Efésios 6:1-4
Chegamos agora à questão de como exercer a disciplina. O apóstolo
trata disso, em particular, neste versículo quatro. Não há dúvida quanto à
necessidade da disciplina, e de que ela deve ser imposta. Mas, como fazê-lo? É aí que muitas vezes se
formou grande confusão. Já concordamos que, fora de questão, nossos avós
vitorianos erraram nesse ponto e que com freqüência não exerciam disciplina de
maneira certa e bíblica. Também vimos que o que temos hoje é, em grande parte,
uma violenta reação contra aquilo. Isso não justifica a situação atual, porém
nos ajuda a compreendê-la. O importante é que não devemos cair no erro de
voltar da situação atual para o outro extremo, igualmente errado. E aqui, se
tão somente seguirmos as Escrituras,
teremos um conceito equilibrado. A disciplina é essencial e deve ser imposta; no entanto o apóstolo nos
exorta a sermos cuidadosos quanto à maneira
de exercê-la, porque poderemos causar mais
dano do que benefício, se não o fizermos do modo certo.
É claro que, em geral, há pouca necessidade deste ensino na época
atual porque, como venho indicando, o problema hoje é que as pessoas não
acreditam em nenhuma disciplina. Portanto, há pouca necessidade de dizer-lhes que
não exerçam disciplina de maneira errônea. Temos de instar com o homem moderno a
reconhecer a necessidade de disciplina e a pô-la em prática. Mas na esfera da
Igreja - e talvez na esfera das igrejas cristãs evangélicas em particular, e
especialmente nos Estados Unidos da América - o que o apóstolo diz neste
versículo quatro será cada vez mais necessário. É da seguinte maneira que surge
essa necessidade. O perigo sempre presente é o de reagir violentamente. É sempre errado quando a nossa atitude é
determinada por outra atitude que consideramos errada. Nosso conceito nunca
deve ser resultante de uma reação meramente negativa. Este princípio vale não
somente com respeito a este assunto particular, e sim também em muitos aspectos
e departamentos da vida. Muitíssimas vezes deixamos que a nossa atitude seja governada e determinada por algo errôneo. Permitam-me apresentar uma ilustração
atual desta tendência. Há cristãos, em certas partes do mundo, que estão
reagindo tão violentamente a um tipo errôneo de fundamentalismo dos dias atuais
que estão quase perdendo seu conhecimento das doutrinas cristãs essenciais. É
seu aborrecimento com alguma coisa errada que determina a posição deles. Isso é
sempre errado. Nossa posição deve ser positivamente determinada pelas
Escrituras. Não devemos ser apenas reacionários. E nesta questão particular de disciplina no lar, e das crianças, há o perigo real de que bons cristãos evangélicos, bíblicos, tendo visto
claramente que a atitude moderna é inteira e completamente errada, e estando
determinados a não aceitá-la, partam para o outro extremo e retrocedam à antiga idéia vitoriana.
Portanto, eles têm necessidade da exortação que encontramos nestes versículos
desta epístola.
O apóstolo divide o seu ensino em duas seções, negativa e positiva. Este
problema ele diz que não se limita aos filhos;
os pais e as mães também têm que ter cuidado. Negativamente, ele lhes
diz: “Não provoqueis a ira a vossos
filhos”. Positivamente, diz: “Mas
criai-os na doutrina e na admoestação “do” Senhor”. Na medida em que nos
lembrarmos dos dois aspectos, tudo irá bem.
Começamos com a negativa: “Não
provoqueis a ira a vossos filhos”. Estas palavras podem ser traduzidas, “não exaspereis vossos filhos, não irriteis
vossos filhos, não provoqueis vossos filhos, levando-os a ficarem ressentidos”.
Esse é um perigo muito real quando exercemos a disciplina. E se cometermos esse
erro, faremos muito mais mal do que bem. Não teremos sucesso na aplicação da disciplina aos nossos
filhos, só produzindo neles tão violenta
reação, tanta ira e ressentimento, que a situação será quase
pior do que se não praticarmos disciplina alguma. Todavia, como vimos, ambos os
extremos são completamente errôneos. Noutras palavras, devemos exercer esta
disciplina de maneira tal, que não irritemos
nossos filhos, não os provoquemos levando-os a um ressentimento pecaminoso. Exige-se de nós que mantenhamos o
equilíbrio.
Como fazê-lo? Como os pais devem exercer esta disciplina? E não
somente os pais, mas também os professores e todo aquele que têm a incumbência
de dirigir os mais novos. Mais uma vez devemos retornar ao capítulo 5,
versículo 18. “E não vos embriagueis com
vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito.” A chave é sempre
essa. Quando estávamos tratando desse verso, vimos que a vida vivida no
Espírito, a vida do homem cheio do Espírito, é sempre caracterizada por duas
coisas importantes - poder e domínio. É um poder disciplinado.
Lembrem-se de como Paulo o expressa, escrevendo a Timóteo: “Porque Deus não nos deu o espírito de temor,
mas de fortaleza, e de amor, e de moderação (de disciplina)” (2 Tm
1:7). Não um poder descontrolado, mas
um poder controlado pelo amor e pela moderação, pela disciplina!
É sempre essa a característica da vida daquele que é “cheio do Espírito”.
Noutras palavras, o cristão é completamente diferente do homem que se
acha sob a influência do vinho, do homem embrutecido pelo vinho. Há sempre
excesso ou contenda nesse caso, e o homem reage violentamente. Pode-se irritar
facilmente um ébrio e provocá-lo, levando-o a uma reação violenta. Falta-lhe
equilíbrio, falta-lhe juízo, ofende-se por qualquer trivialidade e, por outro
lado, fica contente em demasia com coisas triviais. Invariavelmente peca por
reação excessiva. O cristão, porém, diz o apóstolo, sempre deve manifestar a antítese desse tipo de comportamento.
Então, como devo exercer a disciplina? “Não provoqueis a ira a vossos filhos.” Este deve ser o primeiro
princípio a governar a nossa ação.
Seremos incapazes de exercer a verdadeira disciplina, se primeiro não formos
capazes de exercer domínio próprio e
de disciplinar o nosso gênio. O
problema com o homem “cheio de vinho”
é que ele não pode dominar-se; ele é dominado por seus instintos e paixões, e
por sua natureza inferior. O álcool põe fora de ação os centros mais elevados
do cérebro, incluindo-se o senso de autodomínio. O álcool é uma dessas drogas
depressivas que eliminam as mais refinadas capacidades de discriminação do
cérebro, os centros mais elevados, dando como resultado que os fatores
instintivos, elementares, ganhem expressão. É o que acontece com o homem cheio
de vinho; daí seus excessos e sua falta de domínio próprio. Entretanto os cristãos são cheios do Espírito, e as
pessoas cheias do Espírito sempre são caracterizadas pelo domínio próprio. Quando você for disciplinar um filho, terá que dominar-se primeiro a si próprio. Se
tentar disciplinar seu filho quando você estiver de mau humor, é certo que fará mais malefício do que benefício.
Que direito terá de dizer ao filho que ele precisa de disciplina, quando
evidentemente você mesmo precisa dela? O domínio próprio, o domínio do gênio, é
um requisito essencial para podermos comandar outros. Mas o problema é esse,
não é? Vemos isso nas ruas, em toda parte. Vemos pais aplicando castigo com
raiva, muitas vezes a tremer de irritação. Não têm domínio próprio, e o
resultado é que acabam exasperando o filho. Assim, o primeiro
princípio é que devemos começar por nós mesmos. Precisamos estar certos de que
estamos tendo domínio próprio, de que estamos calmos. Seja o que for que tenha
acontecido, seja qual for a provocação, não devemos reagir com violência
similar à do bêbado; é preciso haver esta disciplina
pessoal, este autodomínio que
habilita o homem a examinar a situação objetivamente
e a lidar com ela de maneira equilibrada
e bem controlada. Como isto é
importante! As nações precisam aprender justamente esta lição. Suas
conferências fracassam porque os homens se portam como crianças, ou pior; não
se dominam, reagem violentamente. Esta condição de “embriaguez”, estas reações violentas, são uma causa da guerra. São
as causas principais de todos os fracassos da vida - no casamento, no lar e em
todas as outras esferas. Todavia, em lugar nenhum esta lição é mais importante
do que na área da disciplina aplicada aos
nossos filhos.
Em certo sentido, o segundo princípio decorre do primeiro. Se cabe ao
pai aplicar esta disciplina da maneira certa, ele jamais deverá agir caprichosamente. Não há nada mais
irritante para quem está se submetendo à disciplina do que a percepção de que a
pessoa que a está ministrando é caprichosa e incerta. Não há nada mais aborrecido para um filho do que o tipo de pai cujos sentimentos e atos nunca
podem ser previstos, pessoa variável, cujas condições
pessoais são sempre incertas. Não há pior tipo de pai do que aquele que, um
dia, com temperamento bondoso, é indulgente e deixa o filho fazer quase
tudo que quer, contudo no dia seguinte fuzila
de raiva se o filho mal chega a fazer alguma coisa. Isso torna a vida
impossível para o filho. Uma atitude excêntrica do pai é, de novo, indicativa
da condição de quem está “cheio de vinho”.
As reações de um homem embriagado são imprevisíveis; não se pode dizer se ele
vai mostrar-se jovial ou com mau gênio; ele não é governado pela razão, não tem domínio próprio, não tem equilíbrio. Tal pai, torno a dizê-lo,
não exerce uma disciplina verdadeira
e proveitosa, e a situação do filho
fica impossível. Este é provocado e irritado, vindo a irar-se, e perde todo o respeito pelo pai.
Estou me referindo não somente a reações temperamentais, e sim também
à conduta. O pai que não é coerente em sua conduta
não pode exercer disciplina no caso
do filho. O pai que faz uma coisa hoje e o contrário amanhã, não é capaz de ministrar boa disciplina. Tem que haver
coerência, não somente na reação, mas também na conduta e no comportamento do
pai; precisa haver um padrão quanto à vida do pai, pois o filho está sempre observando e vigiando. No entanto, se o filho vê que o pai é variável e que faz exatamente aquilo que
proíbe ao filho, de novo não se pode
esperar que o filho se beneficie com qualquer disciplina ministrada por um tal
pai. Não pode haver nada de variável,
caprichoso, incerto ou inconstante
nos pais, se é que estes querem exercer disciplina.
Outro princípio muito importante é que os pais nunca devem ter a mente e os ouvidos fechados para os argumentos do filho. Não há nada que aborreça tanto aquele que está sendo
disciplinado como a percepção de que todo o procedimento é completamente irracional. Noutras palavras, é um pai
totalmente mau aquele que não se
dispõe a levar em consideração quaisquer circunstâncias, ou que não quer ouvir nenhuma explicação concebível. Alguns pais e mães, em seu desejo de exercer
disciplina, são propensos a tornarem-se inteiramente irracionais, e eles mesmos
podem estar equivocados. O relato que receberam a respeito do filho pode ser
errôneo, ou podem existir circunstâncias peculiares que eles ignoram; porém ao
filho não é dada permissão nem sequer para expor a sua situação ou para dar
algum tipo de explicação. Naturalmente se pode ver que o filho poderá tirar
proveito disso. O que estou dizendo é que jamais devemos ser irracionais. Deixe
que o filho dê a sua explicação e, se
não for uma explicação verdadeira, castigue-o por isso, bem como pelo ato
particular que constitui a transgressão visada. Mas, negar-se a ouvi-lo, proibir toda espécie de réplica, é
indesculpável.
Este princípio nos fica claro quando vemos um Estado portando-se mal.
Não nos agrada um Estado policial, temos orgulho da Lei do Habeas Corpus neste
país, lei que declara que é um grave mal manter um homem na prisão sem lhe
conceder um julgamento. Somos eloqüentes sobre isto, porém muitas vezes fazemos
exatamente a mesma coisa em nossos lares. Não é dada ao filho nenhuma
oportunidade para expor o seu caso, nem por um momento a razão tem vez na
situação, recusamo-nos a sequer admitir a possibilidade de que haja alguma
explicação a respeito da qual até então nada ouvimos. Tal conduta é sempre
errada; é provocar a ira a nossos
filhos. Com todo a certeza, isso vai exasperá-los e irritá-los,
levando-os a um estado de rebelião e antagonismo.
No entanto, há outro princípio a considerar - o pai nunca deve ser egoísta. “Pais, não provoqueis a ira a vossos filhos.” Isto acontece às vezes
devido ao puro e simples egoísmo dos pais. Minha denúncia visa aquelas pessoas
que não reconhecem que o filho tem sua própria vida e sua própria
personalidade, e que parecem achar que os filhos são inteiramente para o prazer
delas ou para o seu uso. Têm uma noção essencialmente falsa da paternidade e do
que ela significa. Não entendem que são apenas tutores e guardiães
destas vidas que nos são entregues, que não somos seus donos, que elas não nos “pertencem”,
que não são "‘mercadorias” ou “bens”, que não temos direitos absolutos
sobre elas. Mas há muitos pais que se comportam como se tivessem esse direito de propriedade; e a personalidade do filho
não recebe nenhum reconhecimento. Não há nada — mais deplorável ou repreensível
do que um pai dominador. Refiro-me ao
tipo de pai ou mãe que impõe a sua personalidade ao filho, e que está sempre
esmagando a personalidade do filho; o tipo de pai ou mãe que exige tudo e tudo
espera do filho. Geralmente estes pais são descritos como possessivos. Sua atitude é sumamente cruel e, infelizmente, pode persistir na vida adulta dos filhos.
Algumas das maiores tragédias que encontrei em minha experiência
pastoral eram resultantes disso. Conheço muitas pessoas cujas vidas foram
totalmente arruinadas por pais egoístas,
possessivos, dominadores. Conheço muitos homens e muitas mulheres que nunca se
casaram por esta razão. Fizeram com que eles se sentissem criminosos só por
pensarem em deixar pai e mãe; tiveram que dedicar a vida toda aos pais. Por que
teriam vindo ao mundo, senão para isso? Não lhes fora permitido ter sua vida própria, independente, nem desenvolver
a sua personalidade; um pai despótico
ou uma mãe dominadora esmagara a vida, a individualidade
e a personalidade do filho ou da filha. Isso não é disciplina; é tirania do tipo mais repugnante, e uma
contradição do claro e simples ensino das Escrituras. É totalmente
indesculpável e, à medida que oprime a personalidade do filho, produz
ressentimento. Como evitá-lo? Estejamos certos de que estamos completamente
livres disso. “E não vos embriagueis com
vinho, em que há contenda.” O bêbado só pensa em si, seu único interesse é
sua própria satisfação. Se pensasse nos outros, nunca se embriagaria, porque
bem sabe que isso os faz sofrer. A embriaguez é uma manifestação de egoísmo, é
auto-indulgência consumada. Não devemos ter esse espírito com respeito a coisa
nenhuma, e particularmente nesta relação sumamente delicada entre pais e
filhos.
Contudo, repito: a punição, a disciplina, jamais deverá ser ministrada
de maneira mecânica. Há gente que acredita na disciplina pela disciplina. Esse
não é o ensino
bíblico, mas sim a filosofia do sargento
instrutor. Não há nada que dizer a favor dela; não tem nada de inteligente!
Isso é o que há de horrível com tal disciplina. No Exército e nas outras forças armadas a disciplina é
pouco ou nada inteligente; é feita em termos de números, e a personalidade não
é levada em conta. Pode ser que essa forma de disciplina seja necessária lá,
porém quando penetra na esfera do lar, é imperdoável. Noutras palavras, é
preciso haver uma razão para aplicar-se a disciplina de maneira correta e
genuína; não deve ser aplicada de maneira mecânica. Sempre deverá ser
inteligente; sempre deverá existir uma razão para a sua aplicação, e
essa razão deve ser exposta com simplicidade
e clareza. Nunca deve ser aplicada à
semelhança de alguém que aperta um botão, e espera o resultado inevitável. Isso
não é disciplina verdadeira; nem humana é. Pertence aos domínios da mecânica.
Mas a disciplina verdadeira sempre se baseia
no entendimento; tem mensagem própria;
tem explicação para dar.
Observem que em todo o transcurso do nosso estudo, estamos vendo que é
necessário atingir um equilíbrio. Ao
criticarmos o conceito moderno que não reconhece nenhuma disciplina, observamos
que ele parte do pressuposto de que tudo que se tem que fazer é dar explicações
e fazer apelos, e tudo estará bem. Vimos claramente que esse conceito não é
válido, nem na teoria, nem na prática; todavia, é igualmente errado arrojar-se
para o outro extremo e dizer: “Isto tem
que ser feito porque eu mando. Não há nada que perguntar, e não será dada
nenhuma explicação.” A disciplina cristã, equilibrada, nunca é mecânica; é
sempre dinâmica, é sempre pessoal, é sempre compreensível e, acima de tudo, é sempre altamente inteligente. Sabe o que faz e nunca peca por excesso. Não perde o domínio
próprio, não é uma espécie de cachoeira a derramar-se de maneira descontrolada
e violenta. Há sempre este fator inteligente e compreensível no âmago e no
centro da verdadeira disciplina.
Isso leva inevitavelmente ao sexto princípio. A disciplina nunca deve
ser demasiado severa. Aí talvez
esteja o perigo que confronta muitos bons pais atualmente, quando vêem a
rebeldia generalizada que os cerca, e a lamentam e a condenam. Correm o perigo
de influenciar-se tão intensamente por sua revolta, que vão direto ao outro
extremo e se tornam severos demais. O
oposto da ausência de disciplina não é a
crueldade, e sim a disciplina
equilibrada, controlada. Um
antigo adágio nos fornece a regra e a lei fundamentais acerca de toda esta matéria. É
que “a punição deve ser proporcional ao
crime.” Noutras palavras, devemos ter o cuidado de não aplicar a punição máxima a todas as transgressões, grandes ou pequenas. Isto
simplesmente equivale a dizer de novo que a punição não deve ser mecânica; pois se a punição
dada for desproporcional ao mau comportamento, ao crime, ou seja ao que for,
não pode ser boa. Inevitavelmente dará à pessoa punida uma sensação de injustiça, um sentimento de que a punição é tão severa,
tão fora de proporção com o mal praticado, que constitui um ato de violência,
não de correção saudável. Isso inevitavelmente produz esta “ira” de que o apóstolo fala. O filho se
irrita e acha que a punição é irracional. Embora talvez esteja disposto a
admitir alguma culpa, ele está seguro de que a culpa não foi tão grave para
merecer aquilo tudo. Para expressá-lo doutro modo, jamais devemos humilhar
outra pessoa. Se ao punir ou ministrar disciplina ou correção cometermos o erro
de humilhar o filho, é claro que nós
mesmos precisaremos ser disciplinados. Nunca humilhemos ninguém! Certamente
devemos castigar, se necessário, mas
que seja uma punição razoável, baseada no entendimento. E nunca o
façamos de modo que o filho pense que está sendo espezinhado e completamente humilhado em nossa presença, e pior
ainda, na presença de outros.
Tudo isso, bem sei, pode ser muito difícil; porém, se somos “cheios dc Espírito”, faremos bom
julgamento nestas questões. Aprenderemos que nossa ministração da disciplina
jamais deverá ser apenas um meio de aliviar nossas tensões emocionais. Isso é sempre errado; e nunca devemos
deixar-nos governar pelo prazer de punir; tampouco, como já
salientei, devemos pisar na personalidade e na vida do indivíduo com quem
estamos lidando. O Espírito nos admoesta a sermos extremamente cuidadosos neste
ponto. No momento em que a personalidade é posta para fora e esta rígida, dura e áspera a idéia de punição entra, somos culpados das coisas
contra as quais Paulo nos adverte. Então estaremos irritando e provocando a ira
a nossos filhos, e os estaremos tornando rebeldes. Perderemos o respeito deles e os faremos pensar que estão
sendo maltratados; um senso de injustiça se
inflamará dentro deles, e acharão que estamos sendo cruéis. Isso não beneficia
nenhuma das partes e, portanto, jamais deveremos tentar aplicar disciplina
desse modo.
Assim chegamos àquilo que, de muitas maneiras, é a última das nossas
considerações em termos negativos. Nunca devemos deixar de reconhecer o crescimento e o desenvolvimento dos nossos filhos.
Este é outro alarmante defeito paterno que, graças a Deus, não se vê hoje com
tanta freqüência como antigamente. Ainda existem, no entanto, alguns pais que
continuam a considerar os seus filhos a vida toda como se nunca tivessem saído
da meninice. Os filhos podem ter
vinte e cinco anos de idade, mas são tratados como se tivessem cinco. Esses pais não reconhecem que
esta pessoa, este indivíduo, este filho que Deus lhes deu por Sua graça, é
alguém que está crescendo e se desenvolvendo e amadurecendo. Não reconhecem que a personalidade do filho está florescendo, que ele está obtendo
conhecimento, que sua experiência está se alargando, e que o filho está se
desenvolvendo como acontecera com eles próprios. Isso é de particular
importância no estágio da adolescência;
daí, um dos maiores problemas sociais de hoje é o que está relacionado com o manejo e o tratamento do adolescente.
É
o problema das escolas dominicais, como também das escolas diárias. Os
professores da escola dominical atestam que têm pouca dificuldade enquanto as
crianças não chegam à adolescência, mas que, aí, tendem a perdê-las. Os pais
acham a mesma coisa. Este período da adolescência é, notoriamente, a idade
mais difícil, pela qual todos têm que passar e, portanto, precisa de graça especial, compreensão, e do mais cuidadoso manejo.
Como pais, nunca deveremos ser culpados de não reconhecer este fator,
e temos que procurar ajustar-nos a ele. Pelo fato de você poder dominar o
seu filho, digamos até à idade de nove ou dez anos, não deve dizer: “Vou continuar agindo assim, dê no que der. A
vontade dele tem que ser dobrada pela minha. Não me importa o que ele sinta, ou o que ele entenda, as crianças sabem muito
pouca coisa, de modo que continuarei a impor-lhe a minha vontade”. Pensar e agir assim significa que certamente você provocará a ira a seu filho e, com isso, irá
causar-lhe grande dano. Irá causar-lhe dano psicológico, e até poderá causar- lhe dano físico. Criará nele vários tipos de enfermidades psicossomáticas, tão comuns nos dias atuais. Essa espécie de comportamento por parte
dos pais é prolífico na produção desses efeitos e resultados. Nunca deveremos
ser culpados desse erro.
“Como evitarei todos estes males?”,
você perguntará. Uma boa regra é que nunca devemos impingir nossas idéias em nossos filhos. Até certa idade é certo e
bom ensinar-lhes certas coisas e insistir nelas, e não haverá dificuldade
nisso, se for feito corretamente. Eles até gostarão disso. Mas depressa
chegarão a uma idade em que começarão a ouvir
conceitos e idéias dos seus
amigos, provavelmente na escola ou noutras agremiações. É quando a crise começa
a desabrochar. Todo o instinto dos pais leva-os, muito acertadamente, a
proteger o filho, porém, outra vez, isso pode ser feito de tal maneira que
causa mais dano do que benefício. Se você der ao filho a impressão de que ele
tem que acreditar nestas coisas simplesmente porque você acredita nelas, e
porque seus pais também acreditavam, inevitavelmente criará uma reação. É
antibíblico agir assim. E não somente é antibíblico, mas também põe à mostra
uma triste falta de compreensão da doutrina neotestamentário da regeneração.
Surge neste ponto um importante princípio que se aplica não somente a
esta esfera, mas também a muitas outras. Constantemente estou tendo que dizer a
pessoas que se tomaram cristãs e cujos entes queridos não são cristãos, que
tenham muito cuidado. Eles mesmos vieram a enxergar a verdade cristã, e não
podem entender por que estes outros membros da família - marido, esposa, pai.
Mãe, ou filho - não a enxergam. Toda a tendência desses cristãos é de
impacientar-se com eles e de forçá-los à fé cristã, de impingir neles sua
crença. De modo nenhum se deve fazer isso. Se a pessoa em questão não foi regenerada, não poderá exercer fé.
Precisamos ser “vivificados”, antes de podermos crer. Quando a pessoa está morta “em ofensas
e pecados” (Ef 2:1), não pode crer; portanto, não se pode
impingir fé nos outros. Eles não enxergam a verdade, não podem compreendê-la. “Ora, o homem natural não compreende as
coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las.
porque elas se discernem espiritualmente” (1 Co 2:14). Muitos pais caíram
neste erro justamente neste ponto. Tentaram arrastar seus filhos, no estágio da
adolescência, para a fé cristã; tentaram impingir-lhes seus conceitos, tentaram
compeli-los a dizerem coisas nas quais na verdade não criam. Este método é
sempre errado.
“Bem, o que se pode fazer?”,
serei interrogado. Nosso interesse é tentar ganhá-los, é tentar mostrar-lhes a
excelência e a racionalidade do que somos
e do que cremos. Devemos ser muito
pacientes com eles e tolerar as dificuldades que apresentam. Eles têm os seus
problemas, embora estes não signifiquem nada para você. Contudo, para eles
esses problemas são muito reais. Toda a arte de exercer disciplina está em
reconhecer esta outra personalidade o tempo todo. Você deve colocar-se no lugar
do seu filho, por assim dizer, e com real simpatia, amor e compreensão tentar
ajudá-lo. Se os filhos recusarem e rejeitarem os seus esforços, não reaja
violentamente, mas faça-os perceber que você sente muito, que você se entristece por amor deles, e que você
acha que algo muito precioso está se perdendo. E, ao mesmo tempo, deve
fazer-lhes tantas concessões quantas
puder. Não deve ser duro e rígido, não deve negar-lhes nada
automaticamente sem qualquer razão, simplesmente porque é o pai e este é seu
método e seu modo de agir. Ao contrário, deve preocupar-se em fazer toda legítima concessão que puder, ir tão
longe quanto puder em matéria de
concessão, mostrando com isso que você respeita a personalidade e a individualidade
do seu filho. Isso, em si e por si, é sempre bom e certo, e sempre redundará em
benefício.
Permitam-me resumir a minha argumentação. A disciplina deve ser sempre
praticada com amor, e se você não
puder praticá-la com amor, não tente aplicá-la de modo nenhum. Nesse caso, terá
necessidade de tratar de si próprio
primeiro. O apóstolo já nos disse que devemos falar a verdade com amor, num sentido mais geral, porém exatamente
a mesma coisa aplica-se aqui. Fale a verdade, mas com amor. Com a disciplina é
precisamente a mesma coisa; deve ser governada
e dirigida pelo amor. “E não vos embriagueis com vinho, em que há
contenda (ou “excesso”), mas enchei-vos do Espírito.” Qual é “o fruto do Espírito”? “Caridade (ou “amor”), gozo, paz, longanimidade, benignidade bondade, fé,
mansidão, temperança”. Se como pais, estamos cheios do Espírito, e produzimos tal fruto, a disciplina não será grande problema para nós. “Caridade, gozo, paz, longanimidade” - sempre com amor, sempre para o bem do filho. O
objetivo da disciplina não é manter o seu padrão ou dizer: “Decidi que tem que ser assim, e assim será”.
Você não deve pensar primordialmente em si próprio, e sim no filho. O bem do
filho deve ser o seu motivo dominante. Você deve ter um conceito correto da paternidade e considerar o filho como
uma vida que Deus lhe deu. Para quê?
Para guardar para você e moldar segundo o seu modelo, para impor-lhe a sua personalidade? Absolutamente
não! Pelo contrário, foi colocado sob
os seus cuidados e sob a sua
responsabilidade por Deus, para que a alma
dele finalmente venha a conhecê-l0 e a conhecer o Senhor Jesus Cristo.
O filho é uma entidade como você, dada, enviada por Deus a este mundo como
você. Assim, você deve olhar para os seus
filhos primariamente como almas, e não como você olha para um animal que
você possui, ou para certos bens que lhe pertencem. Seu filho é uma alma que Deus lhe deu, e você deve agir como seu tutor e seu depositário.
Finalmente, a disciplina sempre deve ser exercida de modo que leve os
filhos a respeitarem seus pais. Nem sempre eles entenderão e, provavelmente,
por vezes acharão que não merecem castigo. Entretanto, se somos “cheios do Espírito”, o efeito de nossa
ação disciplinar será que eles nos amarão e nos respeitarão; e virá o dia em
que nos agradecerão por havermos agido assim. Mesmo quando queiram defender-se,
haverá alguma coisa dentro deles que lhes dirá que estamos certos. Terão um
respeito fundamental pelo nosso caráter. Eles ficam vigiando as nossas vidas;
observam a disciplina e o autodomínio que exercemos sobre nós mesmos, e vêem
que o que fazemos com eles não é algo caprichoso, que não estamos apenas dando
escape às nossas tensões emocionais e procurando alívio. Saberão que os amamos,
que estamos interessados em seu bem-estar e em beneficiá-los neste mundo pecaminoso e mau; e assim haverá este respeito, esta admiração, esta apreciação
e este amor subjacentes.
“E vós, pais, não provoqueis a
ira a vossos filhos.” Que tremenda coisa a vida é! Como são maravilhosas
todas estas relações - marido, esposa, pais, filhos! Vemos
pessoas no mundo que nos cerca precipitando-se para o casamento e
precipitando-se para sair do casamento. Quanto aos filhos, muitos deles não têm
a mínima idéia do que a paternidade realmente significa! Para muitos pais os
filhos não passam de um estorvo, ora exageradamente
mimados, ora severamente punidos;
muitas vezes deixados sozinhos em
casa enquanto os pais saem para se divertirem; enviados a internatos escolares
para que os pais tenham liberdade! Quão pouco se pensa no filho, em seu sofrimento, nas pressões que se exercem sobre a sua natureza sensível! A tragédia
disso tudo é que as vidas dessas pessoas não são governadas pelos ensinamentos do Novo Testamento: não são “cheias do Espírito”; não tratam seus
filhos como Deus nos trata, em Seu
infinito amor, bondade e compaixão. Imagine, se Deus nos tratasse como
freqüentemente tratamos nossos filhos! Ah, a longanimidade de Deus!
Ah, a paciência de Deus! Ah, a admirável maneira pela qual Ele tolera as nossas
maldades como fez com as maldades dos filhos de Israel da antiguidade! Para
mim, não há nada mais admirável que a paciência de Deus, e Sua longanimidade para conosco. Digo ao povo cristão, e a todos quantos de algum modo
são responsáveis pela disciplina de crianças e jovens, “haja em vós o mesmo sentimento que houve também em Cristo Jesus”
(Filipenses 2:5). E que o mesmo amor esteja também em nós, para que não provoquemos
a ira a nossos filhos e com isso, os envolvamos, e a nós também, em todas as
más conseqüências do nosso fracasso.
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