I Coríntios 2:6-11). Conforme crescemos na
compreensão da divindade do Espírito Santo, e a realidade de Sua habitação,
devemos reconhecer quão infinitamente além do alcance de nossas mentes está a
avidez divina com que Ele nos dirige aos céus. Devemos sentir a necessidade de
cultivar a atividade de fé que procura se ater e obedecer a Palavra de Deus e
daí aprender a orar. Conforme oramos, nos lembraremos o quanto Deus e o mundo
espiritual em que entramos pela oração estão infinitamente acima de nossa
compreensão. Creiamos e nos regozijemos porque onde falham o coração e a carne,
Deus é nossa força; Seu Santo Espírito no santuário interior de nosso espírito
faz Sua obra incessante de intercessão e ora em nós de acordo com a vontade de
Deus. Conforme oramos, adoremos em santa quietude, e rendamo-nos ao bendito
Parácleto, que é o único e verdadeiro Espírito de súplica.
“Não sabemos o que havemos de pedir como convém”, mas “é Ele que segundo
Deus intercede pelos santos” (Romanos 8:26-27). É especificamente na oração
intercessória que podemos contar com a profunda, inexprimível, mas prevalecente
intercessão do Espírito.
Que privilégio ser o templo do qual o Espírito Santo clama ao Pai seu
incessante “Aba” e oferece seus louvores profundos demais para serem colocados em palavras. Que idéia
maravilhosa é que o Filho eterno habitou na carne em Jesus de Nazaré e orou ao
Pai como homem, e também que o Espírito eterno habita em nós – carne pecaminosa
que somos – e fala ao Pai através de nós assim como fez o Filho. Quem não se
renderia a este bendito Espírito para se tornar aceitável para compartilhar da
poderosa obra intercessória através da qual somente o reino de Deus pode ser
revelado? O caminho está aberto e nos convida a todos. Permita que o Espírito
Santo tenha pleno controle sobre sua vida. Creia na possibilidade de Ele tornar
a sua personalidade e consciência o lugar de Sua habitação. Creia na certeza de
Sua obra e intercessão através de você de uma forma que nenhuma mente humana
pode compreender. Creia que na secreta, calada, perseverança dessa obra, Seu
imenso poder está aperfeiçoando o divino propósito do seu bendito Senhor. Viva
como alguém em quem aquilo que ultrapassa o entendimento se tornou verdade e
vida, em quem a intercessão do Espírito é parte da vida diária.
Sumário
1.
Lendo sobre o lugar do Espírito Santo na oração
intercessória, podemos entender melhor as orações do nosso Senhor em Sua última
noite na terra com seus repetidos “Não se faça a minha vontade, porém a Tua” e
“Seja feita a Tua vontade” (Mateus 26). Ele pretende que tenhamos o Espírito
Santo orando em nós e através de nós, guiando nossos desejos e fortalecendo
nossa fé. Ele espera que rendamos todo o nosso ser à habitação do Espírito para
que Ele ore livremente através de nós de acordo com a vontade de Deus.
2.
“Não sabemos o que havemos de pedir como convém”
(Romanos 8:26): quão frequentemente isso tem sido um peso, um sofrimento! Que
isso de agora em diante seja um conforto. Porque nós não sabemos, devemos ficar
de lado e dar lugar Àquele que sabe. Podemos crer que em nossa gagueira, às
nossas vistas, o intercessor está pleiteando por nós. Não temamos em crer que
em nossa ignorância e fraqueza o Espírito Santo está fazendo a Sua obra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário