quinta-feira, 5 de maio de 2011

As Insondáveis Riquezas de Cristo


Exposição sobre Efésios 3


Por: D.M. Lloyd-Jones


CAPÍTULO 16

“Poder compreender com todos os santos”

"Poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos, qual seja a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade,
e conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento, para que sejais cheios de toda a plenitude de Deus.” (Ef 3:18,19)

Estes dois versículos nos dizem qual era o objetivo do apóstolo em Sua oração por estes cristãos efésios. Todas as petições anteriores nos preparam para esta petição e a ela nos conduzem. Eram essenciais como preparativos, mas não eram fins em si mesmas; destinavam-se a chegar a este grande objetivo. Nada é mais elevado do que isto. Conceda-nos Deus o Seu Espírito para que possamos considerá-la direito. Portanto, nas palavras do apóstolo Pedro, é necessário que “cinjamos os nossos lombos” (1 Pe 1:13).
Confesso que abordo este grande tema com “temor e tremor”. Todos que ensaiaram tratar dele e expô-lo estiveram cônscios da sua inaptidão. Isto por causa da natureza e caráter da verdade de que estamos tratando. É um assunto que não se pode dividir e analisar em puras categorias. Uma vez alguém disse, com muita propriedade, que “não se pode dissecar uma fragrância”. Menos ainda se pode “analisar e dissecar o amor”. Tudo que se pode fazer é dizer algumas coisas sobre ele. Acima de tudo, é preciso ter experiência dele. E há experiências que são quase inexprimíveis, dada a sua exaltada natureza e caráter. Assim é esta declaração a que chegamos. Devemos familiarizar-nos com ela olhando-a de maneira geral, antes de começar a particularizar o estudo.
Começo fazendo várias proposições gerais e óbvias – proposições que tendemos a negligenciar com tanta frequência em nosso pensar. A primeira é que uma das mais altas conquistas da vida cristã é conhecer “o amor de Cristo”. Há muita discussão sobre o que significa “a largura, e o comprimento, e a altura, e a profundidade”. Alguns argumentam que esta passagem não se refere ao amor de Cristo, e que a conjunção “e” indica claramente que o apóstolo está pensando noutra coisa quando se refere a estas dimensões e depois passa a falar do amor de Cristo. No entanto, o amor de Cristo esse é o tema de todo o cap. 3. Ele já tinha falado acerca das “insondáveis riquezas de Cristo”.
Argumento, pois, que aqui Paulo passa para algo mais elevado ainda. Observemos que ele não está falando do nosso amor, mas do amor de Cristo por nós. Do nosso amor ele falara na frase “estando arraigados e fundados em amor” que, como vimos, refere-se ao nosso amor a Deus. Nos vers. 18 e 19, porém, Paulo não está falando mais do nosso amor, embora isso tenha sido necessário primeiro, para levar-nos à percepção e ao conhecimento do Seu amor por nós.
Talvez alguns digam que você não pode ser cristão sem conhecer o amor de Deus por você. Isso é verdade. Daí há muitos que acham que o cristão começa com um conhecimento desse amor. Todavia é evidente que não é a explicação daquilo que estamos tratando aqui. O apóstolo está escrevendo a pessoas, e orando por pessoas já cristãs. No capítulo primeiro ele já as fizera lembrar-se de que elas confiaram no Senhor depois de ouvirem a “palavra da verdade”, o evangelho da sua salvação. Creram no evangelho e, por isso, perceberam algo do amor de Deus por elas. E, ainda assim, a oração do apóstolo por elas aqui, é para que venham a compreender com “todos os santos” este amor.
Então, de que maneira se pode obter esta experiência? Parece claro que é questão de grau. Há uma consciência preliminar do amor de Deus. Na verdade, o amor que agora estamos contemplando é tão maior do que esta consciência, que todos os que já tiveram experiência dele inclinaram-se a dizer que nunca antes tinham conhecido o amor de Deus. Sentem que haviam tido algum conhecimento dele, e que tinham conhecido algo a respeito dele, porém que realmente não tinham conhecido a amor propriamente dito. Essa é a diferença dos dois graus do amor de Deus. Jamais devemos cair no erro de imaginar que, porque somos cristãos, sabemos tudo sobre o amor de Deus. Há neste amor “profundidades abismais” que desconhecemos. O apóstolo ora para que estes efésios e nós com eles partamos para estas profundezas e profundidades e descubramos coisas que nunca sequer tínhamos imaginado.
Outra observação preliminar e essencial é que estamos estudando o amor, não como conceito, mas como o real e concreto amor de Cristo. É pessoal, refere-se ao conhecimento pessoal dEle e do Seu amor por nós. Em sua primeira Epístola no cap. 4:16, o apóstolo João escreve:

“E nós conhecemos e cremos no amor que Deus tem por nós...”

O alvo de todo o nosso conhecimento deve ser este conhecimento do amor de Cristo por nós. A finalidade e propósito de toda doutrina (ensino) é lavar-nos a isto. Em certo sentido, é-nos possível saber toda doutrina e, contudo, não saber isto. A doutrina não é um fim em si mesma. Naturalmente ela é essencial e fundamental. Homem nenhum jamais conheceu este amor de Cristo a que o apóstolo se refere aqui, a menos que tenha sido profundamente instruído na doutrina e nesta fosse versado. Doutro lado, é igualmente certo dizer que, se você se detiver na doutrina, continuará sem conhecer este amor de Cristo.
Muitos de nós não temos o mínimo de interesse pela doutrina; somos cristãos ociosos – cristãos que não lêem, não pensam e não procuram sondar os mistérios. Tivemos alguma experiência e não desejamos sondar mais. Outros de nós, dizem que, visto que a bíblia está repleto de doutrina, devemos estudá-la, agarrá-la e tomar posse dela. Desta maneira o diabo nos engana, nos agarra e nos priva da nossa herança. Se o conhecimento que vocês tem das escrituras e das doutrinas do evangelho de Cristo não nos têm levado a este conhecimento do amor de Cristo, então deveríamos estar profundamente insatisfeitos e inquietos. Toda a doutrina bíblica é acerca desta bendita Pessoa mesma; e não há maior armadilha na vida cristã do que esquecer a Pessoa mesma e viver simplesmente das verdades a Ele concernentes.
Jamais devemos estudar a Bíblia ou qualquer outra coisa relacionada com a verdade bíblica, sem darmos conta de que estamos na presença do Senhor, e de que se trata da verdade acerca dEle. E isto deve ser feito sempre numa atmosfera de adoração. A verdade bíblica não é um assunto entre outros. É verdade viva acerca de uma Pessoa viva. É por isso que a reunião da Igreja é essencialmente diferente de todas as outras espécies de reuniões que o mundo possa organizar. É sempre adoração; estamos na presença de uma Pessoa.
O apóstolo diz isto de maneira extraordinária no capítulo 3 de Filipenses. Conquanto ele tivesse progredido na vida cristã, e tivesse tido muitas experiências maravilhosas, diz ele que esta era sua ambição. No versículo 10 ele diz assim:

“para o conhecer, e o poder da sua ressurreição, e a comunhão dos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte;”

Ele prossegue no versículo 13:

“... esquecendo-me das coisas que para trás ficam e avançando para as que diante de mim estão”

O amor nunca fica satisfeito o bastante. Uma vez que você conhece esta Pessoa e começa a amá-lA, você sente que tudo que recebeu não é suficiente, quer mais e mais. É pelo que o apóstolo está orando pelos efésios. Seu anseio é que eles conheçam a Cristo, pois conhecê-lo é conhecer o Seu amor.
Assim, a nossa primeira proposição é que este conhecimento do amor de Cristo é a meta de todos os nossos esforços cristãos. Quanto sabemos disto? É real para nós? Pensemos de novo nas expressões de certos hinos nossos, tais como:

Quão doce soa o nome de Jesus
nos ouvidos do crente!
e
Senhor Jesus, o só pensar em Ti
de dulçor me enche a alma.

Isso é verdade a respeito e vocês? Vocês O conhecem realmente? Conhecem o Seu amor? Este é o objetivo principal de todos os esforços cristãos.
A segunda proposição é que esta experiência é algo possível a todos os cristãos. Paulo diz:

“a fim de poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos...”

As duas palavras aqui empregadas são importantes. Tomemos primeiro a palavra santos - “poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos...”. A palavra “santos” quer dizer “separados”, além de “santos” propriamente dito. Noutras palavras, o termo santos nos diz que este conhecimento só é possível aos que crêem no Senhor Jesus Cristo. Este tema do amor de Cristo é uma coisa da qual o incrédulo não tem a mínima concepção. O mundo não pode receber o Espírito Santo porque não o conhece. E porque não pode receber o Espírito Santo, o mundo nada sabe desse amor de Cristo. É verdade somente para os santos. Somente os que são “fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior;”. Assim é o caráter desse amor a que se refere o apóstolo. O mundo nada sabe sobre isso; é somente para os santos, somente para os que foram separados do mundo e introduzidos no reino do amado Filho de Deus.
Apresso-me a acrescentar que este benefício é para todos os santos. Repito isto porque estou ciente do sutil perigo de manter-nos presos a certos resíduos daquele ensino católico-romano completamente falso que declara que somente certos cristãos são “santos”. Contudo, de acordo com as Escrituras, todos os cristãos são santos. Paulo diz isso claramente em Romanos 1:7:

“A todos os amados de Deus, que estais em Roma, chamados para serdes santos...”

Todos os cristãos são santos, pessoas separadas. Assim, este acontecimento é, pois, para todos os santos. Dou ênfase a isso porque receio que muitos pensem consigo mesmos que esta experiência é possível, talvez, a um ministro ou a um obreiro cristão de tempo integral que tem tempo para ficar meditando e orando, mas não a alguém que tem que passar o dia numa atividade comercial ou profissional e que bem pode ter que levar trabalho para casa à noite. Essa é uma mentira do diabo. Todos nós temos a mesma oportunidade e possibilidade. Graças a Deus, esta benção é para todos os santos, seja qual for a sua posição, seja qual for a sua situação. Contentar-nos com qualquer coisa menos que isso é dizer a Deus que não cremos em Sua Palavra. Nada desonra tanto a Deus e Sua Palavra como esse estado de satisfação própria, como esse contentamento em continuar como infantes em Cristo, e em negar-se a escalar as “alturas” e de lutar para subir ao pico culminante do amor de Deus. Todos os santos devem procurar isso.
O terceiro ponto requer a nossa atenção é a descoberta do caminho para este conhecimento. Temos que descobrir como poderemos esperar o gozo desta consciência do amor de Cristo por nós. A frase do apóstolo diz: “estando arraigados e fundados em amor (para) poderdes perfeitamente compreender, com todos os santos...” O apóstolo não disse apenas “para poderdes”, e sim, “para poderdes plenamente” (ou perfeitamente). Ele escolheu deliberadamente uma palavra que contém essa ênfase extra. Poderíamos muito bem traduzi-la pela palavra “fortalecer” – “para serdes fortalecidos para compreender”. Ele já havia orado para que fôssemos “fortalecidos com poder pelo Seu Espírito no homem interior”, e aqui ele reitera a petição. Precisamos ser “fortalecidos” ou “plenamente capacitados”. Necessitamos de força, poder e capacidade antes de podermos conhecer o amor de Cristo. O amor é poderoso. O amor é dinamite, o amor é poder. “Deus é amor”, e o Seu poder, majestade e energia estão nesse amor. Desse modo, quando você estiver sentindo o amor de Deus, estará sentindo algo do poder de Deus, do seu peso e da eternidade da glória de Deus.
Vemos constantemente nas biografias cristãs, que todo aquele que já teve alguma experiência do amor de Deus, sempre teve a sensação de que ele é irresistível, duvidaram se seria capaz de suportá-lo. O amor de Deus é tão grande e poderoso que o homem sente a sua estrutura fender-se debaixo dele. É por isso que precisamos ser fortalecidos. Alguma vez fomos levados a sentir-nos desfalecer pelo amor de Deus? Sabemos o que é – para usar a linguagem de Cantares de Salomão – “desfalecer de amor” (2:5), experimentar o seu maravilhoso poder em tal medida que as nossas forças parecem deixar-nos e somos dominados por ele?
Mais uma razão pela qual precisamos ser capacitados a compreendê-lo, é que somente o amor pode reconhecer o amor. Necessitamos estar “arraigados e fundados em amor” a fim de compreendermos este amor. Somente o amor reconhece o amor; somente o amor entende o amor. Você terá que ter o amor em seu coração, se vai conhecer o amor e experimentá-lo. Devemos dar graças a Deus pelo fato de que o amor nos capacita a compreender o amor de Cristo, pois é isto que garante a todos os santos a possibilidade de conhecê-lo.
Quão maravilhosa é a salvação de Deus e a provisão de Deus! Visto que é matéria de amor e não de intelecto, a pessoa mais atrasada intelectualmente está no mesmo nível do maior gênio. O nosso bendito Senhor pôde dizer em Mt 11:25,26:

“Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultaste estas coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos. Sim, ó Pai, porque assim foi do teu agrado.”

Finalmente, “a fim de, estando arraigados e fundados em amor, poderdes perfeitamente compreender”, diz o apóstolo. Um grande princípio bíblico está envolvido neste ponto. Ninguém chega de súbito ao ápice do conhecimento do amor de Deus, pelo que, se deseja alcançar o topo desta montanha e “conhecer o amor de Cristo, que excede todo o entendimento”, será melhor começar a escalar logo. Abandone imediatamente as partes baixas e planas da vida cristã. Dê as costas ao nível comum e comece a escalar as alturas. A todo o momento, no primeiro passo que der a seguir, você poderá sentir algo mais glorioso que tudo quanto já sentiu. Pode ser que no princípio fique sem entender o que se passa; mas é o amor de Deus a manifestar-se em você. Estará cônscio de um crescente poder, redobrará os seus esforços, e irá de altitude em altitude e de força em força. Contudo, nunca chegará ao fim. É o amor de Cristo, que “excede todo o entendimento”. É a montanha de Deus, e Ele o conduzirá por toda a eternidade. Isto porque Deus é inexaurível, Seu amor é eterno, Suas misericórdias são infindáveis. No entanto, meus irmãos, que alegria, que encanto é a maravilha de conhecer este amor de Cristo, que excede todo o entendimento!
Até aqui estivemos apenas fazendo um exame geral da situação. Temos que ir adiante para “compreender” e “conhecer” mais acerca das dimensões deste amor. Por enquanto, faça a si próprio a pergunta: conheço realmente o amor de Cristo? Busque-o dEle! Vá a Ele, dirija-se a Ele para pedi-lo! Peça a Deus, “segundo as riquezas da sua glória, que vos conceda que sejais fortalecidos com poder, mediante o seu Espírito no homem interior; e, assim, habite Cristo no vosso coração, pela fé, estando vós arraigados e alicerçados em amor, poderdes compreender, com todos os santos...”.
Essa oração jamais é feita em vão. Se entregue, confiante, ao Seu amor. Seu amor por você é um amor sempiterno; portanto, deixe-se descansar em suas mãos.

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