quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Andando no Espírito


Capítulo XXIII

Digo, porém: Andai em Espírito, e não cumprireis a concupiscência da carne.
E os que são de Cristo crucificaram a carne com as suas paixões e concupiscências.
Se vivemos em Espírito, andemos também em Espírito. 
Gálatas 5:16,24-25

“Se vivemos em Espírito, andemos também em Espírito”. Estas palavras sugerem claramente a nós a diferença entre a vida cristã carnal e a espiritual. Na primeira o cristão pode se contentar em viver no Espírito, no sentido de que ele possui o Espírito em virtude de sua salvação; ele está satisfeito com o fato de conhecer que possui a vida nova, mas ele não anda no Espírito. O que é um seguidor espiritual, ao contrário, não está contente a menos que todo o seu andar e falar estejam no poder do Espírito. Ele anda no Espírito e assim não satisfaz as cobiças da carne porque ele é cheio com o Espírito.
Quando o cristão luta para andar dignamente com Deus e ser agradável a Ele em tudo, ele freqüentemente é perturbado profundamente pelo poder do pecado ainda evidente, e busca a causa pela qual ele tão freqüentemente falha em vencê-lo. Ele normalmente sente que é devido à sua falta de fé ou fidelidade, sua fraqueza natural, ou o poder de Satanás. Mas ele não consegue descansar nestas conclusões. Seria melhor prosseguir na descoberta da razão mais profunda pela qual todas estas coisas, das quais Cristo assegurou-nos libertação, ainda podem vencer-nos. Um dos mais profundos segredos da vida cristã é o conhecimento de que o poder que detém a liderança do Espírito é nossa própria carne. Aquele que sabe o que é a carne e como ela opera e como se deve lidar com ela, será o vencedor.
Sabemos que foi por causa da ignorância deste fato que os gálatas falharam tão miseravelmente. Foi isto que os levou a tentar aperfeiçoar na carne o que começou no Espírito (Gálatas 3:3). Foi isto que os fez presa daqueles queriam “ostentar-se na carne” para que pudessem “se gloriar na vossa carne” (Gálatas 6:12-13). Eles não sabiam quão incorrigivelmente corrupta era a carne. Eles não sabiam que nossa natureza é tão pecaminosa quando está cumprindo suas próprias cobiças, quando está “ostentando-se na carne”, como quando entrega-se ao serviço de Deus e tenta aperfeiçoar o que o Espírito começou. Porque os gálatas não estavam conscientes desta possibilidade, eram incapazes de detectar em suas paixões e cobiças; foi isto que obteve vitória sobre eles, de modo que eles faziam o que não queriam fazer. Eles não sabiam que tanto quanto a carne, se o esforço próprio e a vontade própria tivessem qualquer influência no serviço a Deus, ela permaneceria forte para o serviço do pecado, e que o único modo de torná-la ineficaz para fazer o mal seria torná-la ineficaz em suas tentativas de fazer o bem!
É a fim de revelar a verdade de Deus concernente à carne, tanto em seu serviço a Deus quanto ao pecado, que esta epístola foi escrita. Paulo queria ensiná-los que apenas o Espírito é o poder da vida cristã, e que este poder não pode ser eficaz a menos que a carne seja totalmente negada e posta de lado. Ao responder a pergunta de como pode ser isto, ele dá a maravilhosa resposta que é um dos pensamentos centrais da revelação de Deus. A crucificação e a morte de Cristo revelam não somente a expiação pelo pecado, mas também o poder que liberta do domínio do pecado que está radicado na carne. Quando Paulo no meio de seu ensino sobre o andar no Espírito nos diz: “e aqueles que são de Cristo crucificaram a carne com suas paixões e concupiscências” (Gálatas 5:24), ele está nos apontando o único caminho pelo qual o livramento da carne é obtido. Entender estas palavras, “crucificaram a carne”, e experimentá-las, é o segredo do andar não segundo a carne, mas segundo o Espírito. Que cada um que anseia andar pelo Espírito busque captar o significado delas.
Nas Escrituras, “a carne” significa toda a nossa natureza humana em sua presente condição sob o poder do pecado. Isto inclui todo nosso ser – espírito, alma e corpo. Após a queda, Deus disse do homem, “ele é carnal” (Gênesis 6:3). Todos os seus poderes, intelecto, emoções e vontade estão sob o poder da carne. As Escrituras falam da vontade da carne, da mente da carne, das paixões e cobiças da carne. Elas dizem que em nossa carne não habita bem algum. A mente da carne está em inimizade contra Deus. Sobre esta base ela ensina que nada que seja da carne, nada que a mente ou a vontade da carne pensa ou faz, não importa o quão justo isto aparente ser, e nem quanto os homens possam se gloriar nisto, nada disto pode ter qualquer valor à vista de Deus. Isto nos adverte que nosso maior perigo no andar cristão, a causa de nosso fracasso e fraqueza, é o nosso confiar na carne, em sua sabedoria e suas obras. Isto nos diz que para ser agradável a Deus, esta carne com sua vontade e esforços próprios deve ser inteiramente abandonada a fim de dar lugar para a vontade e obra de outro, o Espírito de Deus. O único caminho para ser liberto do poder da carne é crucificá-la.
“Aqueles que são de Cristo Jesus crucificaram a carne”. A tendência é falar do crucificar a carne como algo que deva ser feito. As Escrituras falam disto como algo que já foi feito: “Nosso velho homem foi crucificado com Ele, para que o corpo do pecado seja destruído e não mais sirvamos o pecado como escravos” (Romanos 6:6). “Estou crucificado com Cristo, logo, já não sou eu mais quem vivo, mas Cristo vive em mim” (Gálatas 2:20). Aqueles que são de Cristo crucificaram a carne. Este é um fato cumprido na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo. Através dela o mundo foi crucificado para mim e eu para o mundo. O que Cristo fez pelo Espírito eterno na cruz, Ele o fez não como um indivíduo, mas em nome da natureza humana, a qual, como sua Cabeça, Ele tomou sobre Si. Cada pessoa que aceita Cristo recebe-O como o crucificado – não apenas o mérito, mas o poder de Sua crucificação – e é unido e identificado com Ele. Aqueles que são de Cristo Jesus, em virtude de terem aceitado o Cristo crucificado como sua vida, desistiram de sua carne na cruz.
Alguns ainda perguntam, “o que quer dizer crucificaram a carne?”. Alguns se contentam com a verdade geral de que a cruz tira a maldição que estava sobre a carne. Outros pensam que eles devem provocar dores e sofrimentos para a carne; devem negá-la e mortificá-la. Outros pensam a respeito da influência moral que o pensamento da cruz comunicará. Em cada uma destas visões há um elemento de verdade. Mas se eles deverão se realizar em poder, devemos ir ao pensamento central: crucificar a carne é entregá-la à maldição. A cruz e a maldição são inseparáveis (Deuteronômio 21:23; Gálatas 3:13). Dizer “nosso velho homem foi crucificado com Ele, fui crucificado com Cristo” é uma declaração muito séria. Significa que confesso que minha velha natureza, meu ego, merece a maldição e que não há nenhuma maneira de me desembaraçar dela senão pela morte. Voluntariamente eu a entrego à morte. Aceitei como minha vida o Cristo que veio para entregar-Se, Sua carne, à maldição da morte de cruz – que recebeu a Sua nova vida somente por causa daquela morte e pela virtude dela. Entrego meu velho homem, minha carne, ego, com sua vontade e obra, como algo pecaminoso e maldito, à cruz. Está cravada ali. Em Cristo estou morto para ela e liberto dela.
O poder desta verdade é dependente de que seja conhecida, aceita, e de que se atue com base nela. Se eu apenas conheço a cruz como substituição, mas não como Paulo que se gloriava nela – na comunhão dela (Gálatas 6:14), eu nunca experimentarei seu poder para santificar. Quando a bendita verdade de sua comunhão raia sobre mim, vejo como pela fé posso entrar e viver em comunhão espiritual com Jesus que, como meu cabeça e líder, proveu a cruz como o único caminho para o trono e provou-a deste modo. Esta união espiritual, mantida pela fé, torna-se uma união moral. Tenho a mesma mente ou disposição que houve em Cristo. Considero a carne como pecaminosa e adequada somente para a morte. Aceito a cruz com sua morte para o que é carne, assegurada para mim em Jesus, como o único caminho para ser liberto do poder do ego e para andar em novidade de vida pelo Espírito.
O fato da fé no poder da cruz ser uma revelação e ao mesmo tempo a remoção da maldição e do poder da carne é uma verdade muito simples ainda que profunda. Eu começo a entender que no viver pelo Espírito há o perigo do render-se à carne ou ao ego em minha tentativa de servir a Deus. Isto torna a cruz de Cristo ineficaz (I Coríntios 1:17; Gálatas 3:3; 5:12-13; Filipenses 3:3-4; Colossenses 2:18-23). Agora vejo como tudo o que é do homem e da natureza, da lei e do esforço humano, foi para sempre julgado por Deus no Calvário. Ali a carne provou que com toda a sua sabedoria e toda a sua “religião”, odiou e rejeitou o Filho de Deus. Ali Deus provou que o único caminho para ser liberto da carne é entregá-la à morte como algo amaldiçoado. Começo a entender que preciso ver a carne como Deus a vê; aceitar a sentença de morte que a cruz decreta para tudo em mim que seja da carne; olhar para ela e para tudo que provém dela como algo maldito. Quando este hábito da alma cresce em mim, aprendo a nada temer mais do que a mim mesmo. Tremo perante o pensamento de permitir que a carne, minha mente e vontade naturais, usurpe o ligar do Espírito Santo! Toda minha atitude em relação a Cristo é aquela de humilde temor, consciente de que tenho dentro de mim aquela coisa amaldiçoada que está sempre pronta, como um anjo de luz, para introduzir-se no Santo dos Santos e desviar-me para servir a Deus não no Espírito, mas sim no poder da carne. É neste temor humilde que o crente é ensinado a crer plenamente não só na necessidade, mas também na provisão do Espírito Santo para tomar totalmente o lugar que a carne antes possuía e diariamente gloriar-se na cruz, da qual ele pode dizer, “pela qual eu estou crucificado para o mundo”.
Freqüentemente buscamos a causa do fracasso na vida cristã. Pensamos que porque estamos claros naquilo que os gálatas não entendiam – justificação somente pela fé – o perigo deles não pode ser nosso também. Ah, se soubéssemos o quanto permitimos que a carne opere em nossa caminhada cristã! Oremos pela graça de Deus para conhecê-la como nossa inimiga mais implacável, e como inimiga de Cristo. A graça de graça não significa somente o perdão do pecado, significa o poder de uma nova vida através do Espírito Santo. Concordemos com aquilo que Deus diz da carne e de tudo o que vem dela: que é pecaminosa, condenada, amaldiçoada. Não temamos nada mais que as obras ocultas da nossa própria carne. Aceitemos o ensino da Palavra de Deus: “Porque eu sei que em mim, isto é, na minha carne, não habita bem algum; e com efeito o querer está em mim, mas não consigo realizar o bem.” (Romanos 7:18). Peçamos a Deus que nos mostre até que ponto o Espírito deve nos possuir se desejamos agradá-Lo em todas as coisas. Creiamos que conforme nos gloriamos diariamente na cruz, e em oração e obediência entregamos a carne à morte da cruz, Cristo aceitará nossa rendição e por Seu divino poder manterá em nós a vida do Espírito. Devemos aprender não somente a viver em Espírito, mas como aqueles que foram libertos do poder da carne andar pelo Espírito em nossas vidas diárias.

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