segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

SÉRIE DE NOTAS SOBRE O PENTATEUCO – C. H. MACKINTOSH

— CAPÍTULO 25 —

O TABERNÁCULO

A Ordem Divina

Este capítulo é o começo de um dos mais ricos filões da mina inesgotável de inspiração — um veio no qual cada pancada do alvião descobre riquezas incontáveis. Sabemos qual é o único alvião com o qual podemos trabalhar numa tal mina, a saber, o ministério distinto do Espírito Santo. A natureza humana nada pode fazer aqui. A razão é cega e a imaginação completamente inútil; a inteligência mais elevada, em vez de estar em estado de interpretar os símbolos sagrados, parece-se mais a um morcego ante o resplen­dor do sol, chocando-se contra os objetos que é inteiramente incapaz de discernir. Devemos obrigar a razão e a imaginação a ficarem a parte, enquanto, com um coração puro, um olhar sensato e pensamentos reverentes entramos nos recintos santos e contem­plamos fixamente o mobiliário cheio de significado. Deus o Espírito Santo é o único que nos pode guiar através dos recintos da casa do Senhor e de interpretar para as nossas almas o verdadeiro significado de tudo que se apresenta à nossa vista. Querer dar a sua explicação com o auxílio de faculdades não santificadas seria mais absurdo do que tentar reparar um relógio com as tenazes e o martelo de um ferreiro. "As figuras das coisas que estão no céu" (Hb 9:23) não podem ser interpretadas pela mente natural, ainda mesmo a mais cultivada. Devem ser lidas à luz do céu. O mundo não tem nenhuma luz que possa revelaras suas belezas. Aquele que produziu as figuras é o único que pode explicar o que elas significam. E Aquele que deu os símbolos é quem pode interpretá-los.
Para a vista do homem parecerá que há irregularidade na maneira como o Espírito apresenta o mobiliário do tabernáculo; mas, na realidade, como poderia esperar-se, existe a mais perfeita ordem, a precisão mais notável e a exatidão mais minuciosa. Desde o capítulo 25 ao capítulo 30, inclusive, temos uma parte distinta do Livro do Êxodo. Esta parte subdivide-se em duas partes, das quais a primeira termina no versículo 19 do capítulo 27, e a segunda no fim do capítulo 30. A primeira começa com a descrição da arca do concerto, dentro do véu, e termina com o altar de bronze e o átrio no qual o altar devia ser posto. Quer dizer, dá-nos, em primeiro lugar, o trono do juízo do Senhor, sobre o qual Ele se assentava como Senhor de toda a terra; e este trono conduz-nos àquele lugar onde o Senhor encontra o pecador em virtude e com base na obra de uma expiação consumada. Depois, na segunda parte temos a maneira de o homem se aproximar de Deus—os privilégios, as honras, e as responsabilidades daqueles que, como sacerdotes, podem aproximar-se da presença Divina para prestarem culto e gozarem da Sua comunhão. Deste modo a ordem é perfeita e bela. Como poderia ser de outro modo, visto que é divinal A arca e o altar de bronze apresentam, em certo sentido, dois extremos. A primeira era o trono de Deus estabelecido em "justiça e juízo" (SI 89:14). A última era o lugar onde o pecador podia aproximar-se, porque "a misericórdia e a verdade" iam adiante do rosto de Jeová. O homem, por si mesmo, não ousava aproximar-se da arca para se encontrar com Deus, porque o caminho do santuário não estava ainda desco­berto (Hb 9:8). Porém, Deus podia vir ao altar de bronze para encontrar o pecador. "A justiça e o juízo" não podiam admitir o pecador no santuário; mas a misericórdia e a verdade podiam fazer sair Deus—não envolto naquele resplendor irresistível e majestade com que costumava brilhar do meio das colunas místicas do Seu trono—"os querubins de glória"—, mas rodeado daquele ministé­rio gracioso que nos é apresentado, simbolicamente, no mobiliário e nas ordenações do tabernáculo.
Tudo isto nos pode muito bem recordar o caminho que percor­reu Aquele bendito Senhor que é o antítipo de todos estes símbolos —a substância destas sombras. Ele desceu do trono eterno de Deus no céu até à profundidade da cruz no Calvário. Deixou toda a glória do céu pela vergonha da cruz, a fim de poder conduzir o Seu povo remido, perdoado e aceite por Si Mesmo, e apresentá-lo inculpável diante daquele próprio trono que Ele havia abandona­do por amor deles. O Senhor Jesus preenche, em Sua própria Pessoa e obra, todo o espaço entre o trono de Deus e o pó da morte, assim como a distância entre o pó da morte e o trono de Deus. N'Ele Deus desceu, em perfeita graça, até ao pecador, e n'Ele o pecador é conduzido, em perfeita justiça, até Deus. Todo o caminho, desde a arca ao altar, está marcado com as pegadas do amor; e todo o caminho desde o altar de bronze até a arca de Deus estava salpicado com sangue da expiação; e todo adorador ao passar por esse caminho maravilhoso vê o nome de Jesus impresso em tudo que se oferece à sua vista. Que este nome venha a ser o mais precioso de nossos corações!
Vamos proceder agora ao exame dos capítulos que se seguem.
É interessante notar que a primeira coisa que o Senhor revela a Moisés é o Seu propósito gracioso de ter um santuário ou santa habitação no meio do Seu povo — um santuário formado de materiais que indicavam Cristo, a Sua Pessoa, a Sua obra, e o fruto precioso dessa obra, como os vemos à luz, no poder e diversas mercês do Espírito Santo. Além disso, estes materiais eram o fruto fragrante da graça de Deus — as ofertas voluntárias de corações consagrados. Jeová, cuja Majestade o céu dos céus não poderia conter (lRs 8:27), achava o Seu agrado em habitar numa tenda erigida para Si por aqueles que nutriam o desejo ardente de saudar a Sua presença no meio deles. Este tabernáculo pode ser considerado de duas manei­ras; primeira, como uma "figura das coisas celestiais"; e, segunda, como uma figura profundamente significativa do corpo de Cristo. Os vários materiais de que se compunha este tabernáculo serão apresentados à nossa consideração à medida que formos desenro­lando o assunto. Portanto, vamos considerar os três assuntos mais importantes que este capítulo põe diante de nós, a saber: a arca, a mesa e o castiçal.


A Arca e seu Conteúdo

A arca do concerto ocupa o primeiro lugar nas comunicações divinas feitas a Moisés. Asua posição no tabernáculo era, também, notável. Encerrada dentro do véu, no lugar santíssimo, formava a base do trono de Jeová. O seu próprio nome apresentava à alma a sua importância. Uma arca, tanto quanto podemos compreender o significado da palavra, é destinada a guardar intacto o que é posto dentro dela. Foi numa arca que Noé e sua família, com todas as espécies de animais da criação, foram transportados com segurança sobre as ondas do juízo que cobriu a terra. Uma arca, como lemos no princípio deste livro, foi o vaso da fé para preservar um menino formoso das águas da morte. Quando, portanto, lemos da "arca do concerto" somos levados a crer que era destinada por Deus aguardar intacto o Seu concerto, no meio de um povo dado ao erro. Nesta arca, como sabemos, foram depositadas as segundas tábuas da lei. Quan­to às primeiras foram quebradas ao pé do monte, mostrando que o concerto do homem era de todo abolido—que o seu trabalho nunca poderia, de qualquer modo, formar a base do trono de governo de Jeová. "Ajustiça e o juízo são a habitação desse trono", quer seja no seu aspecto terrestre, quer no celestial. A arca não podia conter as tábuas quebradas dentro do seu interior sagrado. O homem podia falhar no cumprimento dos votos que havia feito voluntariamen­te; porém a lei de Deus tem de ser conservada em toda a sua integridade divina e perfeição. Se Deus estabelecia o Seu trono no meio do Seu povo, só o podia fazer de uma maneira digna de Si. O princípio do Seu juízo e governo deve ser perfeito.
"E farás varas de madeira de cetim, e as cobrirás com ouro. E meterás as varas nas argolas, aos lados da arca, para se levar com elas aarca" (versículos 13e 14). A arca do concerto devia acompanhar o povo em todas as suas peregrinações. Nunca se deteve enquanto eles se mantiveram como um exército em viagem ou no conflito: foi adiante deles até ao meio do Jordão; foi o seu ponto de reunião em todas as guerras de Canaã; era a garantia segura e certa do poder para onde quer que ia. Nenhum poder do inimigo podia subsistir diante daquilo que era a expressão bem conhecida da presença e poder de Deus. A arca devia ser a companheira inseparável de Israel no deserto; e as "varas" e as "argolas" eram a expressão exata do seu caráter ambulante.


A Arca no Templo

Contudo, a arca não deveria viajar sempre. As "aflições" de Davi(Sl 132:1) bem como as guerras de Israel deviam ter um fim. A oração, "Levanta-te, Senhor, no teu repouso, tu e a arca da tua força" (SI 132:8) devia ainda de ser feita e atendida. Esta petição sublime teve o seu cumprimento parcial nos dias auspiciosos de Salomão, quando "os sacerdotes trouxeram a arca do concerto do Senhor ao seu lugar, ao oráculo da casa, ao lugar santíssimo, até debaixo das asas dos querubins. Porque os querubins estendiam ambas as asas sobre o lugar da arca e cobriam a arca e os seus varais por cima. E os varais sobressaíram tanto que as pontas dos varais se viam desde o santuário diante do oráculo, porém de fora não se viam; e ficaram ali até ao dia de hoje' (1 Rs 8:6 - 8). A areia do deserto devia ser trocada pelo piso de ouro do templo (1 Rs 6:30). As peregrinações da arca haviam chegado ao seu termo: "adversário não havia, nem algum mau encontro", e, portanto, fizeram sobressair os varais.
Esta não era a única diferença entre a arca no tabernáculo e no templo. O apóstolo, falando da arca na sua habitação do deserto, descreve-a como "a arca do concerto, coberta de ouro toda em redor, em que estava um vaso de ouro, que continha o maná, e a vara de Arão, que tinha florescido, e as tábuas do concerto" (Hb 9:4). Estes eram os objetos que a arca continha durante as suas jornadas no deserto—o vaso de maná era o memorial da fidelidade do Senhor em prover a todas as necessidades dos Seus remidos através do deserto, e a vara de Aarão era "um sinal para os filhos rebeldes" para acabar com "as suas murmurações" (Compare-se Ex 16:32 - 34 e Nm 17:10). Porém, quando chegou o momento em que "os varais" deviam ser retirados, logo que as peregrinações e as guerras de Israel terminaram, quando "a casa magnífica em excelência" (1 Cr 22:5) foi terminada, quando o sol da glória de Israel havia chegado, em figura, ao zénite com o esplendor e a magnificência do reino de Salomão, então os memoriais das necessidades e faltas do deserto desapareceram, e nada ficou senão aquilo que constituía o fundamento eterno do trono do Deus de Israel e de toda a terra. "Aia arca, nada havia, senão só as duas tábuas de pedra que Moisés ali pusera junto a Horebe" (I Rs 8:9).
Mas toda esta glória devia ser obscurecida pelas nuvens carregadas do fracasso humano e o descontentamento de Deus. Os pés devasta­dores dos incircuncisos haviam ainda de atravessar as ruínas dessa magnífica casa, e o desaparecimento do seu brilho e da sua glória devia provocar o assobio dos estranhos (1 Reis 9:8). Este nãoéomomento de continuar em pormenor este assunto; limitar-me-ei a referir ao leitor a última menção que a Palavra de Deus faz da " arca do concerto" —uma passagem que nos transporta a uma época em que a loucura humana e o pecado não perturbarão mais o lugar de repouso da arca, e em que a arca não será guardada num tabernáculo de cortinas nem tampouco num templo feito por mãos. "E tocou o sétimo anjo a sua trombeta, e houve no céu grandes vozes, que diziam-. Os reinos do mundo vieram a ser de nosso Senhor e do Seu Cristo, e ele reinará para todo o sempre. Eos vinte e quatro anciãos, que estão assentados em seus tronos diante de Deus, prostraram-se sobre seu rostoe adoraram aDeus, dizendo: Graças tedamos, Senhor, DeusTodo-poderoso, que és, e que eras, e que hás de vir, que tomaste o teu grande poder e reinaste. E iraram-se as nações, e veio a tua ira, e o tempo dos mortos, para que sejam julgados, e o tempo de dares o galardão aos profetas, teus servos, e aos santos, e aos que temem o teu nome, a pequenos e a grandes, e o tempo de destruíres os que destroem a terra. E abriu-se no céu o templo de Deus, e a arca do seu concerto foi vista no seu templo; e houve relâmpagos, e vozes, e trovões, e terremotos, e grande saraiva" (Ap 11.15 -19).


O Propiciatório

Segue-se por sua ordem o propiciatório. "Também farás um propiciatório de ouro puro; o seu cumprimento será de dois côvados e meio, e a sua largura, de um côvado e meio. Farás também dois querubins de ouro; de ouro batido os farás, nas duas extremidades do propiciatório. Farás um querubim na extremidade de uma parte e o outro querubim na extremidade da outra parte; de uma só peça com o propiciatório farás os querubins nas duas extremidades dele. Os querubins estenderão as suas asas por cima, cobrindo com as suas asas o propiciatório; as faces deles, uma defronte da outra; as faces dos querunbins estarão voltadas para o propiciatório. E porás o propiciatório em cima da arca, depois que houveres posto na arca o Testemunho, que eu te darei. E ali virei a ti e falarei contigo de cima do propiciatório, do meio dos dois querubins (que estão sobre a arca do Testemunho), tudo que eu te ordenar para os filhos de Israel" (versículos 17 a 22).
Jeová declara aqui o Seu desígnio misericordioso de descer do monte ardente para tomar o Seu lugar sobre o propiciatório. Podia fazer isto, visto que a tábuas da lei estavam guardadas intactas na arca, e os símbolos do Seu poder, tanto na criação como na providên­cia, se elevavam à direita e à esquerda como acessórios inseparáveis deste trono em que o Senhor Se havia assentado — um trono de graça fundado na justiça e sustido pela justiça e o juízo. Ali brilha a glória do Deus de Israel. Dali emanavam os Seus mandamentos suavizados e tornados agradáveis pela origem graciosa de onde saíam— à semelhança do sol do meio-dia, cujos raios ao passarem através de uma nuvem vivificam e fecundam sem que o seu resplendor nos cegue.
"Os seus mandamentos não são pesados" quando recebidos do propiciatório, porque estão ligados com a graça que dá ouvidos para ouvir e o poder para obedecer.


O Único Lugar de Encontro

A arca e o propiciatório, considerados em conjunto como um todo, são para nós uma figura admirável de Cristo, em Sua Pessoa e Sua obra. Havendo engrandecido a lei, na Sua vida, e tornando-a honrosa, veio a ser, por meio da morte, a propiciação ou propiciatório para todo aquele que crê. A misericórdia de Deus só podia repousar numa base de perfeita justiça:".. .a graça reina pela justiça para a vida eterna, por Jesus Cristo, nosso Senhor" (Rm5:21). O único lugar próprio para o encontro entre Deus e o homem é aquele onde a graça e a justiça se encontram e se harmonizam perfeitamente. Nada senão a justiça perfeita podia agradar a Deus; e nada senão a graça perfeita pode convir ao pecador. Mas onde poderiam estes atributos encontrar-se4 Somente na cruz. E ali que a misericórdia e a verdade se encontraram; a justiça e a paz se beijaram (SI 85:10). E assim que a alma do pecador crente encontra paz. Vê que a justiça de Deus e a sua justificação repousam sobre o mesmo fundamen­to, isto é: a obra consumada por Cristo. Quando o homem, sob a influência poderosa da verdade de Deus, toma o seu lugar como pecador, Deus pode, no exercício da graça, tomar o Seu como Salvador, e então toda a questão se acha solucionada, porque havendo a cruz respondido a todas as exigências da justiça divina, os rios da graça podem correr sem impedimento. Quando o Deus justo e o pecador se encontram sobre uma plataforma salpicada de sangue tudo está solucionado para sempre — solucionado de maneira a glorificar Deus perfeitamente e salvar o pecador para toda a eternidade. Seja Deus verdadeiro, ainda que todo o homem seja mentiroso; e quando o homem é levado inteiramente ao ponto mais baixo da sua condição moral diante de Deus e está pronto a aceitar o lugar que a verdade de Deus lhe designa, então reconhece que Deus Se revelou como o Justo justificador. Isto deve dar paz à consciência; e não apenas paz, mas concede a capacidade de comungar com Deus e de ouvir os Seus santos preceitos no conhecimento daquela relação em que a graça divina nos introduziu.
Por isso, "o lugar santíssimo" oferece-nos uma cena verdadeira­mente admirável. A arca, o propiciatório, os querubins, a glória! Que espetáculo para o sumo sacerdote de Israel quando entrava dentro do véu! Que o Espírito de Deus abra os olhos do nosso entendimento de modo a podermos compreender melhor o profun­do significado destes símbolos preciosos.


A Mesa do Pão da Proposição

Moisés recebe em seguida instruções quanto "à mesa dos pães da proposição", ou pães de apresentação. Sobre esta mesa estava disposto o alimento dos sacerdotes de Deus. Durante sete dias os doze pães de "flor de farinha com incenso" estavam dispostos na presença do Senhor, depois do que, sendo substituídos por outros, eram o alimento dos sacerdotes, que comiam deles no lugar santo (veja-se Lv 24:5-9).
Escusado será dizer que esses doze pães simbolizam "o homem Cristo Jesus". A "fiorde farinha" da qual eram compostos, mostra a Sua perfeita humanidade, enquanto que "o incenso" indica a inteira consagração dessa humanidade a Deus. Se Deus tem os Seus sacerdotes ministrando no lugar santo, terá certamente uma mesa para eles, e uma mesa bem fornecida também. Cristo é a mesa e o pão sobre ela. A mesa pura e os doze pães mostram Cristo, presente incessantemente diante de Deus em toda a excelência da Sua imaculada humanidade e como alimento para a família sacerdotal. Os "sete dias" mostram a perfeição do gozo divino em Cristo; e os "doze pães" exprimem este gozo no homem e pelo homem. É possível que exista também a ideia de ligação de Cristo com as doze tribos de Israel e os doze apóstolos do Cordeiro.


O Candelabro

O castiçal de ouro puro vem a seguir, porque os sacerdotes de Deus têm necessidade de Luz bem como de alimento: e têm tanto uma coisa como a outra em Cristo. Neste castiçal não se faz menção de outra coisa que não seja ouro. "Tudo será de uma só peça, obra batida de ouro puro" (versículo 36). "As sete lâmpadas", as quais se "acenderão para alumiar defronte dele", exprimem a perfeição da luz e energia do Espírito, baseadas e ligadas com a eficácia perfeita da obra de Cristo. Aobra do Espírito Santo nunca poderá ser separada da obra de Cristo. Isto é indicado, de um modo duplo, nesta magnífica imagem do castiçal de ouro. As sete lâmpadas estando ligadas à cana de ouro batido indicam-nos a obra cumprida por
Cristo como a única base da manifestação do Espírito na Igreja. O Espírito Santo não foi dado antes de Jesus ter sido glorificado (comparem-se João 7:39 com Atos 19:2 a 6). Em Apocalipse, capí­tulo 3, Cristo é apresentado à igreja de Sardes como Aquele que tem "os sete espíritos". Quando o Senhor Jesus foi exaltado à destra de Deus, então derramou o Espírito Santo sobre a Sua Igrej a, a fim de que ela pudesse brilhar segundo o poder e a perfeição da sua posição no lugar santo, a sua própria esfera de ser, de ação e de culto.
Vemos, também, que uma das funções particulares de Arão consistia em acender e espevitar essas sete lâmpadas. "E falou o SENHORa Moisés, dizendo: Ordena aos filhos de Israel que te tragam azeite de oliveira puro, batido, para a luminária, para acender as lâmpadas continuamente. Arão as porá em ordem perante o Senhor continuamente, desde a tarde até à manhã, fora do véu doTestemunho, na tenda da congregação; estatuto perpétuo é pelas vossas gerações. Sobre o castiçal puro porá em ordem as lâmpadas, perante o Senhor, continuamente" (Lv 24:1-4). Desta maneira, podemos ver como a obra do Espírito Santo na Igreja está ligada com a obra de Cristo na terra e a Sua obra no céu. "As sete lâmpadas" estavam no tabernáculo, evidentemente, mas a atividade e diligên­cia do sacerdote eram necessárias para as manter acesas e espevitadas. O sacerdote necessitava continuamente dos "espevitadores" e dos "apagadores" para remover tudo que pudesse impedir o livre curso do "azeite batido". Esses espevitadores e apagadores eram igual­mente feitos de "ouro batido" porque todas essas coisas eram o resultado imediato da operação divina. Se a Igreja brilha, é unica­mente pela energia do Espírito, e esta energia está fundada em Cristo, que, em virtude do desígnio eterno de Deus, veio a ser, em Seu sacrifício e sacerdócio, o manancial e poder de todas as coisas para a Sua Igreja. Tudo é de Deus. Quer olhemos para dentro desse véu misterioso e contemplemos a arca com a sua coberta e as duas figuras significativas, ou admiremos o que está da parte de fora desse véu, a mesa pura e o castiçal puro, com os seus vasos e respectivos utensílios — tudo nos fala de Deus, quer seja revelando-Se em ligação com o Filho ou o Espírito Santo.
A chamada celestial coloca o leitor cristão no próprio centro de todas estas preciosas realidades. O seu lugar não está apenas no meio das" figuras das coisas que estão no céu", mas no meio das "próprias coisas celestiais". Tem "ousadia para entrar no santuário pelo sangue de Jesus". É sacerdote para Deus. O pão da proposição lhe pertence. O seu lugar é à mesa pura, para comer o pão sacerdotal, na luz. do Espírito Santo. Nada o poderá privar desses privilégios divinos. São seus para sempre. Esteja em guarda contra tudo que possa privá-lo dogozo deles. Guarde-se contra toda a irritabilidade, a cobiça, de todo o sentimento e imaginações. Domine a sua natureza, lance o mundo fora de seu coração, afugente Satanás. Que o Espírito Santo encha inteiramente a sua alma de Cristo. Então será praticamente santo e sempre ditoso. Dará fruto, e o Pai celestial será glorificado, e o seu gozo será completo.



— CAPÍTULO 26 —

A ESTRUTURA DO
TABERNÁCULO


Os Materiais


Esta parte do livro do Êxodo inclui a descrição das cortinas e da cobertura do tabernáculo, nas quais a mente espiritual discerne as sombras das várias fases e traços do caráter de Cristo. "E o tabernáculo farás de dez cortinas de linho fino torcido, e pano azul,e púrpura, e carmesim; com querubins as farás, de obra esmerada". Aqui temos os diferentes aspectos do "homem Jesus Cristo" (1 Tm 2:5). O "linho fino torcido" representa a pureza imaculada da Sua vida e do Seu caráter; enquanto que o "azul, púrpura e carmesim" no-Lo apresentam como "o Senhor do céu", que deve reinar segundo os desígnios divinos, mas Cuja realeza deve ser o resultado dos Seus sofrimentos. Desta forma, temos n'Ele um homem puro, homem celestial, régio e sofredor. Os diferentes materiais mencionados aqui não eram apenas limitados às "cortinas" do tabernáculo, como deviam ser também usados para o "véu" (versículo 31), a "coberta" da porta da tenda" (versículo 36), a coberta da "porta do pátio" (capítulo 27:16), e "os vestidos do ministério" e "os vestidos santos para Arão" (capítulo 39:1). Em suma, era Cristo em todo as partes, Cristo em tudo, somente Cristo (¹).
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(¹) A expressão "puro e resplandecente" (Ap 19:8) dá força e formosura peculiar ao símbolo que o Espírito Santo nos apresenta no "linho fino torcido". Com efeito, não é possível encontrar-se um emblema mais exato de natureza imaculada.


O LinhoTorcido


O "linho fino torcido", como figura da humanidade imaculada de Cristo, abre um manancial precioso e abundante de pensamento para a inteligência espiritual: dá-nos um tema sobre o qual nunca é demais meditar. A verdade quanto à humanidade de Cristo deve ser recebida com toda a exatidão escriturai, mantida com energia espiritual, guardada com santo zelo e confessada com poder celestial. Se estivermos enganados quanto a este ponto de capital importân­cia não podemos estar dentro da verdade sobre coisa alguma. É uma verdade essencial e fundamental, e se não for recebida, defendida e confessada tal qual Deus a revelou na Sua santa Palavra, todo o edifício não terá solidez. Nada pode ser mais deplorável que o relaxamento que parece prevalecer e predominar nos pensamentos e expressões de alguns sobre esta doutrina tão importante. Se houvesse mais reverência pela palavra de Deus, haveria um conhe­cimento dela mais perfeito; e, deste modo, evitar-se-iam essas declarações erróneas e irrefletidas que certamente devem entriste­cer o Espírito de Deus, Cuja incumbência é testemunhar de Jesus. Quando o anjo anunciou a Maria as boas novas do nascimento do Salvador, ela disse-lhe: "Como se fará isto, visto que não conheço varão"?- "A sua fraca inteligência era incapaz de compreender, muito menos profundar, o estupendo mistério de "Deus manifestado em carne" (l Tm 3:16). Mas note-se com atenção a resposta do anjo— resposta dada não a umespírito céptico, mas a um coração piedoso, embora ignorante. "Descerá sobre ti o Espírito Santo, e a virtude do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra; pelo que também o Santo que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus" (Lc 1:34-35). Maria imaginava, sem dúvida que este nascimento deveria ter lugar segundo os princípios ordinários da geração. Mas o anjo corrige o seu equívoco, e, corrigindo-o, anuncia uma das maiores verdades da revelação. Declara que o poder divino estava prestes a formar UM HOMEM VERDADEIRO—" o segundo homem, o Senhor do céu" (1 Co 15:47): um homem cuja natureza seria divinamente pura, inteiramente incapaz de receber ou de comunicar a mais pequena mancha. Este Ser santo foi formado, à "semelhança da carne do pecado", sem pecado na carne. Participou inteiramente da carne e do sangue sem uma partícula ou sombra de mal ligado com eles.
Esta verdade é de primacial importância, nunca será retida com fidelidade e firmeza excessiva. A incarnação do Filho, a segunda Pessoa da Trindade eterna, a Sua entrada misteriosa em carne pura e sem mácula, formada pelo poder do Altíssimo, no ventre da virgem, é o fundamento do "mistério da piedade" (ITm 3:16), do qual a cimalha é o Deus-homem glorificado no céu, a Cabeça, Representante e Modelo da Igreja remida de Deus. A pureza essen­cial da Sua humanidade satisfez perfeitamente as exigências de Deus; enquanto que a sua realidade correspondia às necessidades do homem. Era homem, porque só um homem podia responder pela ruína do homem. Porém, era homem tal que podia dar satisfação a todas as exigências do trono de Deus. Era um homem imaculado, verdadeiro homem, em quem Deus podia achar o Seu agrado, e em quem o homem podia apoiar-se sem reservas.
Não é preciso recordar ao leitor esclarecido que tudo isto, separado da morte e ressurreição, é perfeitamente inútil para nós. Nós tínhamos necessidade não somente de um Cristo incarnado, mas de um Cristo crucificado e ressuscitado. Na verdade, Ele fez-se carne para ser crucificado; mas é por Sua morte e ressurreição que a Sua incarnação veio a ser eficaz para nós. É um erro moral crer que Cristo tomou o homem em união consigo na incarnação. Isto era impossível. Ele Próprio ensina expressamente o contrário. "Na verdade, na verdade vos digo que se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica cie só; mas se morrer dá muito fruto" (Jo 12:24). Não podia haver nenhuma união entre carne santa e pecaminosa, pura e impura, corruptível e incorruptível, mortal e imortal. A morte é a única base de união entre Cristo e os Seus membros eleitos. É em ligação com as palavras "levantai-vos, vamos" (Mc 14:42) que o Senhor diz: "Eu sou a videira, vós as varas" (Jo 15:5). Porque "se fomos plantados juntamente com ele na semelhança da sua morte... o nosso homem velho foi com ele crucificado, para que o corpo do pecado seja desfeito" (Rm 6:5-6). "No qual também estais circuncidados, com a circuncisão não feita por mão no despojo do corpo da carne: a circuncisão de Cristo. Sepultados com ele no batismo, nele também ressuscitastes pela fé no poder deDeus, que o ressuscitou dos mortos" (Cl 2:11-12).
Os capítulos 6 de Romanos e 2 de Colossenses nos dão um relato pormenorizado da verdade sobre este importante assunto. Foi unicamente como morto e ressuscitado que Cristo e o Seu povo puderam tornar-se em um. O verdadeiro grão de trigo tinha de cair na terra e morrer antes que a espiga pudesse ser formada e recolhida no celeiro celestial.
Porém, embora isto seja uma verdade claramente revelada nas Escrituras, é igualmente claro que a incarnação formava, por assim dizer, os alicerces do glorioso edifício; e as cortinas de "linho fino" apresentam-nos, em figura, a beleza moral do "Homem Jesus Cristo". Já vimos a maneira como Ele foi concebido; e, ao longo do curso da Sua vida aqui na terra, encontramos exemplos e mais exemplos da mesma imaculada pureza. Passou quarenta dias no deserto, sendo tentado pelo diabo, mas nada em Sua natureza respondeu às vis sugestões do tentador. Podia tocar os leprosos sem ser contaminado. Podia tocar o esquife de um defunto sem contrair o fedor da morte. Podia passar incólume pela atmosfera mais contaminada. Era, quanto à Sua humanidade, como um raio de sol que vinha da fonte de luz, o qual pode passar, sem ser atingido, pelo ambiente de maior contaminação. Foi perfeitamente único em natureza, caráter e constituição.
Só Ele podia dizer: "Não permitirás que o teu santo veja corrupção" (Sl 16:10). Isto estava em relação com a Sua humanida­de, que, sendo perfeitamente santa e pura, podia levar o pecado. "Levando ele mesmo em seu corpo os nossos pecados sobre o madeiro" (1 Pe 2:24). Não no madeiro, como alguns querem ensi-nar-nos, mas "sobre o madeiro". Foi na cruz que Cristo levou os nossos pecados, e somente ali. "Aquele que não conheceu pecado, o fez pecado por nós, para que nele fôssemos feitos justiça de Deus" (2 Co 5:21).


O Azul

"Azul" é a cor etérea e indica o caráter celestial de Cristo, o Qual, a despeito de ter entrado em todas as circunstâncias de verdadeira e autêntica humanidade—exceto o pecado—era "o Senhor do céu"
(1 Co 15:47). Sendo homem verdadeiro, andou sempre com o senti­mento da Sua própria dignidade, como estrangeiro celestial: jamais olvidou donde tinha vindo, onde estava ou para onde ia. A fonte de todo o Seu gozo estava nas alturas. A terra não podia fazê-lo mais rico nem mais pobre. Achou que este mundo era "uma terra seca e cansada, onde não havia água" (Sl 63:1); e, por isso, o Seu espírito só podia dessedentar-se nas alturas. Era inteiramente celestial: "...ninguém subiu ao céu, senão o que desceu do céu, o Filho do Homem, que está no céu" (Jo3:16).


A Púrpura

"Púrpura" indica realeza, e mostra-nos Aquele que havia "nascido rei dos judeus", que Se apresentou como tal à nação judaica e foi rejeitado; que fezumaboa confissão perante Pôncio Pilatos, decla-rando-Se rei, quando, para a visão humana, não havia um simples traço de realeza. "Tu dizes que eu sou rei" (Jo 18:37). E ".. .vereis em breve o Filho do homem assentado à direita do poder e vindo sobre as nuvens do céu" (Mt 26:64). E, por fim, a inscrição sobre a Sua cruz, em hebraico, grego e latim—a linguagem da religião, da ciência e do governo—declara, perante todo o mundo, que Ele era "Jesus Nazareno, Rei dos Judeus". A terra negou-Lhe os Seus direitos — desgraçada­mente para ela—mas não aconteceu o mesmo com o céu: ali os Seus direitos foram plenamente reconhecidas. Foi recebido como um vencedor nas moradas eternas da luz, coroado de glória e honra, e assentou-Se, por entre aclamações dos exércitos celestiais, no trono da majestade nas alturas, até que Seus inimigos sejam postos por escabelo de Seus pés. "Por que se amotinam as nações e os povos imaginam coisas vãs£ Os reis da terra se levantam, e os príncipes juntos se mancomunam contra o Senhor e contra o seu ungido, dizendo: Rompamos as suas ataduras e sacudamos de nós as suas cordas. Aquele que habita nos céus se rirá; o Senhor zombará deles. Então, lhes falará na sua ira, e no seu furor o confundirá. Eu, porém, ungi o meuRei sobre o meu santo monte Sião. Recitarei o decreto: O SENHORme disse: Tu és meu Filho; eu hoje te gerei. Pede-me, e eu te darei as nações por herança e os confins da terra por tua possessão.
Tu os esmigalharás com uma vara de ferro; tu os despedaçarás como a um vaso de oleiro. Agora, pois, ó reis, sede prudentes; deixai-vos instruir, juízes da terra. ServiaoSENHOR com temore alegrai-vos com tremor. Beijai o Filho, para que se não ire, e pereçais no caminho, quando em breve se inflamar a sua ira. BEM-AVENTURADOS TODOS AQUELES QUE NELE CONFIAM" (Salmo 2).

O Carmesim

O "carmesim", quando genuíno, é produzido pela morte e f ala-nos dos sofrimentos de Cristo:".. .Cristo padeceu por nós na carne" (1 Pe 4:1). Sem morte, tudo teria sido inútil. Podemos admirar "o azul" e a "púrpura", mas sem o "carmesim" o tabernáculo teria perdido um aspecto importante. Foi por meio da morte que Cristo destruiu aquele que tinha o império da morte. O Espírito Santo, pondo diante de nós uma figura admirável de Cristo — o verda­deiro tabernáculo —, não podia omitir aquela fase do Seu caráter que constitui o fundamento da Sua união com o Seu corpo, a Igreja, o Seu direito ao trono de Davi e o senhorio de toda a criação. Em suma, o Espírito não somente nos mostra o Senhor Jesus, nestas cortinas simbólicas, como homem imaculado, homem real, mas também como homem sofredor; aquele que, por meio da morte, adquiriu o direito àquilo que, como homem, tinha direito nos desígnios divinos.

A Primeira Cortina

Contudo, as cortinas do tabernáculo não são apenas a expressão dos diferentes aspectos do caráter de Cristo, como põem também em evidência a unidade e firmeza desse caráter. Cada um desses aspectos está exposto na sua própria perfeição; e nunca interfere com ou prejudica a beleza de outro. Tudo era harmonia perfeita aos olhos de Deus e foi assim apresentado no "modelo que no monte se mostrou" a Moisés e na sua reprodução no meio do povo. "Cinco cortinas se enlaçarão à outra; e as outras cinco cortinas se enlaçarão uma com a outra" (versículo 3). Tal era a proporção e firmeza em todos os caminhos de Cristo, como homem perfeito, andando pelo mundo, em qualquer situação ou relação que O considerarmos. Quando atua segundo um desses caracteres, não encontramos absolutamente nada que seja incompatível com a integridade divina de outro. Ele foi, em todo o tempo, em todo o lugar e em todas as circunstâncias, o homem perfeito. Nada n'Ele faltava a essa encantadora e bela proporção que Lhe era própria, em todos os Seus atos. "Todas estas cortinas serão de uma medida"(versículo 2).
Um par de cinco cortinas pode muito bem simbolizar os dois aspectos principais do caráter de Cristo atuando a favor de Deus e do homem. Vemos os mesmos dois aspectos na lei, a saber, o que era devido a Deus e o que era devido ao homem; de forma que, quanto a Cristo, se olharmos de passagem, vemos que Ele podia dizer, "a tua lei está dentro do meu coração" (SI 40); e se pensarmos na Sua conduta, vemos esses dois elementos ordenados com perfeita pre­cisão, e não só ordenados, mas inseparavelmente unidos pela graça celestial e a energia divina que habitaram na Sua gloriosa Pessoa.
"E farás laçadas de pano azul na ponta de uma cortina, na extremidade, na juntura; assim também farás na ponta da extremi­dade da outra cortina, na segunda juntura... Farás tàmbémcinqúen-ta colchetes de ouro, e ajuntarás com estes colchetes as cortinas, uma com a outra e será um tabernáculo" (versículos 4 e 6). Nas "laçadas" de azul e nos "colchetes de ouro" temos a manifestação daquela graça celestial e energia divina em Cristo que Lhe proporcionou ligar e harmonizar perfeitamente as reivindicações de Deus e as pretensões do homem; de forma que, satisfazendo tanto umas como outras, Ele nunca, nem por um momento, perturbou o Seu caráter. Quando os homens astutos e hipócritas o tentaram com a pergunta: "É lícito pagar o tributo a César, ou não?" a Sua resposta foi, "Dai... a César o que é de César e a Deus o que é de Deus" (Mt 22:17-21).
Nem foi apenas César, mas o homem em todas as suas relações que recebeu a resposta a todas as suas pretensões em Cristo. Da mesma maneira que reuniu na Sua Pessoa a natureza de Deus e humana, satisfez em Seus passos de perfeição as exigências de Deus e as pretensões do homem. Seria muito interessante seguir, através da narrativa do evangelho, a exemplificação do princípio sugerido pelas "laçadas de azul" e os "colchetes de ouro"; devo, porém, deixar que o leitor prossiga este estudo sob a direção do Espírito Santo, o Qual deseja alargar-Se sobre cada aspecto d 'Aquele bendito Senhor que é Seu propósito exaltar.

A Cortina de Pêlos de Cabras

A primeira cortina (na verdade, um par de cinco cortinas) era encoberta por outras de "pêlos de cabras" (versículos 7 a 13). Sua beleza estava escondida para os de fora por aquilo que indicava aspereza e severidade. Para aqueles que tinham o privilégio de entrar no recinto sagrado nada era visível senão o "azul", a púrpu­ra", o "camersim" e o "linho fino torcido"—a exposição combinada das virtudes e excelência desse tabernáculo divino no qual Deus habitou atrás do véu: isto é, Cristo, por Cuja carne, o antítipo de todas estas coisas, os raios dourados da natureza divina brilharam tão delicadamente que o pecador podia vê-los acabrunhado pelo seu brilho deslumbrante.
Quando o Senhor Jesus passou por este mundo, quão poucos foram aqueles que realmente o conheceram! Quão poucos tiveram os olhos ungidos com colírio celestial para penetrarem e apreciarem o profundo mistério do Seu caráter! Quão poucos viram o "azul", a "púrpura", o "carmesim" e o "linho fino torcido"! Foi só quando a fé trouxe o homem à sua presença que Ele pôde consentir que o esplendor daquilo que Ele era brilhasse — deixou que a glória atravessasse a nuvem. Para a visão natural era como se houvesse uma reserva e severidade à Sua volta, que era justamente simboli­zada pelas "cortinas de pêlos de cabras". Tudo isto era o resultado da Sua profunda separação e apartamento, não dos pecadores pes­soalmente, mas dos pensamentos e máximas dos homens. Nada tinha em comum com o homem, nem estava dentro do âmbito da natureza humana compreendê-Lo. "Ninguém pode vir a mim, se o Pai que me enviou o não trouxer"; e quando um daqueles que haviam sido trazidos confessou o Seu nome, disse-lhe que não fora a carne que lho revelara, "mas meu Pai que está nos céus" (compare Jo 6:44 e Mt 16:17). Ele era "como raiz de uma terra seca", sem "parecer" nem "formosura" para atrair a vista ou satisfazer o coração do homem. A corrente da opinião pública nunca poderia correr na direção d'Aquele que, passando rapidamente pelo palco deste mundo, ia envolto numa "cortina de pêlos de cabras". Jesus não foi popular. A multidão pôde segui-Lo por um momento, porque, para ela, o Seu ministério estava ligado com "os pães e os peixes", que respondiam à sua necessidade; mas estava igualmente tão pronta a clamar: "Tira, tira, crucifica-o" como a exclamar "Hosana ao Filho de Davi!"(Mt 21:9). Que os cristãos, os servos de Cristo, os pregadores do evangelho se lembrem disto! Quetodosnós ecadaumem particular se lembre sempre das "cobertas de pêlos de cabras".

A Cortina de Peles de Carneiros Tintas de Vermelho

Porém se as peles de cabras representavam o rigor da separação de Cristo do mundo, as "peles de carneiro, tintas de vermelho, representam a Sua consagração e afeto a Deus, mantidos mesmo até à morte. Ele foi o único servo perfeito que trabalhou na vinha de Deus. Teve um só fim, que prosseguiu com firme propósito desde a manj edoura até à cruz, e este foi glorificar o Pai e consumar a Sua obra. "Não sabeis que me convém tratar dos negócios de meu Pai1?-" Era a linguagem da Sua mocidade e o cumprimento desses "negó­cios" era o fim da Sua vida. A Sua comida era fazer a vontade d'Aquele que o tinha enviado e cumprir a Sua obra (Jo 4:34). As "peles de carneiro tintas de vermelho" formam uma parte tão distinta do Seu hábito normal como os "pêlos de cabras". A sua devoção por Deus separava-O dos hábitos dos homens.

A Cortina de Peles de Texugo

"As peles de texugo" parece indicarem a santa vigilância com que o Senhor Jesus estava em guarda contra a aproximação de tudo que era hostil ao fim que absorvia toda a Sua alma. Ele tomou a Sua posição ao lado de Deus e manteve-a com uma persistência que nenhuma influência dos homens ou demónios, da terra ou do inferno, pôde j amais vencer. A coberta de peles de texugo estava por "cima" (versículo 14), ensinando-nos que o aspecto proeminente do caráter do "Homem Cristo Jesus" era a determinação de ser uma testemunha de Deus na terra. Foi o verdadeiro Nabote, que preferiu dar a Sua vida a renunciar à verdade de Deus, ou abandonar aquilo para que havia tomado o Seu lugar neste mundo.
A cabra, o carneiro e o texugo devem ser considerados como representando certos aspectos naturais e simbolizando também certas qualidades morais, e devem tomar-se em conta na sua aplicação ao caráter de Cristo. A vista humana só podia distinguir o aspecto natural, porém não podia ver nada da graça moral, beleza e dignidade que se ocultavam debaixo da forma exterior do desprezado e humilde Jesus de Nazaré. Quando os tesouros de sabedoria divina fluíam dos Seus lábios, a interrogação daqueles que O ouviam era esta: "Não é este o carpinteirou" (Mc 6:3). "Como sabe este letras, não as tendo aprendido"?-" (Jo 7:15). Quando declarava que era o Filho de Deus e afirmava a Sua divindade eterna, respondiam-lhe: "Ainda não tens cinquenta anos", ou pegavam "em pedras para lhe atirar" (Jo 8:57- 59). Em suma, a confissão dos fariseus, "este não sabemos donde é" (Jo 9:29) era verdadeira.
Seria completamente impossível, num volume como este, se­guir o desenrolar dos aspectos preciosos do caráter de Cristo, que nos mostra o relato do evangelho. Dissemos o bastante para abrir ao leitor um manancial de meditação espiritual e dar uma ideia dos tesouros preciosos que estão envolto nas cortinas e cobertas do tabernáculo. O mistério de Cristo, motivos secretos de ação e suas perfeições inerentes — a Sua aparência exterior desprovida de atrativos —, aquilo que Ele era em Si Mesmo, o que era para Deus, e o que era para os homens, o que era segundo o juízo da fé e no parecer da natureza, tudo isto estava agradavelmente relatado aos ouvidos circuncidados pelas cortinas de azul, púrpura, carmesim e linho fino torcido, bem como na cobertura de peles.

As Tábuas e suas Bases de Prata

"As tábuas para o tabernáculo" (versículo 15) eram feitas da mesma madeira que era usada na "arca do concerto". Demais, debaixo das tábuas havia bases de prata proveniente do resgate—os "colche­tes" e as "molduras" eram igualmente de prata (compare-se atenta-mente o capítulo 30:ll a l6 com o capítulo 38:25a28). O vigamento da tenda do tabernáculo descansava todo sobre bases daquilo que indicava a expiação ou o resgate da alma; enquanto que os "colchetes" e as "molduras" da parte superior reproduziam o mesmo pensamen­to. As bases de prata estavam metidas na areia e os colchetes e as molduras estavam em cima. Qualquer que seja a profundidade a que penetrarmos ou a altura que alcançarmos acharemos esta verdade gloriosa e eterna brasonada: "JÁ ACHEI RESGATE" Qó 33:24). Bendito seja Deus, não somos resgatados "com coisas corruptíveis, como prata ou ouro,.. .mas com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado" (IPe 1:19).


Os Véus que Fecharam as Entradas

O tabernáculo estava dividido em três partes distintas: "O lugar santíssimo", "o santuário" e "o pátio do tabernáculo". A entrada para cada uma destas partes era feita dos mesmos materiais, "azul, púrpura, carmesim e linho fino torcido" (compare-se o capítulo 26:31 e 36 com 27:16). A sua interpretação é simples: Cristo é a única porta de entrada aos vários campos de glória que hão de ser ainda revelados, quer seja na terra, no céu ou no céu dos céus.
"Toda a família nos céus e na terra" (Ef 3:15) será posta sob a Sua autoridade e introduzida na felicidade e glória eternas, em virtude da expiação que Ele fez. Isto é bem claro e não exige esforço de imaginação para ser compreendido. Sabemos que é verdadeiro, e quando conhecemos a verdade que é simbolizada, o símbolo é facilmente compreendido. Se os nossos corações estivessem cheios de Cristo, não nos perderemos na nossa inter­pretação do tabernáculo e seus acessórios. Não é de um intelecto cheio de criticismo que precisamos neste estudo, mas de um coração cheio de amor porjesus e uma consciência em paz pelo sangue da cruz.
Que o Espírito Santo nos prepare para o estudo destas coisas com um maior interesse e inteligência! Que Ele abra os nossos olhos para que contemplemos as maravilhas da lei.




— CAPÍTULO 27 —

O ALTAR DE COBRE
E O ÁTRIO






O Altar de Incenso não Mencionado

Deparamos agora com o altar de cobre que estava à porta do tabernáculo, e quero chamar a atenção do leitor para a ordem seguida pelo Espírito Santo nesta parte do livro. Já fizemos notar que a passagem compreendida entre o capítulo 25 e o versículo 19 do capítulo 27 forma uma parte distinta, que nos dá uma descrição da arca e do propiciatório, da mesa e do castiçal, das cortinas e do véu, e, por fim, do altar de cobre edopátioemque estava esse altar colocado. Lendo os versículos 15 do capítulo 35, 25 do capítulo 37 e 26 do capítulo 40, vemos que o altar do incenso está mencionado entre o castiçal e o altar de cobre. Ao passo que, quandoo Senhor dá instruções a Moisés, o altar de cobre é introduzido imediatamente depois do castiçal e das cortinas do tabernáculo. Ora, visto que deve haver uma razão divina para esta diferença, é privilégio de todo o estudioso inteligente e aplicado da Palavra de Deus indagar qual era essa razão.
Qual é a razão, portanto, por que o Senhor, quando dá instrução quanto aos adornos do "santuário", omite oaltarde incensoepassa ao altar de cobre que estava à porta do tabernáculo*?- A razão, presumo, é simplesmente esta: descreve primeiro a maneira em que há de manif estar-Se ao homem, e depois indica a forma de o homem se aproximar de Si. Tomou o Seu lugar no trono; como o "Senhor de toda a terra" (Js 3:11 e 13): os raios da Sua glória estavam ocultos atrás do véu—figura da carne de Cristo (Hb 10:20); porém, fora do véu, estava a manifestação de Si Mesmo, em ligação com o homem, na "mesa pura", e, pela luz e poder do Espírito Santo, representados no castiçal. Depois vem o caráter de Cristo como homem aqui na terra, representado nas cortinas e nas cobertas do tabernáculo. E finalmente temos o altar de cobre como a grande exibição do lugar de encontro entre o Deus santo e o pecador. Isto leva-nos, com efeito, à extremidade, de onde voltamos, na companhia de Arão e seus filhos, ao santuário, o lugar normal dos sacerdotes, onde estava o altar do incenso. Desta forma a ordem é notavelmente formosa. Do altar de ouro, não se faz menção antes que haja sacerdote para queimar incenso sobre ele, porque o Senhor mostrou a Moisés o modelo das coisas nos céus segundo a ordem em que estas coisas devem ser atendidas pela fé. Por outra parte, quando Moisés dá instruções às consagrações (capítulo 35), quando dá conta dos trabalhos de Bezaleel e Aoliabe (capítulos 37 e 38), e quando levanta o tabernáculo (capítulo 40), segue simplesmente a ordem em que os utensílios estavam colocados.


O Altar de Cobre

O prosseguimento deste estudo tão interessante, e o confronto das passagens acima mencionadas, recompensarão amplamente o leitor. Passemos agora ao altar de cobre.
Este altar era o lugar onde o pecador se aproximava de Deus, pelo poder e em virtude do sangue da expiação. Estava colocado à porta do tabernáculo da "tenda da congregação", e sobre ele era derramado todo o sangue dos sacrifícios. Era construído de "madeira de cetim e cobre". A madeira era a mesma do altar de ouro do incenso, mas o metal era diferente, e a razão desta diferença é obvia. O altar de bronze era o lugar onde o pecado era tratado segundo o juízo divino. O altar de ouro era o lugar onde o perfume precioso da aceitabilidade de Cristo subia para o trono de Deus. A "madeira de cetim", como figura da humanidade de Cristo, era a mesma num caso e no outro; porém no altar de cobre vemos Cristo sob o fogo da justiça divina; no altar de ouro vemos como Ele satisfaz os afetos divinos. No primeiro, o fogo da ira divina foi apagado, no último, o fogo do culto sacerdotal é aceso. A alma deleita-se de encontrar Cristo tanto num como no outro; porém o altar de cobre é o único que responde às necessidades de uma consciência culpada, como a primeira coisa para um pobre pecador desamparado, necessitado e convicto. Não é possível haver paz sólida, quanto à questão do pecado, enquanto o olhar da fé não descansar em Cristo como o antítipo do altar de cobre. É necessário que eu veja o meu pecado reduzido a cinzas na fornalha desse altar, antes de poder gozar de paz de consciência na presença de Deus. É quando sei, pela fé no testemunho de Deus, que Ele Próprio tratou do meu pecado na Pessoa de Cristo, no altar de cobre—que deu satisfação a todas as Suas justas exigências —, que tirou o meu pecado da Sua santa presença, de modo que nunca mais pode voltar, que posso gozar paz divina e eterna — e não antes.


O Ouro e o Cobre

Quero fazer aqui uma observação sobre o significado do "ouro" e do "cobre" nos utensílios do tabernáculo. O "ouro" é símbolo da justiça divina, ou da natureza divina no "Homem Jesus Cristo". "Cobre" é o símbolo da justiça, pedindo o julgamento do pecado, como no altar de cobre; ou o julgamento da impureza, como na pia de cobre. Isto explica a razão por que dentro da tenda do tabernáculo tudo era ouro — a arca, o propiciatório, a mesa, o castiçal e o altar do incenso. Todas estas coisas eram os símbolos da natureza divina e da excelência pessoal inerente do Senhor Jesus Cristo. Por outro lado, fora da tenda do tabernáculo tudo era cobre—o altar de cobre e os seus utensílios, a pia e a sua base.
É preciso que as exigências da justiça, quanto ao pecado e à impureza, sejam divinamente satisfeitas antes que possa haver alguma alegria pelos preciosos mistérios da Pessoa de Cristo, tais como nos são revelados no interior do santuário de Deus. É quando posso ver todo o pecado e impureza perfeitamente julgados e lavados que posso, como sacerdote, aproximar-me e adorar no santuário, e gozar a plena manifestação da formosura e perfeição do Deus Homem, Cristo Jesus.
O leitor poderá, com muito proveito, prosseguir com a aplicação deste pensamento em pormenor, não apenas no estudo do tabernáculo e o templo, mas também em várias passagens da Palavra de Deus; por exemplo, no capítulo 1 de Apocalipse Cristo aparece "cingido pelos peitos com um cinto de ouro" e tendo os Seus "pés semelhantes a latão reluzente, como se tivessem sido refinados numa fornalha". O "cinto de ouro" é o símbolo da Sua justiça intrínseca. Os pés semelhantes a latão reluzente" são a expressão do juízo inflexível sobre o mal- o Senhor não pode tolerar o mal, antes pelo contrário, tem de esmagá-lo debaixo dos Seus pés.
Tal é o Cristo com Quem temos de tratar. Julga o pecado, mas salva o pecador. A fé vê o pecado reduzido a cinzas no altar de cobre; vê toda a impureza lavada na pia de cobre; e, finalmente, goza de Cristo, tal como é revelado, no secreto da presença divina, pela luz e poder do Espírito Santo. A fé acha-O no altar de ouro, em todo o valor da Sua intercessão. Alimenta-se d'Ele à mesa pura. Reconhece-O na arca e no propiciatório como Aquele que responde a todas as exigên­cias da justiça divina, e, ao mesmo tempo, satisfaz todas as necessi­dades humanas. Contempla-O no véu, como todas as figuras místi­cas. Vê escrito o Seu nome precioso em todas as coisas. Oh, que os nossos corações estejam sempre prontos a apreciar e louvar este Cristo incomparável e glorioso!
Nada pode ser de tanta importância como o conhecimento claro da doutrina do altar de cobre; quero dizer, como é ensinada por meio dele. E devido à falta de clareza sobre este ponto que muitas almas se lamentam toda a vida. A questão da sua culpa nunca foi clara e completamente liquidada no altar de cobre. Nunca chegaram a realizar pela fé que o Próprio Deus liquidou para sempre, na cruz, a questão dos seus pecados. Buscam paz para as suas consciências atribuladas na regeneração e a sua evidência—os frutos do Espírito, a sua disposição, sentimentos e experiência —, coisas muito boas e valiosas em si, mas que não formam o fundamento da paz. E o conhecimento daquilo que Deus tem feito no altar de cobre que enche a alma de paz. As cinzas no altar contam-me a história que TUDO ESTÁ CUMPRIDO. Os pecados do crente foram todos tirados pela própria mão do amor redentor. "Aquele que não conhe­ceu pecado, o fez pecado por nós, para que, nele, fôssemos feitos justiça de Deus" (2 Co5:21).Todoopecadodeve ser julgado, porém os pecados do crente já foram julgados na cruz; por isso ele está perfeitamente justificado. Supor que pode existir qualquer coisa contra o crente, mesmo o mais fraco, é negar toda a obra da cruz. Os pecados e as iniquidades do crente foram todos tirados pelo Próprio Deus, e portanto foram perfeitamente quitados. Desapareceram com a vida que o Cordeiro de Deus derramou na morte.
Certifique-se o leitor de que o seu coração está inteiramente fundado na paz que Jesus fez pelo sangue da sua cruz.



— CAPÍTULO 28 —

AS VESTES
DOS SACERDOTES


Estes capítulos mostram-nos o Sacerdócio em todo o seu valor e eficácia, e estão cheios de interesse. A própria palavra "sacerdó­cio" desperta no coração um sentimento da mais profunda grati­dão pela graça que não só nos abriu um caminho para entrarmos na presença de Deus, como nos deu o necessário para ali nos mantermos, segundo o caráter e as exigências dessa posição eleva­da e santa.


O Sacerdócio de Arão

O sacerdócio de Arão era um dom de Deus por um povo que, por natureza própria, estava distante e necessitava de alguém que aparecesse em seu nome continuamente na Sua presença. O capítulo 7 da epístola aos Hebreus ensina-nos que a ordem do sacerdócio estava ligada com a lei, que fora estabelecida segundo "a lei do mandamento carnal" (versículo 16) e que fora impedida de permanecer pela morte (versículo 23) e que os sacerdotes dessa ordem estavam sujeitos às fraquezas humanas. Portanto, esta ordem não podia dar perfeição, e por isso devemos bendizer a Deus por não ter sido instituída com "juramento". O juramen­to de Deus só podia fazer-se em ligação com aquilo que devia durar eternamente, e isto era o sacerdócio perfeito, imortal, e intransmissível do nosso grande e glorioso Melquizedeque, que dá ao Seu sacrifício e ao Seu sacerdócio todo o valor, e a dignidade e glória da Sua incomparável Pessoa. O simples pensamento de que temos um tal sacrifício e um tal Sacerdote faz com que o coração palpite com as mais vivas emoções de gratidão.


O Éfode e as Pedras Preciosas

Mas devemos prosseguir com o exame dos capítulos que ainda temos à nossa frente. Em capítulo 28 temos as vestes sacerdotais, e em capítulo 29 trata-se dos sacrifícios. Aquelas estão mais em ligação com as necessidades do povo, enquanto que estes se relacionam com os direitos de Deus. As vestes representam as diversas funções e atributos do cargo sacerdotal. O "éfode" era o manto sacerdotal, e estando inseparavelmente ligado às umbreiras e ao peitoral, ensina-nos, clara­mente, que a força dos ombros do sacerdote e o afeto do seu coração estavam inteiramente consagrados aos interesses daqueles que repre­sentava, e a favor dos quais levava o éfode. Estas coisas, que eram simbolizadas em Arão, são realizadas em Cristo. O Seu poder onipo-tente e amor infinito pertencem-nos eternamente e incontestavel­mente. Os ombros que sustém o universo protegem até o mais fraco e obscuro membro da congregação redimida a preço de sangue. O coração de Jesus bate com afeto imorredouro até mesmo pelo membro menos considerado da assembleia redimida.
Os nomes das doze tribos, gravados sobre pedras preciosas, eram levados tanto sobre os ombros como sobre o peito do sumo sacerdote (vide versículos 9al2,15a29).A excelência peculiar de uma pedra preciosa consiste no fato que quanto mais intensa é a luz que sobre ela incide, tanto maior é o seu brilho esplendente. A luz nunca pode obscurecer uma pedra preciosa; apenas aumenta e desenvolve o seu brilho. As doze tribos, tanto uma como outra, a maior como a menor, eram levadas continuamente à presença do Senhor sobre o peito e os ombros de Arão. Eram todas, e cada uma em particular, mantidas na presença divina em todo este resplendor perfeito da formosura inalterável que era próprio da posição em que a graça perfeita do Deus de Israel as havia colocado. O povo era represen­tado diante de Deus pelo sumo sacerdote. Quaisquer que fossem as suas fraquezas, os seus erros, ou faltas, os seus nomes resplandeciam sobre o "peitoral" com imarcescível esplendor. O Senhor havia-lhes dado esse lugar, e quem poderia arrancá-los dali1?- Jeová tinha-os posto assim, e quem podia pô-los de outra formai Quem teria podido penetrar no santuário para arrebatar de sobre o coração de Arão o nome de uma das tribos de Israel? Quem teria podido manchar o brilho que rodeava esses nomes no lugar onde Deus os havia colocado? Ninguém. Estavam fora do alcance de todo o inimigo — longe da influência de todo o mal.
Quão animador é para os filhos deDeus,quesão provados, tentados, zurzidos e humilhados, pensar que Deus os vê sobre o coração de Jesus! Perante os Seus olhos, eles brilham sempre em todo o fulgor de Cristo, revestidos de toda agraça divina. O mundo não pode vê-los assim; mas Deus vê-os desta maneira, enistoestátodaa diferença. Os homens, ao considerarem os filhos de Deus, vêem apenas as suas imperfeições e defeitos, porque são incapazes de ver qualquer coisa mais; de sorte que o seu juízo é sempre falso e parcial. Não podem ver as jóias brilhantes com os nomes dos remidos gravados pela mão do amor imutável de Deus. É certo que os cristãos deveriam ser cuidadosos em não dar ocasião a que os homens do mundo falem injuriosamente; deviam procurar, fazendo bem, tapar a boca à ignorância dos homens maus (lPe2:15). Seao menos compreendessem, pelo poder do Espírito Santo, a graça em que brilham sem cessar, aos olhos de Deus, realizariam certamente as características de uma vida de santidade prática, pureza moral e engrandecimento perante os olhos dos homens. Quanto mais compreendermos, pela fé, a verdade objetiva, ou tudo o que somos em Cristo, tanto mais profunda, prática e real será a obra subjetiva em nós, e maior será a manifestação do efeito moral na nossa vida e caráter.
Mas, graças aDeus, não temos que ser julgados pelos homens, mas por Ele Próprio: e misericordiosamente mostra-nos o nosso sumo sacerdote levando o nosso juízo sobre o seu coração diante do Senhor continuamente (versículo 30). Esta segurança dá paz profunda e sólida ao coração—uma pazque nada pode abalar. Podemos ter de confessar elamentar as nossas faltasedefeitosconstantes;anossa vista pode estar, por vezes, obscurecida de tal maneira por lágrimas de um verdadeiro arrependimento que não possa ver o brilho das pedras preciosas com os nossos nomes gravados, e todavia eles estãonelas. Deus os vê, e isto é suficiente. É glorificado pelo seu brilho; brilho que não é conseguido por nós, mas com que Ele nos dotou. Nada tínhamos senão trevas, tristeza, e deformidades; mas Deus deu-nos brilho, pureza e beleza. A Ele seja dado o louvor pelos séculos dos séculos!


O Cinto

O "cinto" é o símbolo bem conhecido do serviço; e Cristo é o Servo perfeito—o Servo dos desígnios divinos e das necessidades profundas e variadas do Seu povo. Com espírito de sincera dedicação, que nada podia impedir, Ele cingiu-se para a Sua obra; e quando a fé vê assim o Filho de Deus cingido julga, certamente, que nenhuma dificuldade é grande demais para Si. No símbolo que temos perante nós vemos que todas as virtudes, méritos, e glórias de Cristo, na Sua natureza divina e humana, entram plenamente no Seu caráter de servo. "E o cinto de obra esmerada, do seu éfode, que estará sobre ele, será da mesma obra, da mesma obra de ouro, e de pano azul e de púrpura, e de camesim e de linho fino torcido" (versículo 8). A fé disto deve satisfazer todas as necessidades da alma e os mais ardentes desejos do coração. Não vemos Cristo apenas como a vítima imolada no altar, mas também como o cingido Sumo Sacerdote sobre a casa de Deus. Bem pode, pois, o apóstolo inspirado dizer, "cheguemo-nos,... retenha­mos... consideremo-nos uns aos outros" (Hb 10:19-24).





O Peitoral de Juízo. O Urim e o Tumim


"Também porás no peitoral do juízo Urim e Tumim", (luzes e perfeições) "para que estejam sobreocoraçãodeArão,quandoentrar diante do Senhor; assim, Arão levará o juízo dos filhos de Israel sobre o seu coração, diante do Senhor, continuamente" (versículo 30). Aprendemos em várias passagens da Escritura que o Urim estava relacionado com a comunicação da mente de Deus, quanto às diferen­tes questões que se levantavam nos pormenores da história de Israel. Assim, por exemplo, na nomeação de Josué, lemos; "E se porá perante Eleazar, o sacerdote, o qual por ele consultará, segundo o juízo de Urim, perante o Senhor" (Num. 27:21). "E de Levi disse: Teu Tumim e teu Urim (as tuas perfeições e luzes) são para o teu amado... ensinaram os teus juízos a Jacó e a tua lei a Israel" (Dt 33:8 -10). "E perguntou Saul ao Senhor, porém o Senhor lhe não respondeu, nem por sonhos, nem porUrim, nem por profetas" (1 Sm 28:6). "E otirsata lhes disse que não comessem das coisas sagradas, até que houvesse sacerdote com
Urim e com Tumim"(Ed 2:63). Vemos assim que o sumo sacerdote não só levava o juízo da congregação perante o Senhor, como comu­nicava tambémo juízo do Senhor àcongregação—solenes, importan­tes, e preciosas funções! É o que temos, com perfeição divina, no nosso "grande sumo sacerdote, ...que penetrou nos céus" (Hb 4:14). Leva continuamente o j uízo do Seu povo sobre o coração, e, por intermédio do Espírito Santo, comunica-nos o conselho de Deus a respeito dos pormenores mais insignificantes da nossa vida diária. Não temos necessidade de sonhos ou visões: se andarmos em Espírito, desfrutare­mos toda a certeza que pode conceder o perfeito "Urim" sobre o coração do nosso Sumo Sacerdote.


O Manto do Éfode

"Também farás o manto do éfode todo de pano azul... e nas suas bordas farás romãs de pano azul, de púrpura e de carmesim, ao redor das suas bordas; e campainhas de ouro no meio delas, ao redor. Uma campainha de ouro e uma romã, outra campainha de ouro e outra romã haverá nas bordas do manto ao redor, e estará sobre Arão, quando ministrar, para que se ouça o seu sonido, quando entrar no satuário diante do Senhora quando sair, para que não morra" (versículos 31 a35).
O manto azul do "éfode" exprime o caráter celestial do nosso Sumo Sacerdote, que penetrou nos céus, para além do alcance da visão humana; porém, pelo poder do Espírito Santo, há um testemunho da verdade de estar vivo na presença de Deus; e não apenas um testemu­nho, mas fruto também. "Uma compainha de ouro e uma romã, outra campainha de ouroe outra romã". Tal é a ordem cheia de beleza. O verdadeiro testemunho da grande verdade que Jesus vive sempre para interceder por nós estará sempre ligado com fertilidade no Seu serviço. Oh, se ao menos pudéssemos compreender mais profunda­mente estes mistérios preciosos e santos! (¹).
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(¹) É desnecessário advertir que existe uma propriedade divina e significativa em todas as figuras que nos são apresentadas na Palavra de Deus. Assim, por exemplo, a "romã", quando aberta verifica-se que consiste de um número de sementes contidas num líquido vermelho. Certamente, isto fala por si. Que a espiritualidade, e não a imaginação, faça o seu juízo.


A Lâmina de Ouro

"Também farás uma lâmina de ouro puro e nela gravarás, à maneira degravuras de selos.- SANTIDADEAO SENHOR. E atá-la-ás comum cordão de fio azul, de maneira que esteja na mitra; sobre a frente da mitra estará. E estará sobre a testa de Arão, para que Arão leve a iniquidade das coisas santas, que os filhos de Israel santificarem em todas as ofertas de suas coisas santas; e estará continuamente na sua testa, para que tenham aceitação perante o Senhor" (versículos 36 a 38). Eis aqui uma verdade importante para a alma. A lâmina de ouro sobre a testa de Arão era figura da santidade do Senhor Jesus Cristo: "e estará CONTINUAMENTE NA SUA testa, para que TENHAM aceitação perante o Senhor". Que descanso para o cora­ção por entre as flutuações da nossa experiência! O nosso Sumo Sacerdote está sempre na presença de Deus por nós. Somos represen­tados pore aceites n'Ele. A Sua santidade pertence-nos. Quanto mais profundamente conhecermos a nossa própria vileza e fraquezas, tanto mais experimentaremos a verdade humilhante que em nós não habita bem algum, e mais fervorosamente bendiremos o Deus de toda a graça por esta verdade consoladora: "estará continuamen­te na sua testa, para que tenham aceitação perante o Senhor".
Se o leitor for um daqueles que são frequentemente tentados e sobrecarregados com dúvidas e temores, com altos e baixos no seu estado espiritual, com tendências a contemplar o seu pobre coração, frio, inconstante e rebelde—se for tentado com incerteza excessiva e falta de santidade —, deve apoiar-se de todo o coração sobre esta verdade preciosa: que o seu Sumo Sacerdote representa-o diante do trono de Deus. Deve fixar os seus olhos na lâmina de ouro e ler, na inscrição gravada nela, a medida da sua aceitação eterna perante Deus. Que o Espírito Santo o ajude a provar a doçura peculiar e o poder mantenedor desta doutrina divina e celestial!


As Vestes dos Filhos de Arão

"Também farás túnicas aos filhos de Arão, e f ar-Ihes-ás cintos; também lhes farás tiaras, para glória e ornamento... faze-lhes também calções de linho, para cobrirem a carne nua... e estarão sobre Arão e sobre seus filhos, quando entrarem na tenda da congregação ou quando chegarem ao altar para ministrar no san­tuário, para que não levem iniquidade e morram." Aqui, Arão e seus filhos representam em figura Cristo e a Igreja—são a expressão das qualidades intrínsecas, essenciais, pessoais e ternas de Cristo; en­quanto que as "túnicas" e "tiaras" dos filhos de Arão representam aquelas graças de que está revestida a Igreja, em virtude da sua ligação com a Cabeça da família sacerdotal.
Podemos ver assim em tudo que acaba de passar perante os nossos olhos, neste capítulo, o cuidado misericordioso com que Jeová fez provisão para as necessidades do Seu povo, permitindo que eles vissem aquele que estava prestes a atuar a seu favor e a representá-nos na Sua presença vestido como os vestidos que correspondiam diretamente à condição do povo, tal qual Ele os conhecia. Nada que o coração pudesse desejar ou de pudesse ter necessidade foiesquecido. Podiam contemplar Arão dos pés à cabeça e ver que tudo estava completo. Desde a mitra santa na cabeça de Arão às companhias de ouro e romãs que bordavam o seu manto, tudo era como devia estar, porque tudo estava conforme o modelo que fora mostrado no monte —tudo era segundo o cálculo que o Senhor fazia das necessidades do Seu povo e das Suas próprias exigências.


Fios de Ouro Entretecidos

Mas existe ainda um ponto relacionado com as vestes de Arão que requer a atenção do leitor: e este é a forma como o ouro é introduzido na sua confecção. Este assunto acha-se no capítulo 39; contudo a sua interpretação cabe muito bem aqui. "E estenderam as lâminas de ouro, e as cortaram em fios, para entretecer entre o pano azul, e entre a púrpura, e entre o carmesim, e entre o linho fino da obra mais esmerada" (capítulo 39:3). Já fizemos notar que o "azul, a púrpura, o carmesim e o linho fino torcido" apresentam as várias fazes da humanidade de Cristo, e que o ouro representa a Sua natureza divina. Os fios de ouro estavam curiosamente introduzi­dos nos demais materiais, de modo a estarem inseparavelmente unidos, e todavia perfeitamente distintas deles. A aplicação desta admirável imagem ao caráter do Senhor Jesus é cheia de interesse. Em diferentes cenas apresentadas nos relatos dos evangelhos, pode­mos discernir facilmente esta rara e formosa união da humanidade e divindade, e, ao mesmo tempo, a distinção misteriosa.
Por exemplo, considerai Cristo no mar da Galiléia, no meio da tempestade. Ele "estava dormindo sobre uma almofada" (Mc 4:38). Que preciosa demonstração da sua humanidade! Porém, num mo­mento eleva-Se da atitude de verdadeira humanidade à dignidade completa e majestade da divindade, e, como supremo Governador do universo, acalma a tempestade e impõe silêncio ao mar. Não se nota aqui nenhum esforço, nenhuma precipitação, nem preparação pré­via para este momento. Com perfeita naturalidade, Ele passa da condição de humanidade positiva à esfera essencial da divindade. O repouso daquela não é mais natural que a atividade desta. Ele está perfeitamente no Seu elemento tanto numa como na outra.
Vede-O ainda no caso dos cobradores do tributo, segundo Mateus, 17. Como "Deus Altíssimo, possuidor dos céus e da terra", estende a Sua mão sobre os tesouros do oceano, e diz, "são meus"; e, havendo declarado que o oceano é Seu, "pois Ele o fez" (SI 95:5), volta-Se e, numa demonstração de perfeita humanidade, associa-Se ao seu pobre servo, por meio dessas palavras tocantes, "toma-o e dá-o por mim e por ti". Palavras cheias de graça! Sobretudo quando as consideramos em ligação com o milagre tão expressivo da divindade d'Aquele que assim se ligava, em infinita condescendência, com um pobre verme.
Mas vede-O, mais uma vez, junto da sepultura de Lázaro 0o 11). Comove-Se e chora, e essa emoção e essas lágrimas provêm das profundidades de uma humanidade perfeita—desse coração perfei­tamente humano, que sentia, como nenhum outro coração podia sentir, o que era achar-se no meio da cena em que o pecado havia produzido tão terríveis frutos. Mas logo, como a Ressurreição e a Vida, como Aquele que segura em Suas mãos as chaves do inferno e da morte (Ap 1:18) clama: "Lázaro, sai para fora"; e à voz de poder de Jesus a morte e a sepultura abrem as suas portas e deixam sair o seu cativo.
O espírito do leitor poderá facilmente recordar outras cenas dos evangelhos que ilustram esta união dos fios de ouro com o "azul, a púrpura, o carmesim e o linho fino torcido"; quer dizer, da união da deidade com a humanidade, na Pessoa misteriosa do Filho de Deus. Não há nada de novo neste pensamento, frequentemente assinalado por aqueles que têm estudado com algum cuidado as Escrituras do Velho Testamento.
Porém, é sempre proveitoso pensar no bendito Senhor Jesus como Aquele que é verdadeiramente Deus e verdadeiramente homem. O Espírito Santo uniu estas duas naturezas por meio de uma obra delicada e apresenta-as ao espírito regenerado do crente para serem admiradas e desfrutadas por ele.
Consideremos, agora, antes de terminarmos esta parte do Livro do Êxodo, o capítulo 29.


— CAPÍTULO 29 —

A CONSAGRAÇÃO
DO SARCEDOTE


A Lavagem com Água

Já frisámos que Arão e seus filhos representam Cristo e a Igrej a, porém nos primeiros versículos deste capítulo é dado o primeiro lugar a Arão. "Então, farás chegar Arão e seus filhos à porta da tenda da congregação e os lavarás com água" (versículo 4). A lavagem da água tornava Arão simbolicamente aquilo que Cristo é intrinseca­mente, isto é: santo. A Igreja é santa em virtude de estar ligada a Cristo na vida de ressurreição. Ele é a definição perfeita daquilo que ela é perante Deus. O ato cerimonial da lavagem da água representa a ação da palavra de Deus (veja-se Ef 5:26).
"E por eles me santifico a mim mesmo, para que também eles sejam santificados na verdade" (Jo 17:19), disse o Senhor Jesus. Separou-Se para Deus no poder de uma perfeita obediência, orien-tando-Se em todas as coisas, como homem, pela Palavra, mediante o Espírito eterno, a fim de que todos aqueles que são d'Ele pudessem ser inteiramente separados pelo poder moral da verdade.


A Unção

"E tomarás o azeite da unção e o derramarás sobre a sua cabeça " (versículo 7). Nestas palavras temos o Espírito, mas é preciso notar que Arão foi ungido antes de o sangue ser derramado, porque nos é apresentado como figura de Cristo, que, em virtude daquilo que era em Sua Própria Pessoa, foi ungido com o Espírito Santo muito antes que fosse cumprida a obra da cruz. Em contrapartida, os filhos de Arão não foram ungidos senão depois de ser espargido o sangue, "degolarás o carneiro, e tomarás do seu sangue, e o porás sobre a ponta da orelha direita deArão,e sobre a ponta da orelha direita de seus filhos, como também sobre o dedo polegar da sua mão direita, e sobre o dedo polegar do seu pé direito: e o resto do sangue espalharás sobre o altar ao redor" (¹). "Então, tomarás do sangue que estará sobre os altar e do azeite da unção e o espargirás sobre Arão e sobre as suas vestes e sobre seus filhos, e sobre os as vestes de seus filhos com ele" (versículos 20 e 21). No que diz respeito à Igreja, o sangue da cruz é o fundamento de tudo. Ela não podia ser ungida com o Espírito Santo até que a sua Cabeça ressuscitada tivesse subido ao céu e depositado sobre o trono da Maj estade divina o relato do sacrifício que havia oferecido. "Deus ressuscitou a este Jesus, do que todos nós somos testemunhas. De sorte que, exaltado pela destra de Deus, e tendo recebido do Pai e promessa do Espírito Santo, derramou isto que vós agora vedes e ouvis" (At 2:32-33); compa-rem-se também Jo 7:39; At 19:1 - 6). Desde os dias de Abel que haviam sido regeneradas almas pelo Espírito Santo e experimenta­do a Sua influência, sobre as quais operou e a quem qualificou para o serviço; porém a Igreja não podia ser ungida com o Espírito Santo até que o Seu Senhor tivesse entrado vitorioso no céu e recebesse para ela a promessa do Pai. A verdade desta doutrina é ensinada, da forma mais direta e completa, em todo o Novo Testamento; e a sua integridade estreita é mantida, em figura, no símbolo que temos perante nós, pelo fato claro que, embora Arão fosse ungido antes de o sangue haver sido derramado (versículo 7), contudo os seus filhos não o foram, e não podiam ser ungidos senão depois (versículo 21).
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(¹) O ouvido, as mãos e os pés são consagrados a Deus no poder da expiação efetuada e mediante a energia do Espírito Santo.


A Preeminência de Cristo

Porém, aprendemos alguma coisa mais com a ordem da unção neste capítulo, além da verdade importante acerca da obra do Espírito, e a posição que a Igreja ocupa. A preeminência do Filho é-nos também apresentada. "Amaste a justiça e aborreceste a inquidade; por isso Deus, o teu Deus, te ungiu com óleo de alegria, mais do que a teus companheiros" (SI 45:7; Hb 1:9). É preciso que o povo de Deus mantenha sempre esta verdade nas suas convicções e experiências. Por certo, a graça infinita de Deus é manifestada no fato maravilhoso que pecadores culpados e dignos do inferno sejam chamados companheiros do Filho de Deus; mas nunca devemos esquecer, nem por um momento, o vocábulo "mais". Por mais íntima que seja a união—e é tão íntima quanto os desígnios eternos do amor divino a podiam fazer—, é, contudo, necessário que Cristo tenha em tudo a preeminência" (Cl 1:18). Não podia ser de outra maneira. Ele é Cabeça sobre todas as coisas — Cabeça da Igreja, Cabeça sobre a criação, Cabeça sobre os anjos, o Senhor do universo. Não existe um só astro de todos os que se movem no espaço que não Lhe pertença e não se mova sob a Sua orientação. Não existe um verme sequer que se arrasta sobre a terra, que não esteja sob os Seus olhos incansáveis. Ele está acima de todas as coisas; é toda a criatura "o primogénito de entre os mortos" "o princípio da criação de Deus" (Cl l:15-18;Ap 1:5). "Toda a família nos céus ena terra" (Ef 3:15) deve alinhar, na classe divina, sob Cristo. Tudo isto será reconhe­cido com gratidão por todo o crente espiritual; sim, a sua própria articulação produz um estremecimento no coração do crente. Todos os que são guiados pelo Espírito regozijar-se-ão com cada nova manifestação das glórias pessoais do Filho; da mesma maneira que não poderão tolerar qualquer coisa que se levante contra elas. Que a Igreja se eleve às mais altas regiões e glória, será seu gozo ajoelhar aos pés d'Aquele que se baixou para a elevar, em virtude do Seu sacrifício, à união Consigo; o qual havendo plenamente correspondido a todas as exigências da justiça divina, pode satisfa­zer todos os afetos divinos, unindo-a em um Consigo Mesmo, em toda a aceitação infinita com o Pai, na Sua glória eterna: "Não se envergonha de lhes chamar irmãos" (Hb 2:11).
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Nota: Evitei propositadamente tocar no assunto das ofertas em capítulo 29 visto que teremos ocasião de considerar as diferentes classes de sacrifícios, por sua ordem, nos nossos estudos sobre o Livro de Levítico, se o Senhor permitir.


— CAPÍTULO 30 —

O CULTO, A COMUNHÃO
E A ADORAÇÃO


O Altar de Cobre e o Altar de Ouro

Instituído o sacerdócio, como vimos nos dois capítulos prece­dentes, somos introduzidos aqui na posição do verdadeiro culto e comunhão sacerdotal. A ordem é notável e instrutiva; e, além disso, corresponde exatamente com a ordem da experiência do crente. No altar de bronze, o crente vê as cinzas dos seus pecados; e vê-se imediatamente unido com Aquele que, embora pessoalmente puro e incontaminado, de forma que podia ser ungido sem sangue, tem-nos, contudo, associado Consigo na vida, em justiça e favor; e, por fim, o crente vê no altar de ouro a preciosidade de Cristo, como sendo a substância com a qual é alimentado o amor divino.
É sempre assim: é necessário que haja um altar de cobre e um sacerdote antes que possa haver um altar de ouro e incenso. Mui­tíssimos filhos de Deus nunca passaram do altar de cobre; nunca entraram, em espírito, no poder e realidade do verdadeiro culto sacerdotal. Não se regozijam no pleno e perfeito sentimento divino de perdão e justiça; nunca conseguiram chegar ao altar de ouro. Esperam alcançá-lo quando morrerem; ao passo que já têm o privilégio de estar ali agora. A obra da cruz tirou do caminho tudo que podia representar um obstáculo a um culto livre e inteligente. A posição atual de todos os crentes verdadeiros é junto do altar de ouro do incenso.
Este altar é figura de uma posição de maravilhosa bem-aventurança. Ê ali que desfrutamos a realidade e eficácia da intercessão de Cristo. Havendo acabado com o ego e tudo quanto lhe diz respeito, ainda que esperássemos algumbem dele, temos de estar ocupados com aquilo que Cristo é perante Deus. Nada encontraremos no ego senão corrupção; todas as suas manifestações são corrompidas; já foi condenado e posto de parte pelo juízo de Deus, e nem só um fio ou partícula dele se pode encontrar no incenso ou no fogo do altar de ouro puro. Isso seria impossível. Fomos introduzidos no santuário "pelo sangue de Jesus", santuário de serviço e culto sacerdotal, no qual não existe nem sequer um vestígio de pecado. Vemos a mesa pura, o castiçal puro e o altar puro; mas não existe nada que nos recorde o ego e a sua miséria. Se fosse possível que alguma coisa do ego se apresentasse à nossa vista, isso só serviria para destruir o nos so culto, contaminar o nosso alimento sacerdotal e ofuscara nossa luz. A natureza não pode ter lugar no santuário de Deus: foi consumida e reduzida a cinzas com tudo quanto lhe pertence; e agora as nossas almas são chamadas para gozar o bom cheiro de Cristo, subindo como perfume agradável a Deus: é nisto que Deus Se deleita. Tudo o que apresenta Cristo na Sua própria excelência é agradável a Deus. Até a mais débil expressão ou manifestação de Cristo, na vida ou adoração de um dos Seus santos, é cheiro agradável, no qual Deus acha o Seu prazer.
Enfim, temos muitíssimas vezes de estar ocupados com as nossas faltas e fraquezas. Se os efeitos do pecado, que habita em nós, se manifestam, temos de tratar com Deus acerca deles, pois o Senhor não pode concordar com o pecado. Pode perdoar o pecado e purif icar-nos; pode restaurar as nossas almas pelo ministério precioso do nosso grande Sumo Sacerdote; porém não pode associar-se a um simples pensa­mento pecaminoso. Um pensamento ligeiro ou louco bem como uma ideia impura ou cobiçosa, são o bastante para perturbar a comunhão do crente e interromper o seu culto. Se um tal pensa­mento se levanta, deve ser confessado e julgado antes de podermos desfrutar outra vez os gozos sublimes do santuário. Um coração em que opera a concupiscência não tem parte nas ocupações do santuário. Quando nos encontramos na nossa própria condição sacerdotal, a natureza é como se não tivesse existência; é então que nos podemos alimentar de Cristo. Podemos provar o prazer divino de estarmos inteiramente livres de nós próprios e completamente absorvidos por Cristo.
Mas tudo isto só pode ser produzido pelo poder do Espírito. É inútil procurar excitar os sentimentos naturais de devoção pelos diferentes instrumentos da religião sistemática. É necessário que haja fogo puro e incenso puro (comparem-se Lv 10:1 com 16:12). Todos os esforços para adorar a Deus por meio das faculdades profanas da natureza estão incluídos na caregoria de "fogo estra­nho". Deus é o verdadeiro objeto de adoração; Cristo é o f undamen-to e a substância de adoração; e o Espírito Santo é o seu poder.
Propriamente falando, portanto, assim o altar de cobre nos apre­senta Cristo no valor do Seu sacrifício, o altar de ouro mostra-nos Cristo no valor da Sua intercessão. Este fato dará ao leitor uma melhor compreensão do motivo por que a ocuapação sacerdotal é introduzida entre os dois altares. Existe, como podia esperar-se, uma relação íntima entre os dois altares, pois que a intercessão de Cristo está fundada sobre o Seu sacrifício.
"E uma vez no ano Arão fará expiação sobre as pontas do altar, com o sangue do sacrifício das expiações; uma vez no ano fará expiação sobre ele, pelas vossas gerações; santíssimo é ao Senhor" (versículo 10). Tudo repousa sobre o fundamento inabalável do SANGUE ESPARGIDO. "Quase todas as coisas, segundo a lei, se purificam com sangue; e sem derramamento de sangue não há remissão. De sorte que era bem necessário que as figuras das coisas que estão no céu assim se purificassem; mas, as próprias coisas celestiais, com sacrifícios melhores do que estes. Porque Cristo não entrou num santuário feito por mãos, figura do verdadeiro, porém, no mesmo céu, para agora comparecer, por nós, perante a face de Deus" (Hb 9:22-24).


O Meio Siclo de Resgate

Os versículos 11 a 16, inclusive, tratam do dinheiro das expiações para a congregação. Todos tinham de pagar da mesma maneira. "O rico não aumentará, e o pobre não diminuirá da metade do siclo, quando derem a oferta ao Senhor, para fazer expiação por vossas almas". Na questão doresgate todos são postos ao mesmo nível. Pode haver uma grande diferença em conhecimento, de experiência, de aptidão, de progresso, de zelo e de dedicação, porém o fundamento de expiação é igual para todos. O grande apóstolo dos gentios e o mais débil cordeiro do rebanho de Cristo estão no mesmo nível no que se refere à expiação. É uma verdade muito simples e feliz ao mesmo tempo. Nem todos podem ser igualmente fervorosos e abundar em frutos; porém o fundamento sólido e eterno do repouso do crente é "o precioso sangue de Cristo" (1 Pe 1:19), e não a dedicação ou abundância de frutos. Quanto mais compenetrados estivermos da verdade e poder destas coisas tanto mais frutos daremos.
Bendito seja Deus, sabemos que todos os Seus direitos foram cumpridos e os nossos votos satisfeitos por Aquele que era ao mesmo tempo o representante dos Seus direitos e o Expoente da Sua graça, o mesmo que consumou a obra de expiação sobre a cruz e está agora à destra de Deus. Nisto existe doce descanso para o coração e a consciência. Aexpiação é a primeira coisa que alcançamos, e nunca mais a perdemos de vista. Por muito extenso que se j a o curso da nossa inteligência, por muito rica que seja a nossa experiência, por muito elevado que seja o dom da nossa piedade, teremos sempre de nos retirar para a doutrina simples, divina, inalterável e fortalecedora doutrina do O SANGUE. Assim tem sido sempre na história do povo de Deus o assim é e assim será em todos os tempos. Os mais dotados e instruídos servos de Cristo têm regressado sempre com regozijo a "esta única fonte de delícias", na qual os seus espíritos sequiosos beberam quando conheceram o Senhor; e o cântico eterno da Igreja, na glória, será: "Aquele que nos ama e em seu sangue nos lavou dos nossos pecados" (Apl:5). As cortes do céu ressoarão para sempre com a doutrina gloriosa do sangue.


A Pia de Cobre

Nos versículos 17 a 21 temos a "pia de cobre com a sua base" — o vaso da purificação e a sua base. Estas duas coisas são sempre mencionadas conjuntamente (veja-se capítulos 30:28; 38:8; 40:11). Era nesta pia que os sacerdotes lavavam as mãos e os pés, e desta forma mantinham aquela pureza que era essencial ao cumprimen­to das suas funções sacerdotais. Não significava, de modo nenhum, uma nova questão do sangue; mas simplesmente um ato mediante o qual se mantinham em aptidão para o serviço sacerdotal e o culto.
"E Arão e seus filhos nela lavarão as suas mãos e os seus pés. Quando entrarem na tenda da congregação, lavar-se-ão com água, para que não morram, ou quando se chegarem ao altar para minis­trar, para acender a oferta queimada ao Senhor" (versículo 20). Não pode haver verdadeira comunhão com Deus se a santidade pessoal não for diligentemente mantida. "Se dissermos que temos comu­nhão com ele e andarmos em trevas, mentimos e não praticamos a verdade" (1 Jo 1:6). Esta santidade pessoal só pode proceder da ação da Palavra de Deus nas nossas obras e nos nossos caminhos:"... pela palavra dos teus lábios me guardei das veredas do destruidor" (Sl 17:4). O nosso enfraquecimento constante no ministério sacerdo­tal pode ser causa de negligenciarmos o uso conveniente da pia de cobre. Se os nossos caminhos não são submetidos à noção purifica­dora da Palavra de Deus — se continuarmos em busca ou na prática de alguma coisa que, segundo o testemunho da nossa própria consciência, é claramente condenada pela Palavra de Deus, o nosso caráter sacerdotal carecerá certamente de poder. A perseverança deliberada no mal e o verdadeiro culto sacerdotal são de todo incompatíveis. "Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade" (Jo 17:17). Se houver em nós impureza, não podemos gozar a presença de Deus. O efeito da Sua presença será então convencer-nos do mal pela luz santa da Sua Palavra. Porém, quando, mediante a graça, sabemos purificar os nossos caminhos, acautelando-nos segundo a Palavra de Deus, então estamos moralmente em estado de gozar a Sua presença.
O leitor perceberá imediatamente que se abre aqui um vasto campo de verdade prática e como a doutrina da pia de cobre é largamente apresentada no Novo Testamento. Oh! que todos aqueles que têm o privilégio de pôr os pés nos átrios do santuário com vestidos sacerdotais e de se aproximarem do altar de Deus, par exercer o sacerdócio, mantenham as mãos e os pés limpos pelo uso da verdadeira pia de cobre!
Talvez seja interessante notar que a pia de cobre com a Sua base era feita "dos espelhos das mulheres que se ajuntaram, ajuntando-se à porta da tenda da congregação" (capítulo 38:8). Este fato é cheio de significado. Estamos sempre prontos a ser como o homem que "contempla ao espelho o seu rosto natural; porque se contempla a si mesmo, e foi-se, e logo se esqueceu de como era" (Tg 1:28). O espelho da natureza nunca poderá dar-nos uma vista clara e perma­nente da nossa verdadeira condição. "Aquele, porém, que atenta bem para a lei perfeita da liberdade e nisso persevera, não sendo ouvinte esquecido, mas fazedor da obra, este tal será bem-aventurado no seu feito" (Tg 1:25). Aquele que recorre continuamente à Palavra de Deus e a deixa falar ao seu coração e à sua consciência será mantido na atividade santa da vida divina.


Um Grande Sumo Sacerdote

A eficácia do ministério sacerdotal de Cristo está intimamente ligada com a ação penetrante e purificadora da Palavra de Deus. "Porque a palavra de Deus é viva, e eficaz, e mais penetrante do que qualquer espada de dois gumes, e penetra até a divisão da alma, e do espírito, e das juntas e medulas, e é apta para discernir os pensamen­tos e intenções do coração. E não há criatura alguma encoberta diante dele; antes, todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daquele com quem temos de tratar." E o apóstolo inspirado acres­centa imediatamente; "Visto que temos um grande sumo sacerdo­te, Jesus, Filho de Deus, que penetrou nos céus, retenhamos firme­mente a nossa confissão. Porque não temos um sumo sacerdote que não possa compadecer-se das nossas fraquezas; porém um que, como nós, em tudo foi tentado, mas sem pecado. Cheguemos, pois, com confiança, ao trono da graça, para que possamos alcançar misericórdia e achar graça, a fim de sermos ajudados em tempo oportuno" (Hb 4:12-16).
Quanto mais vivamente sentirmos o fio da palavra de Deus, tanto mais apreciaremos o ministério misericordioso e gracioso do nosso Sumo Sacerdote. Estasduas coisas andam juntas. São os companheiros inseparáveis da senda do cristão. O Sumo Sacerdote simpatiza com as fraquezas que a Palavra de Deus descobre e expõe: Ele é um Sumo
Sacerdote "fiel" e "misericordioso". Por isso, só nos podemos aproxi­mar do altar na medida em que fazemos uso da pia de cobre. O culto deve ser sempre oferecido no poder da santidade. E necessário perder­mos de vista a natureza, tal qual é refletida num espelho, e estarmos ocupados inteiramente com Cristo, conforme no-Lo apresenta a Palavra de Deus. É só desta forma que "as mãos e os pés", as obras e os nossos caminhos são purificados, segundo a purificação do santuário.


A Santa Unção

Os versículos 22 e 23 tratam "do azeite da santa unção", com a qual eram ungidos os sacerdotes com todos os utensílios do santuário.
Nesta unção discernimos uma figura das várias graças do Espírito Santo, as quais se acharam em Cristo em toda a sua plenitude divina. "Todos os teus vestidos cheiram a mira, a aloés e a cássia, desde os palácios de marfim de onde te alegram" (SI 45:8). "Como Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com virtude" (At 10:38). Todas as graças do Espírito Santo, em sua perfeita fragrância, se concentraram em Cristo; e é somente d'Ele que podem emanar. Quanto à Sua humanidade, foi concebido do Espírito Santo; e, antes de entrar no Seu ministério público, foi ungido com o Espírito Santo; e, finalmente, havendo tomado o Seu lugar nas alturas, derramou sobre o Seu corpo, a Igreja, os dons preciosos do Espírito, em testemu­nho da redenção efetuada (veja-se Mt 1.20; 3:16-17; Lc 4:18-19; At 2:33; 10:45-46; Ef 4:8-13).
É como aqueles que estão associados com este bendito e eterna­mente glorificado Senhor que os crentes são feitos participantes dos dons e graças do Espírito Santo; e, além disso, é na medida em que andam em intimidade com Ele que gozam ou emitem a Sua fragrância.
O homem não regenerado não conhece estas coisas. "Não se ungirá com ele a carne do homem" (versículo 32). As graças do Espírito nunca poderão ser ligadas com a carne, porque o Espírito Santo não pode reconhecer a natureza. Nem um só dos frutos do Espírito foi jamais produzido no solo estéril da natureza. E neces­sário nascer de novo (Jo 3:7). E só como unidos com o novo homem, como sendo parte da nova criação, que podemos conhecer alguma coisa dos frutos do Espírito Santo.
É inútil procurar imitar esses frutos e virtudes. Os mais belos frutos que jamais cresceram no campo da natureza, no seu mais alto grau de cultivo — os traços mais amáveis que a natureza pode apresentar— devem ser inteiramente rejeitados no santuário de Deus. "Não se ungirá com ele a carne do homem, nem fareis outro semelhante conforme a sua composição: santo é,e será santo para vós. O homem que compuser tal perfume como este, ou que dele puser sobre um estranho, será extirpado dos seus povos". Não deve haver imitação da obra do Espírito: tudo tem que ser do Espírito: inteiramente e realmente do Espírito. Demais, aquilo que é do Espírito não deve ser atribuído ao homem:"... o homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las, porque elas se discernem espiritu­almente" (1 Co 2:14).
Num dos cânticos dos degraus há uma alusão magnífica a este azeite da unção. "Oh! quão bom e quão suave é", diz o salmista, "que os irmãos vivam em união! É como o óleo precioso sobre a cabeça, que desce sobre a barba, a barba de Arão, e que desce à orla das suas vestes" (Sl 133:1- 2). Os próprios vestidos do chefe da casa sacerdo­tal, depois de ele haver sido ungido com o azeite da santa unção, devem mostrar os seus preciosos efeitos. Que oleitor possa experi­mentar o poder desta unção, e conhecer o que é ter "a unção do Santo" e ser selado com o Espírito Santo da promessa! (lJo2:20;Ef 1:13). Nada tem valor, segundo a apreciação de Deus, salvo aquilo que está ligado com Cristo, e tudo aquilo que estiver assim ligado com Ele pode receber a santa unção.


O Perfume bemTemperado, Puro e Santo

No último parágrafo deste capítulo, tão rico em ensinos, temos o "perfume temperado, santo e puro". Este perfume precioso apre-senta-hos as perfeições incomensuráveis e ilimitadas de Cristo. Não é prescrita a quantidade de cada ingrediente, porque as virtudes de Cristo, as belezas e perfeições que se acham concentradas na Sua adorável Pessoa, são ilimitadas. Só a mente infinita de Deus pode medir as perfeições infindas d'Aquele em quem habita a plenitude da Divindade; e durante o curso de toda a eternidade essas gloriosas perfeições continuarão a desenrolar-se à vista dos santos e anjos prostrados em adoração. De vez em quando, à medida que novos raios de luz emanam desse Sol de glória divina, os átrios do céu, nas alturas, e os vastos campos da criaçãoabaixo dos céus, ressoarão com vibrantes Aleluias Aquele que era, e que é e que sempre será o objeto de louvor de todas as classes de entes criados com inteligência.
Porém não só não era prescrita a quantidade dos ingredientes que entravam na composição do incenso, como é dito que de cada um será igual o peso. Cada aspecto de beleza moral achou em Jesus o seu lugar e a sua justa proporção. Nenhuma quantidade se interpunha ou se chocava com a outra; tudo era "temperado, puro e santo" e exalava um odor tão fragrante que ninguém senão Deus podia apreciá-lo.
"E dele, moendo, o pisarás, e dele porás diante doTestemunho, na tenda da congregação, onde eu virei a ti; coisa santíssima vos será". Existe um significado profundo e extraordinário na expressão "o pisarás". Ensina-nos que cada simples movimento na vida de Cristo, cada uma das mais pequenas circunstâncias, cada ação, cada palavra, cada olhar, cada gesto, cada rasgo, cada feição do Seu rosto, esparge um odor produzido por proporção igual—o peso de todas as virtudes que compunham o Seu caráter era igual. Quanto mais pisado era o perfume, tanto mais se manifestava a sua rara e esquisita composição.
"...O incenso que farás conforme a composição deste, não o fareis para vós mesmos; santo será para o Senhor. O homem que fizer tal como este para cheirar será extirpado do seu povo". Este perfume fragrante estava destinado exclusivamente para o Senhor. O seu lugar estava "diante do testemunho". Existe em Jesus alguma coisa que só Deus pode apreciar. De certo, todo o coração crente pode aproximar-se da Sua incomparável Pessoa e achar inteira satisfação para os seus mais ardentes e profundos desejos; contudo, depois de todos os remidos terem esgotado a medida da sua compreensão, depois de os anjos terem contemplado em êxtase as glórias imaculadas do homem Cristo Jesus, tão ardentemente quanto a sua visão lhes permite, existe n'Ele qualquer coisa que só Deus pode profundar e apreciar. Nenhuma visão humana ou angélica poderia jamais discernir devidamente cada partícula desse perfume primo­rosamente " pisados". A terra tampouco podia oferecer uma esfera própria à manifestação do seu divino e celestial poder.


Resumo

Assim, pois, chegámos, no nosso rápido estudo, ao fim de uma parte distinta do livro do Êxodo. Começamos pela "arca do concer­to" até que chegámos ao "altar do cobre"; retrocedemos do altar de cobre e chegámos à "santa unção"; e oh! que divagação esta, se tãb somente for feita à luz infalível do Espírito Santo, em vez da companhia vacilante da luz da imaginação humana!
Que divagação, contanto que seja feita não por entre as sombras de uma dispensação que acabou, mas no meio das glórias e das poderosas atrações do Filho de Deus, representadas por estas coisas! Se o leitor ainda não fez esta divagação, verá mais do que nunca o seu afeto atraído para Cristo se a fizer; terá uma maior concepção da Sua glória, da Sua beleza, da Sua excelência e do Seu poder para sanar a consciência e satisfazer o coração sedento; os seus olhos estarão fechados para as atrações do mundo e os ouvidos não prestarão atenção às pretensões e promessas da terra. Em suma, estará pronto a pronunciar o amém fervoroso às palavras do após­tolo (1 Co 16:22), quando disse: "SE ALGUÉM NÃO AMA AO SENHOR JESUS CRISTO SEJA ANÁTEMA; MARANATA" (¹).
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(¹) É interessante notar o lugar que ocupa este anátema aterrador. Acha-se no final de uma longa epístola, no decorrer da qual o apóstolo teve de reprimir alguns pecados dos mais grosseiros e vários erros de doutrina. Quão solene e significativo é, portanto, o fato de que quando anuncia o seu anátema não o lança contra aqueles que haviam introduzido esses erros e pecados, mas sim contra todo aquele que não ama ao Senhor Jesus Cristo. Por que é isto assim' É acaso porque o Espírito de Deus faz pouco caso dos erros ou pecados' Seguramente que não; toda a epístola nos revela os Seus pensamentos quanto a estes males. A verdade é que quando o coração está cheio de amor para com o Senhor Jesus Cristo, existe uma salvaguarda positiva contra toda a espécie de falsa doutrina e má conduta. Se alguém não ama a Cristo não se pode calcular quais as ideias que possa adoptar ou o caminho que possa seguir. Logo, a forma do anátema e o lugar que ocupa na epístola.

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