sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

O VERDADEIRO AMOR




Efésios 5:25-33

Até aqui estivemos examinando o que o apóstolo diz às esposas; agora chegamos ao que ele tem para dizer aos maridos. Isto se vê na notável declaração que ele faz desde o verso 25 até o fim do capítulo. É notável em dois aspectos importantes: naquilo que ele nos fala dos deveres dos maridos e, mais notável ainda, no que nos fala da relação do Senhor Jesus Cristo com a Igreja cristã. Aqui, nesta parte essencialmente prática desta epístola, repentinamente ele nos lança a mais sublime e maravilhosa declaração, jamais feita por ele em parte alguma, acerca da natureza da Igreja cristã e da sua relação com o Senhor Jesus Cristo. Vocês podem observar que, ao tratar desta questão de esposos, e de como estes devem portar-se com suas esposas, ele trata também desse outro assunto, e de ambos trata desta maneira maravilhosa.
As duas coisas, vocês verão, estão entrelaçadas; assim, nosso primeiro trabalho será chegar a algum tipo de divisão de matéria. Ele passa de um assunto para o outro, e depois volta ao primeiro. Muitas vezes é esse o seu método; nem sempre faz uma exposição completa de um lado e o aplica; ele dá uma parte sua exposição, aplica-a, e depois outra parte, e a aplica. Sugiro esta classificação: nos versículos 25,26 e 27 ele nos diz o que Cristo fez pela Igreja, e por que o fez. Depois, nos versos 28 e 29, dá nos uma dedução preliminar disso quanto ao dever de um marido para com a sua esposa, especialmente em termos da união que subsiste entre Cristo e a Igreja, e o marido e a esposa. Depois, numa parte do verso 29 e nos versos 30 e 32 desenvolve a sublime doutrina da união mística entre Cristo e a Igreja. E então, nos versos 31 e 33, tira s deduções práticas finais.
Parece-me ser essa a análise dos versos que estamos estudando. No entanto, para podermos captar o seu ensino mais claramente, sugiro que focalizemos desta maneira: primeiro, iniciamos com a sua injunção geral: “Vós maridos, amais vossa mulheres”. É o que ele deseja acentuar acima de tudo. Noutras palavras, a idéia determinante com respeito ao marido deve ser o amor. Vocês se lembram de que a idéia determinante com respeito às esposas era a sujeição - “Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos”. Sujeição da parte mulher, amor da parte do marido! Devemos ver isso com clareza. Naturalmente não significa que é só o marido que deve amar. Alguém poderia observar: “Paulo não diz uma palavra aqui sobre as mulheres amarem seus maridos”. Dizer isso é entender de maneira completamente equivocada o objetivo do apóstolo. Ele não nos está dando aqui um tratado exaustivo sobre o matrimônio. Em sua idéia da sujeição da esposa o amor está implícito. Devemos entender o que o apóstolo está interessado em fazer. Realmente, o seu interesse se concentra num único ponto básico, a saber, harmonia, paz e unidade como se mostram na relação conjugal e no lar. Sendo esse o seu tema dominante, ele apanha nos dois lados o elemento que precisa ser ressaltado acima de todos os demais. O que se requer que a mulher mantenha sob sua atenta vigilância, na manutenção da harmonia, é o elemento da submissão; ao passo que o esposo deve velar pelo elemento de amor. Assim, Paulo toma a principal característica, a principal contribuição que cada um dos parceiros deve fazer neste magnífico relacionamento que pode demonstrar a glória da vida cristã com tanta clareza. Portanto, a mensagem dirigida aos maridos é: “Amai vossas mulheres”.
Isto é sumamente importante, particularmente em conexão com o ensino anterior. Ele salvaguarda o ensino anterior, e é importante que o vejamos desse modo. Ele esteve salientando que o marido “é a cabeça da mulher, como também Cristo é a Cabeça da igreja”. Vimos que o marido está na posição de liderança, que ele é o senhor da esposa. Esse é o ensino do Velho e do Novo Testamentos, e o apóstolo esteve dando ênfase a isto. Mas imediatamente acrescenta: “Vós, maridos, amai vossas mulheres”, como que dizendo ao marido: “Você é a cabeça, é o líder, é, por assim dizer, o senhor neste relacionamento; todavia, uma vez que ama sua esposa, a liderança nunca se tornará uma tirania e, embora seja “senhor”, nunca será um tirano”. Essa é a conexão que há entre os dois preceitos.
Isto se encontra muito geralmente no ensino do Novo Testamento. Deixem-me dar um exemplo. De muitas maneiras, o melhor comentário sobre esta matéria é o que se encontra na Segunda Epístola de Paulo a Timóteo, capítulo lº, verso 7, onde ele diz: “Porque Deus não nos deu o espírito de temor, mas de fortaleza, e de amor, e de moderação” (disciplina). Temos aí a mesma coisa outra vez. “Deus não nos deu o espírito de temor.” Bem, o que é que Ele deu? “O espírito de fortaleza” (ou “de poder”); mas, para que ninguém pense que isso é algo tirânico, ele acrescenta, “e de amor”. É o poder do amor. Não é um poder nu e cru, não é o poder de um ditador, ou de alguém um tanto tirano, não se está pensando aí num homem que se arroga certos direitos, pisa nos sentimentos da esposa e noutras coisas, e se assenta no lar como um ditador. Num estudo anterior me referi ao que talvez seja o maior defeito da perspectiva vitoriana da vida, e mesmo do seu cristianismo; e era justamente isso. Tendiam a acentuar um lado em detrimento do outro. E muitos dos nossos problemas hoje se devem a uma reação, a uma violenta e exagerada reação contra a falsa ênfase daquele período particular.
Portanto, devemos manter sempre este equilíbrio. Precisamos lembrar-nos de que o poder deve ser temperado pelo amor; deve ser controlado pelo amor, é o poder do amor. Nenhum marido tem direito de dizer que é a cabeça da esposa, se não ama a sua esposa. Se não for assim, ele não estará cumprindo a injunção bíblica. Estas coisas andam juntas. Noutras palavras, é uma manifes­tação do Espírito, e o Espírito Santo não outorga somente poder, mas outorga amor e também disciplina. Assim, quando o marido exerce o seu privilégio de cabeça da esposa e de chefe da família, ele o faz deste modo. Ele deve ser sempre dominado pelo amor e pela disciplina. Deve disciplinar-se a si próprio. Pode haver a tendência de agir como ditador, mas ele não deve fazê-lo - “fortaleza (“poder”), amor, moderação” (disciplina). Tudo isso está implícito, na passagem em foco, nesta grande palavra, “amor”.
Assim, o governo do marido terá que ser um governo de amor; é uma liderança de amor. Não é a idéia de um ditador; não um caso de (falou, está falado). Não, é o poder do amor, é a disciplina do Espírito, resguardando este poder, esta autoridade e esta dignidade que são outorgados ao marido. Essa é, evidentemente, a idéia fundamental e determi­nante em toda esta questão - “Maridos, amai vossas mulheres”.
Agora, no entanto, podemos começar a considerar em geral o caráter ou a natureza desse amor. Isto de novo é muito necessário nos tempos atuais. Há duas coisas que sobressaem com grande evidência no mundo de hoje - o abuso da idéia de poder, e o abuso maior ainda da idéia de amor. O mundo nunca falou tanto de amor como fala hoje em dia. Entretanto, será que já existiu uma época em que houve menos amor? Estes termos grandiosos se rebaixaram tão completamente que muitos não têm idéia do significado da palavra “amor”.
Maridos, amai vossas mulheres.” Que é este amor? Afortunadamente para nós, o apóstolo no-lo diz; e o faz de dois modos. “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja.” Há duas definições aí. A primeira está na própria palavra “amor”. A própria palavra que o apóstolo empregou aqui para “amor” é sumamente eloqüente em seu ensino e em significado. Na língua grega, como era falada nos dias do apóstolo Paulo, ha três palavras que podem ser traduzidas pela palavra “amor”. É muito importante que possamos discernir claramente as diferenças que há entre elas; porque grande parte do frouxo modo de pensar hoje nesta esfera é devida à incapacidade de avaliar isto. Uma das três - e esta não ocorre no Novo Testamento – é a palavra “eros”, que descreve um amor inteiramente ligado à carne. O adjetivo “erótico”, comumente empregado hoje, lembra-nos do conteúdo da palavra. Certamente é uma espécie de amor. Todavia é um amor ligado à carne, é desejo, é algo carnal; e a característica desse tipo de amor é que ele é egoísta. Ora, não é necessariamente errado por ser egoísta, mas essa espécie de amor é essencialmente egoísta; nasce, como digo, do desejo. Ele deseja algo, e nisto coloca o seu maior interesse. Esse é o seu nível. É, por assim dizer, a parte animal do homem. E é isso que geralmente passa por “amor” no mundo atual. O mundo se gloria em seus “maravilhosos” romances, e nos conta como eles são magníficos. Nada se diz, notem isto, acerca do fato de que o homem foi infiel à sua esposa, e vice-versa, e que filhos pequenos vão sofrer. Outro “maravilhoso romance” entrou na vida do homem e da mulher amante. Não se menciona que ambos têm sobre si a culpa do rompimento dos seus votos e de profanarem a santidade; o que se publica é este maravilhoso “jogo do amor”, este maravilhoso romance! Vê-se esse tipo de coisa nos jornais todos os dias. Isso não passa de desejo erótico, egoístico, carnal,. Mas quero fazê-los lembrar-se de que “eros” é certamente considerado pelo mundo atual como sendo amor.
Quanto às duas palavras geralmente traduzidas por “amor” no Novo Testamento, uma delas na verdade significa “gostar de”. Entra como raiz em palavras como “filantrópico” e “Filadélfia”. A ilustração clássica do seu empre­go acha-se no último capítulo do Evangelho de João, no incidente que narra como Pedro e os outros foram pescar de noite e, voltando-se, de repente viram o Senhor Jesus na praia. Ali Ele preparou um desjejum para eles, e começou a falar-lhes. Lemos o seguinte: “... disse Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de Jonas, amas-me mais do que estes? E ele respondeu: sim, Senhor; tu sabes que te amo. Disse-lhe: apascenta os meus cordeiros”. Pois bem, o ponto interessante aí e que quando Pedro diz, “Tu sabes que te amo”, emprega a expressão: “Tu sabes que gosto de ti”. O Senhor, empregando a terceira palavra, que não estudamos ainda, pergunta-lhe se ele de fato O ama, mas Pedro responde: “Tu sabes que gosto de ti”. Tornou a dizer-lhe segunda vez: “Simão, filho de Jonas, amas-me? Disse-lhe: sim, Senhor; tu sabes que gosto de ti” - “Disse-lhe: apascenta as minhas ovelhas”. Então chegamos ao verso 17: Disse-lhe terceira vez: “Simão, filho de Jonas, amas-me?” Aqui o Senhor Jesus faz uma coisa muito interessante, não emprega a mesma palavra que empregara; agora utilizava a palavra empregada por Pedro. Disse-lhe terceira vez: “Simão, filho de Jonas, realmente gostas de mim?” Baixou o nível da Sua idéia. “Realmente gostas de mim?” “Simão entristeceu-se por lhe ter dito pela terceira vez: amas-me? e disse-lhe: “Senhor, tu sabes tudo; tu sabes que eu te amo”. Pedro entristeceu-se porque o Senhor parecia duvidar de que gostava dEle; assim, tendo em vista o seu recente fracasso, só podia confiar-se ao conhecimento do Senhor e dizer-lhe: “Tu sabes que eu te amo”. Mas tenhamos em mente que a palavra traduzida por “amar” pode significar “gostar de”.
A outra palavra do Novo Testamento eleva-se a muito maior altura. É a palavra sempre empregada na Bíblia para expressar o amor de Deus por nós. “Deus amou o mundo de tal maneira” - “agapao”. Ora, esta é a palavra empregada no texto que estamos considerando. “Maridos, amai vossas mulheres” neste sentido, amar como Deus ama. Não existe nada mais elevado que isto. Ou, expressemo-lo doutra maneira. Tomemos a lista que descreve o fruto do Espírito, em Gálatas 5:22. O apóstolo está fazendo um contraste entre as obras da carne e o fruto do Espírito, e diz: “O fruto do Espírito é caridade” (ou “amor”), não uma sensação erótica, nem meramente gostar de, mas o amor que se assemelha ao amor de Deus - amor, gozo, paz, etc. Esse é o amor, diz o apóstolo, que os maridos devem ter e mostrar para com as suas mulheres. Vocês vêem como tudo isso se articula tão perfeitamente com o verso 18: “E não vos embriagueis com vinho, em que há contenda, mas enchei-vos do Espírito”. Se estivermos cheios do Espírito, estaremos cheios do fruto do Espírito, e o fruto do Espírito é “amor”.
O apóstolo está se dirigindo a pessoas cheias do Espírito, pois somente estas podem mostrar este amor. É ocioso dizer isto ao não cristão. Ele é incapaz disso; não pode amar com esta classe de amor. Mas diz o apóstolo que os cristãos devem manifestar esta espécie de amor porque estão cheios do Espírito. Portanto, uma das maneiras pelas quais demonstro que estou cheio do Espírito, não é tanto que eu experimente êxtases e manifeste certos fenômenos; é a maneira como me porto com minha esposa quando estou em casa, é este amor que é “o fruto do Espírito”.
A própria palavra que o apóstolo escolhe induz-nos imediatamente à precisa idéia que almeja transmitir. Permitam-me, pois, expressá-la nestes termos: coloquemos em foco toda esta questão de casamento e de relação conjugal. Não estou dizendo que o apóstolo ensina que aquele primeiro elemento pertencente à carne não deve entrar nisso. Esse entendimento é erro completo. Há gente que ensina isso. O ensino católico romano concernente ao celibato baseia-se, em última análise, nesse falso conceito. Tenho visto que há muitos cristãos com dificuldades sobre a questão. Parecem pensar que o cristão deixou de ser humano, deixou de ser natural; e consideram o sexo mal. Ora, isso não somente não é ensino cristão; é um engano, um erro. Esse elemento de “eros” deve entrar, está incluído. O homem é homem. Deus o fez assim. Deus nos deu os dons que temos, o sexo inclusive. Nada há de errado no elemento erótico propriamente dito; de fato vou além, e digo que ele deve estar presente. Refiro-me a isto porque com freqüência me pedem que trate destas coisas. Conheço cristãos que com muita sinceridade, em vista deste errôneo conceito sobre o sexo e daquilo que é natural, chegaram mais ou menos conclusão de que qualquer cristão pode desposar qualquer mulher cristã. Dizem que a única coisa que importa e conta agora é que são cristãos. Omitem completamente o elemento natural. Mas a Bíblia não age assim. Embora cristãos, está certo sentir-nos mais atraídos por uma pessoa do que por outra. O natural entra em conta, e não devemos excluí-lo. Jamais devemos assumir posição de que qualquer de nós pode casar-se com qualquer outro. Poderiam viver juntos, mas isso seria excluir o elemento natural.
Tenho-me esforçado bastante para mostrar que o ensino cristão não elimina o natural, o modo como fomos criados. E Deus nos criou de molde a cada um sinta mais atração por uma pessoa do que por outra; e isso é mútuo, está certo; não o ponhamos de lado. Isso está sendo suposto aqui. O apóstolo pressupondo que este homem e esta mulher estão casados porque se sentiram mutuamente atraídos, porque, se preferirem, para usar a frase comum, “se apaixonaram”. Os cristãos devem portar-se desse modo, como toda gente, não é algo mecânico. O cristão não diz: “Agora que sou cristão, vou dar uma olhada por aí e resolver com quem me casarei”, com a cabeça fria, por assim dizer. Não é esse o ensino bíblico. Isto pode parecer excêntrico e divertido para alguns, mas há muitos cristãos que agem baseados exatamente nesse princípio. Falo com base na minha experiência pastoral. São pessoas sinceras, porém, considerando o sexo um mal, tomam esta posição falsa. Não obstante, não devemos excluir o natural. O apóstolo está pressupondo que este homem e esta mulher sentiram esta atração mútua, e que, com base nisso, contraíram núpcias.
Mais que isso, o apóstolo pressupõe que ambos gostam um do outro. O que quero dizer é que eles gostam da companhia um do outro. Deixem-me acentuar que isso também faz parte do casamento cristão. Há certas afinidades naturais, e as ignoramos, para nosso risco. De novo, muitas vezes vejo isto. Duas pessoas imaginavam que, porque são cristãs, nada mais importa, e se casam firmadas nisso. Contudo, na vida conjugal é muito importante que as duas pessoas gostem uma da outra. Se não, se se casarem apenas com base no fator físico, logo se acabará. Esse casamento não tem nada que o faça perdurar; mas, por outro lado, um dos fatores da permanência é que ambos gostem um do outro. Há certos imponderáveis no estado matrimonial. É bom que os cônjuges tenham as mesma afinidades, os mesmos interesses, sintam-se atraídos pelas mesmas coisas. Não importa quanto se amem, se houver diferenças fundamentais neste sentido, isto levará a problemas. O problema da vida conjugal e da vida em harmonia será muito maior. É importante, digo eu, que este segundo elemento, a expressão que Pedro insistiu em usar, “gosto de ti”, desempenhe o seu papel.
O apóstolo está pressupondo ambas as considerações. É provável que alguns cristãos tivessem contraído núpcias enquanto eram pagãos, e que o seu casamento incluísse tanto “eros” como “phileo”. Muito bem, afirma Paulo, aí é que entra o cristianismo. Agora, uma vez que vocês se tomaram cristãos, entra o elemento adicional; e este eleva os outros dois, santifica-os, dá-lhes glória, dá- lhes esplendor. Essa é a diferença que Cristo produz no casamento. Somente o cristão pode subir a este nível. Podem existir casamentos felizes e bem sucedidos sem isto; ainda existem, graças a Deus. Há casamentos felizes ao nível humano e natural, e se baseiam nos fatores expressos nas duas primeiras palavras de que tratei. Se se tomar o primeiro elemento, mais este gostar um do outro, e um certo temperamento, pode-se produzir casamentos muito felizes e bem sucedidos. Mas nunca chegarão a este nível superior. Todavia, é a este ponto que o apóstolo quer que nos elevemos. Acima de tudo o que é possível ao homem natural, entra em ação este amor verdadeiro, este amor que é de Deus, o amor definido em 1 Coríntios capítulo 13.
É claro que, ao escolher a palavra, o apóstolo nos diz muita coisa. É, portanto, dever de todo marido que ouve ou lê esta exortação, examinar-se à luz desta palavra. Estão presentes em você os três elementos? Acaso tudo é coroado e glorificado por este “amor” que só pode ser atribuído ao próprio Deus?
No entanto, para não ficarmos em dificuldade em relação a isto, o apóstolo passa a dar-nos mais uma ilustração, no segundo ponto que ele defende. Diz ele: “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também” - “como também Cristo amou a igreja”. Aqui, de novo, ele mostra quão desejoso está de ajudar-nos. A simples menção do nome de Cristo o leva imediatamente a desenvolver a proposição. Ele não pode limitar-se a dizer pura e simplesmente, “Como também Cristo amou a igreja”, ele tem que prosseguir e dizer, “e a si mesmo se entregou por ela, para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, para a apresentar a si mesmo, igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível”. Ele diz tudo isso para ajudar o marido a amar sua esposa como deve.
Então, por que ele desenvolve a matéria deste modo? Creio que há três razões principais: a primeira é que ele quer que cada um de nós conheça o grande amor de Jesus por nós. Ele quer que compreendamos a verdade acerca de Cristo, de nós mesmos e de nossa relação com Ele. Por que é que ele se preocupa com tudo isso? Transparece este seu argumento: é somente quando compreendemos a verdade sobre a relação de Cristo com a Igreja, que podemos realmente agir como os maridos cristãos devem agir. Para que isto fique claro, ele termina dizendo: “Grande é este mistério; digo-o, porém, a respeito de Cristo e da igreja”. Mas por que ele está falando a respeito de Cristo e da Igreja? Por que nos levou a esse mistério? A fim de que os maridos saibam amar suas esposas. E é aqui que as pessoas levianas e superficiais, que zombam da doutrina, põem à mostra a sua insensatez e a sua ignorância. “Ah”, dizem elas, “aquela gente está interessada só em doutrina; nós somos pessoas práticas.” Entretanto você não pode ser prático sem doutrina; você não pode amar de verdade a sua esposa, se não compreende alguma coisa desta doutrina acerca deste grande mistério. “Ah”, dizem outras, “é muito difícil, não conseguirei seguí-la.” Todavia, se você quiser viver como cristão, terá que seguí-la, terá que aplicar sua mente a isso, terá que pensar, estudar, que entender, que agarrar-se a isso. Essa verdade aqui está para você, e se você lhe der as costas, estará rejeitando uma coisa que Deus lhe dá, e você estará sendo um terrível pecador. Rejeitar a doutrina é um pecado terrível. Jamais coloque a prática contra a doutrina, porque você não poderá ter a prática sem ela. Daí o apóstolo dar-se ao trabalho de elaborar esta magnífica doutrina acerca da relação de Cristo com a Igreja, não somente para expô-la, por importante que seja, mas para que eu e você, em nossos lares, possamos amar nossas esposas como devemos - “como também Cristo amou a igreja”.
Assim, agora podemos examinar o problema da seguinte maneira: o princípio que deve determinar a nossa prática é que o relacionamento entre marido e mulher é, na essência e por natureza, a mesma relação que existe entre Cristo e a Igreja. Então, como abordá-la? Devemos começar estudando a relação entre Cristo e a Igreja e, depois, somente depois, poderemos examinar a questão do relacionamento entre o marido e a esposa. Isso é o que o apóstolo está fazendo. “Vós, maridos, amai vossas mulheres, como também Cristo amo a igreja.” Dito isto, ele nos fala exatamente como Cristo amou a Igreja. Então ele diz: vão e procedam de igual modo; essa é a primeira regra. Essa é a primei grande doutrina.
Começamos, pois, considerando a relação de Cristo com a Igreja. Eis aqui algo que interessa a todos; não somente aos maridos, mas a todas as pessoas. 0 que nos é dito a respeito da relação de Cristo com a Igreja é verdade quanto cada um de nós. Cristo é o esposo da Igreja, Cristo é o esposo de cada crente individual. Vocês perguntarão: onde você vê este ensino? Vejo-o, por exemplo, na Epístola aos Romanos, capítulo 7, verso 4: “Assim, meus irmãos, também vós estais mortos para a lei pelo corpo de Cristo, para que sejais doutro (AV: “para que desposeis outro”), daquele que ressuscitou dentre os mortos, a fim de que demos fruto para Deus”. Cristo é o esposo da Igreja, a Igreja é a esposa de Cristo. Cada um de nós pode, nesse sentido, ver no Senhor Jesus Cristo o nosso esposo, e, da mesma forma, coletivamente, como membros da Igreja cristã.
Que nos diz o apóstolo sobre isto? A primeira coisa que ele fala é sobre a atitude do Senhor Jesus Cristo para com a Igreja, sobre como Ele a vê. Aí há instrução para os maridos. Qual é a sua atitude? Como você vê a sua esposa? Precisamente aqui o apóstolo nos diz algumas coisas maravilhosas. Amados irmãos, porventura dão-se conta de que estas coisas são verdadeiras quanto a vocês, na qualidade de membros da Igreja cristã? Observem as características da atitude do Senhor Jesus para com a Sua esposa, a Igreja. Ele a ama: “como também Cristo amou a igreja”. Que expressão eloqüente! Ele a amou apesar de sua indignidade, Ele a amou apesar das deficiências que a caracterizam. Observem o que Ele fez por ela. Ela precisa ser lavada, purificada. Ele viu os seus andrajos, a sua vileza; mas amou-a. Esse é o ponto culminante da doutrina da salvação. Ele nos amou, não por alguma coisa que visse em nós; amou-nos a despeito do que havia em nós, “sendo nós ainda pecadores”. Ele amou ímpios, amou-nos quando ainda éramos “inimigos” (Rm 5:8,10). Em toda a nossa indignidade e vileza, Ele nos amou. Amou a Igreja, não porque fosse gloriosa e bela - não; mas para poder tomá-la tal. Dêem atenção à doutrina, e vejam o que ela tem para dizer aos maridos. O marido se depara com deficiências e dificuldades, coisas que ele acha que pode criticar em sua esposa, mas deve amá-la “como Cristo amou a igreja”. Essa é a espécie de amor que ele deve demonstrar. Isso basta quanto ao primeiro princípio.
O segundo princípio é o seguinte: “e a si mesmo se entregou por ela”. Não somente estava pronto a sacrificar-Se por ela. Sacrificou-se de fato por ela. Tal é o amor de Cristo pela Igreja! Ele só poderia salvá-la dando a Sua vida por ela; e a deu. Essa é a característica do Seu amor.
A seguir, atentem para o Seu grande interesse por ela e por seu bem-estar. Ele olha por ela. Preocupa-Se com ela. Ele vê as possibilidades dela, por assim dizer. Deseja que ela seja perfeita. Por isso Paulo prossegue: “Para a santificar, purificando-a com a lavagem da água, pela palavra, para a apresentar a si mesmo igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante, mas santa e irrepreensível”. Vocês vêem como Ele Se interessa por ela, como a ama, como Se orgulha dela. São essas as características do amor de Cristo pela Igreja - este grande desejo de que ela seja perfeita. E Ele não ficará satisfeito enquanto ela não for perfeita. Ele quer poder apresentá-la a Si mesmo “igreja gloriosa, sem mácula, nem ruga, nem coisa semelhante”. Quer que ela seja perfeita, além de toda crítica. Quer que o mundo inteiro a admire. Por isso lemos no capítulo 3 desta epístola, no versículo 10, que Cristo fez isso tudo “para que agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus”. É o orgulho do esposo por Sua esposa; Ele Se orgulha da sua beleza, da sua aparência, de tudo que lhe diz respeito; quer mostrá-la à família, a todas as Suas criaturas. Essa é a espécie de relacionamento que existe entre o Senhor Jesus Cristo e Sua Igreja. Primeiro estou extraindo o princípio dos pormenores, porque estes nos ajudam a entender esta relação maravilhosa e mútua. E, assim, a figura é do Senhor Jesus alegrando-Se na relação, feliz nela, triunfante nela, gloriando-Se nela. Não há nada que Ele não faça por Sua esposa, a Igreja.
Essa é a primeira grande matéria que emerge na abordagem apostólica deste vasto e elevado assunto. Temos de começar com esta figura de Cristo e a Igreja. Vocês vêem como Ele a considera, e o que Ele fez por ela por considerá-la desse modo, o que Ele tem em vista para ela - Seu objetivo final. E em razão disso há este extraordinário conceito da relação mística, da união mística, a idéia de que eles são uma só carne, e de que ela é o Seu corpo. “Vós, maridos amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja”.
Aí está, pois, o nosso primeiro grande princípio - Cristo ama a Igreja. O relacionamento entre Cristo e a Igreja é aquela que deve existir entre marido e mulher. Assim, comecem com isso. Examinem a grande doutrina da Igreja. Venham todos vocês, casados e não casados. Essa verdade diz respeito a todos nós, porque estamos na Igreja. Que maravilha, perceber que estamos nessa relação com Cristo! É assim que Ele os vê, essa é a Sua atitude para com vocês. Este é o princípio: este amor, este amor divino é absolutamente superior ao erótico e ao filantrópico - o mais alto que o mundo pode conhecer. A grande característica deste amor divino - e é nisto que ele é essencialmente diferente dos outros - é que é mais governado pelo desejo de dar do que de ter. “Deus amou o mundo de tal maneira”. Como? “Que deu”. Não há nada de errado com outros tipos de amor - já o tenho dito - porém, mesmo quando os temos em melhor expressão, eles são sempre autocentralizados, estão sempre pensando em si mesmos. Mas a característica do amor cristão é que não pensa em si mesmo. Cristo entregou-Se; morreu pela Igreja - “até à morte”. O sacrifício caracteriza este amor. Este amor é um amor que dá; não está sempre considerando o que vai ter, mas o que pode dar em benefício do outro. “Vós, maridos amai vossas mulheres, como também Cristo amou a igreja.”
Tendo, assim, examinado em geral a atitude de Cristo para com a Igreja, podemos agora começar a mostrar como essa atitude se manifesta na prática. Depois veremos o Seu objetivo final e, por último, a relação e união mística. Demos graças a Deus porque, ao considerarmos o casamento, que é tão comum e, aparentemente, vulgar, descobrimos, se somos cristãos, que temos considerá-lo de tal maneira que nos leva ao próprio centro da verdade cristã, ao cerne da teologia e da doutrina, aos mistérios de Deus em Cristo, como se vê na Igreja e através dela. Queira Deus abençoar-nos nessa consideração!












A ANALOGIA DO CORPO




Efésios 5:22-24

O apóstolo nos dá dois grandes motivos particulares pelos quais as esposas devem sujeitar-se a seus maridos. consideramos o primeiro deles, segundo o qual esta questão pertence à ordem da natureza. Diz ele: “Porque o marido é a cabeça da mulher”; Deus ordenou isto quando fez o homem e a mulher no princípio; e vimos como o Novo Testamento não só confirma isso, mas constantemente retorna a essa ordenança original de Deus.
Ora, nisso tudo ainda não dissemos nada de peculiar e especificamente cristão. Que se trata de ensino do Velho Testamento, todos devem reconhecer, sejam cristãos ou não. Isto é uma ordenação de Deus com relação à integralidade da vida. Assim como reconhecemos a família, devemos reconhecer isto. O Deus que ordenou a família ordenou o casamento; e assim como devemos sujeitar-nos ao estado devemos dar ouvidos a esta fundamental ordenação de Deus quanto às posições relativas dos esposos e das esposas, e ao relacionamento que deve substituir entre eles. Pois bem, até aqui tudo isso é geral. O fato de sermos cristãos não significa que não temos necessidade do Velho Testamento. Ele continua sendo um alicerce; edificamos sobre ele; é por isso que o apóstolo o coloca em primeiro lugar.
Mas agora ele passa ao seu segundo motivo, peculiarmente cristão: “O marido é a cabeça da mulher”. Em seguida vem o acréscimo cristão: “como também Cristo é a cabeça da igreja”. Isto nos leva mais adiante; não elimina; primeiro, mas lhe acrescenta algo, e na verdade nos ajuda a entender o primeiro É isso que a fé cristã faz com relação à vida, em todos os seus aspectos. Só o cristão pode apreciar realmente a vida em geral neste mundo. Quero dizer que em última análise, somente o cristão pode realmente desfrutar a natureza. O cristão vê a natureza de maneira diferente do homem do mundo. Há urra novidade aqui. Ele não vê apenas a coisa em si; vê o grande Criador e a maravilha dos Seus métodos, a variedade, a cor, a beleza. Noutras palavras, ser um cristão significa que toda a perspectiva da vida é enriquecida. Não importa qual seja, todo e qualquer dom que o homem possua e que manifeste, só poderá ser verdadeiramente apreciado pelo cristão. Ele enxerga com maior profundi­dade, tem entendimento mais completo. Isto é, a mensagem cristã não apenas nescenta algo ao que já tínhamos, mas enriquece o que tínhamos e nos dá um rscemimento mais profundo disso. Aqui veremos que este acréscimo especi­ficamente cristão não somente nos ajuda a compreender a ordem da natureza já estabelecida, mas, além e acima disso, acrescenta uma nova qualidade, outro aspecto, por assim dizer, outra ênfase a toda a questão.
Eis a proposição: “o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo! A cabeça da igreja: sendo ele próprio o salvador do corpo”. O que estamos vendo aqui é uma coisa que só o cristão pode entender; ninguém mais. A pessoa que não crê no Senhor Jesus Cristo e não conhece o caminho da salvação, obviamente não pode entender o que as Escrituras querem dizer quando afirmam: “Cristo é a cabeça do corpo, que é a igreja”. Não tem sentido para ela; não entende absolutamente nada disso. Portanto, tal pessoa não pode compreender este conceito especificamente cristão do casamento. Esta é uma dedução da doutrina cristã da Igreja; portanto, se a pessoa não entender a doutrina cristã da Igreja, segundo o apóstolo ela não poderá entender totalmente o conceito cristão do casamento.
Isto logo nos leva a tirar certas conclusões. A primeira é que, obviamente, fumais o cristão deve casar-se com pessoa não cristã. Lemos na Segunda Epistola aos Coríntios: “não vos prendais a um jugo desigual com os infiéis” (2 Co 6:14). Indubitavelmente nós temos aí uma referência a esta questão do casamento. Se precisávamos de uma razão para aceitar a exortação em foco, temo-la aqui. Se crente se casa com não crente, a situação resultante será que um dos cônjuges terá este elevado conceito cristão do matrimônio, ao passo que o outro o ignorará completamente. Já haverá um defeito no casamento. Não serio os dois um só; não estarão entrando no novo estado da mesma maneira; já haverá uma divisão. Já haverá uma semente de discórdia, como o apóstolo o monstra naquela mesma proposição de 2 Coríntios capítulo 6.
A segunda dedução que tiro é que um serviço cristão em conexão com o casamento só é apropriado para cristãos. Este é um tema amplo, e faz parte do tema da disciplina da Igreja cristã. A situação tomou-se caótica, e às pessoas que ignoram totalmente o cristianismo é oferecida uma cerimônia nupcial religiosa cristã na qual é lida esta proposição apostólica sobre o marido como cabeça da esposa “como Cristo é a cabeça da igreja”. Isto não significa absolutamente nada para elas. Deduzo, pois, que não se deve fazer isso. Não devemos ensinar alta doutrina cristã aos não cristãos; a estes devemos pregar tão somente o arrependimento e a necessidade da fé. Eles não têm a menor possibilidade de entender a doutrina concernente ao matrimônio. A pessoa tem que estar na vida cristã antes de poder entendê-la. Portanto, eu argumento no sentido de que uma cerimônia nupcial cristã deve ser reservada única e exclusivamente para nistãos. Realizá-la para outros é fazer dela uma farsa.
Em terceiro lugar, deduzo que tal cerimônia é apropriada e correta, e deve ser admitida e dirigida quando os que se casam são cristãos. O que quero dizer e ;sto: alguns dos puritanos, há 300 anos, em sua violenta reação contra o atolicismo romano, decidiram que não deveria haver nenhum serviço religioso relacionado com o casamento. O casamento, diziam eles, não passa de um contrato legal. Pois bem, podemos muito bem entender sua reação, e esta conta com a nossa simpatia. A igreja romana ensinara (e ensina) a falsa e antibíblica idéia de que o matrimônio é sacramento, pelo que os puritanos achavam que deviam afastar-se tão longe quanto pudessem dessa idéia. Daí, não quiseram ter nenhum tipo de cerimônia religiosa. Mas, certamente, à luz do ensino dc apóstolo aqui, isso foi um erro completo! A reação foi demasiado violenta; foi tão violenta que se tornou antibíblica. Há aspectos do casamento que requerem um serviço religioso - o ensino e o entendimento desta porção particular daí Escrituras, e outros pontos. E como o ensino é que o matrimônio é uma coisa comparável à união mística entre Cristo e Sua Igreja, digo que é boa ocasiãc para culto e para uma cerimônia verdadeiramente cristã. O casamento não é apenas um contrato legal, e devemos ter todo o cuidado, como estive assinalan­do, de não permitir que pessoas cujo pensamento é errôneo governem o nossc pensamento e a nossa conduta. O cristão jamais deve ser apenas uma reação contra alguma coisa; ele deve ser positivo, deve ser bíblico. Mas há aqueles que, em sua aversão ao catolicismo romano, vão tão longe para o outro lado que acabam negando as próprias Escrituras que dizem defender.
Contudo, permitem-me asseverar que, embora o conceito cristão do casamento sugira aquelas três coisas, não ensina aqui, nem em nenhum outra lugar, como os católicos romanos ensinam, que o matrimônio é um sacramen:: Não há nenhum ensino, em parte alguma da Bíblia, que dê apoio a essa idéia. Desafio quem quer que sej a a mostrar uma passagem das Escrituras que o faça. O matrimônio não é sacramento. Então, qual é o ensino? E aquele que é dac: aqui, a saber, esta idéia da união mística. A relação entre marido e mulher, e entre mulher e marido, é comparável à relação entre Cristo e a Igreja, e a Igreja e Cristo. Para nosso conforto, o apóstolo diz mais tarde: “Grande é este mistério!” A relação entre Cristo e a Igreja é um mistério. É um fato, mas é u~ grande mistério - esta união mística entre a Igreja e Cristo, e o crente individual e Cristo. Mas, sendo um fato, devemos procurar entendê-lo cada vez mais. Paulo afirma que a relação entre marido e esposa, e esposa e marido, fl comparável a esse fato. Pertence a essa ordem, e essa é a maneira pela qual devemos começar a pensar nela. Aqui somos introduzidos na esfera desta ala doutrina concernente à Igreja cristã.
O apóstolo, com sua mente lógica, sabe que não deve haver dificuldade sobre isso nas mentes destes efésios, porque já os ensinara sobre essa mes doutrina. Ele o fizera no capítulo primeiro da epístola, onde, no fim, ele ora sentido de que eles conheçam “a sobreexcelente grandeza do seu poder” — d: poder de Deus para com eles. Explica que se trata do poder que Deus “manifestou em Cristo, ressuscitando-o dos mortos... E sujeitou todas as coisa; a seus pés, e sobre todas as coisas o constituiu como cabeça da igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos”. Lá Paulo os introduzira na doutrina da Igreja; aqui ele a está aplicando. Quem corre para o fim da epístola sem ler o começo, sempre erra. O que temos aqui são deduções. Ele fizera a mesma coisa de novo, e acrescentara um pouco mais à definição, me capítulo 4, versículos 15 e 16, onde lemos: “Antes, seguindo a verdade em raridade, cresçamos em tudo naquele que é a cabeça, Cristo, do qual todo o corpo, bem ajustado, e ligado pelo auxílio de todas as juntas, segundo a justa operação de ele extrai esse ensino para que eles possam compreender a verdadeira natureza do casamento cristão.
Qual é o ponto? É essencialmente este: ele está salientado a união orgânica, a união vital, a relação íntima. Ele se referira a “ligações de supri­mento” (lit., grego) no capítulo 4:16, àquelas “bainhas”, por assim dizer, os nervos e as artérias que levam alimento da cabeça, do centro, a todos as partes do corpo. Essa é uma maneira de ressaltar esta união orgânica e vital que existe nutre um esposo e sua esposa. É uma só vida, e uma só vida da mesma maneira que a vida da Igreja em sua relação com a Cabeça, que é Cristo. Aqui, naturalmente, o apóstolo está particularmente interessado num aspecto disso tudo, no aspecto da dependência: “Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos, como ao Senhor; porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja”. Ele está tratando deste aspecto de dependência e submissão, e introduz mais este elemento para que tenhamos um claro entendimento de como ele entra, e porque inevitavelmente entra na composição do assunto. Mais adiante ele irá tratar do outro lado da questão, do marido com respeito à esposa.
Ao considerarmos esta grande afirmação, somos logo confrontados por um problema. Vejamo-la de novo: “Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja: sendo ele próprio o salvador do carpo”. O problema que tanto ocupa a atenção dos comentadores, e com razão, é este: por que o apóstolo acrescenta esta outra afirmação? Por que não diz: o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da Igreja... Portanto, como a Igreja é sujeita a Cristo, assim as esposas sejam em tudo sujeitas a seus maridos? Por que será que ele acrescentou: “sendo ele próprio o salvador do corpo”? Há aqueles - e constituem a maioria, incluindo até grandes nomes como, por exemplo, Charles Hodge - que não hesitam em dizer, neste ponto, que este é um acréscimo puramente independente, e que a referência do apóstolo, quando diz, “sendo ele próprio o salvador do corpo”, é, evidentemen­te, que o Senhor Jesus Cristo é o Salvador da Igreja. Dizem eles, ainda, que isso nada tem que ver com o marido. Então, por que Paulo o diz? Bem, dizem eles, Paulo disse isso por esta razão: ele se incumbira de declarar que o marido é a cabeça da mulher, como Cristo é a cabeça da Igreja, e a simples menção do nome de Cristo o leva a bradar: “e ele é o salvador do corpo”. Isso nada tem que ver com aquilo sobre o que ele está argumentando no momento, mas a simples menção do nome de Cristo o leva a dizer esta coisa maravilhosa. Portanto, eles argumentam que esta é uma frase independente, e que não se aplica ao relacionamento do marido com sua esposa.
Mas a argumentação deles não se restringe a isso. Eles têm outro argumento, a que atribuem grande importância. Baseia-se na palavra traduzida por “portanto” no início do versículo 24. 0 versículo diz: “Portanto, assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos”. Eis o ponto que defendem aqui: dizem eles que a tradução “portanto” é completamente errada; e, de fato, têm razão nisso. Mas, então, eles vão adiante e afirmam que a tradução deveria ser, “não obstante”. E uma expressão de contraste, e sempre apresenta um contraste. Daí, afirma que deveríamos ler a frase deste modo, ou de modo semelhante a este: “Pois o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja, e ele é o Salvador do corpo”. “Não obstante” - embora isso não seja verdade quanto ao marido, com respeito à esposa, apesar disso - “as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos”. Daí acham que o caso é incontestável; que, noutras palavras, o apóstolo diz: “Ora, quando digo que Ele é o Salvador do corpo, esqueci por um momento a minha analogia da relação de Cristo e a Igreja, e a do marido e sua esposa - “Não obstante” - apesar disso, embora não seja verdade na esfera do marido e sua esposa, as mulheres devem suj eitar-se a seus maridos, assim como a Igreja é sujeita a Cristo”.
No meu modo de ver, há uma resposta adequada a toda esta argumentação. Em primeiro lugar, ela limita o sentido da palavra “salvador”. Este vocábulo nem sempre tem o sentido de entregar Cristo Sua vida pela Igreja, com Seu sangue derramado. Este é o sentido comum (no linguajar cristão), mas não é o único; existe um sentido mais amplo do temor “salvador”. Há um exemplo disto na Primeira Epístola a Timóteo, capítulo 4, verso 10: “Porque”, diz o apóstolo, “para isto trabalhamos e lutamos, pois esperamos no Deus vivo, que é o salvador de todos os homens, principalmente dos fiéis”. Ora, é essa mesma palavra que é empregada aqui, sobre “o salvador do corpo”. Lá se nos diz que Deus, o Deus vivo, é o salvador de todos os homens, principalmente dos fiéis. Vocês não podem dizer que isto significa que todos os homens gozam a salvação num sentido espiritual, porque, nesse caso, vocês seriam universalistas. Natu­ralmente, não podem! Pois bem, então, significa que lá a palavra “salvador” tem outra significação. Quer dizer “preservador” - aquele que olha por, que cuida de. Ele é o Preservador de todos os homens, principalmente dos que crêem. Lembra-nos o Senhor que Deus “faz que o seu sol se levante sobre maus e bons, r a chuva desça sobre justos e injustos” (Mt 5:45); sim, Ele dá alimento a todos. É neste sentido que Ele é o salvador de todos os homens. Assim, por que não atribuir esse sentido à palavra “salvador” aqui? Ele é Aquele que cuida do corpo e o protege. Essa é a réplica que vocês podem apresentar contra o citado argumento.
Mas eu tenho ainda outras razões para rejeitar a exposição que limita esta pequena frase unicamente ao Senhor Jesus Cristo e Sua obra salvadora. Minha segunda razão é a seguinte; meu argumento é que os versículos 28 e 29, que vêm em seguida, militam em prol da nossa interpretação desta frase como se aplicando ao marido e à esposa, como também a Cristo e à Igreja. Paulo diz: “Assim devem os maridos amar a suas próprias mulheres, como a seus próprios corpos. Quem ama a sua mulher, ama-se a si mesmo. Porque nunca ninguém aborreceu a sua própria carne”. Bem, que faz ele? “Antes a alimenta e sustenta” - sim, age como seu salvador, cuida dela, preserva-a. “Porque nunca ninguém aborreceu a sua própria carne; antes a alimenta e sustenta, como também o Senhor à igreja”, que é o Seu corpo - etc. Diz ele que o marido deve tratar sua esposa como sua própria carne, seu próprio corpo. Ele não negligencia o seu corro, mas o alimenta e o sustenta. Noutras palavras, ele é “o salvador do corpo”. Quão importante é tomar o versículo sempre em seu contexto! Mesmo os intérpretes famosos podem cair neste ponto. Eu argumento que esses dois versículos propugnam esta outra interpretação aqui, e que esta não é uma frase isolada e independente, só válida com referência ao Senhor Jesus Cristo. Paulo ainda está falando sobre esposos e esposas: “Porque o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja: sendo ele próprio o salvador corpo”. Isto é verdadeiro em ambos os casos.
Portanto, julgo que, com base em todos esses pontos, devemos rejeitar a interpretação que diz que esta é uma frase independente, e que se refere unicamente ao Senhor. Na verdade, por assim dizer, seria completamente sem propósito neste ponto; seria uma confusão. O apóstolo não é dado a fazer esse tipo de coisa. Assim, o que lemos é, pois, que “o marido é a cabeça da mulher, como também Cristo é a cabeça da igreja: sendo ele próprio o salvador do corpo”. Então - “assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus maridos.”
Qual é, então, a doutrina? Evidentemente é esta: a esposa é guardada, preservada, velada, defendida e sustentada pelo seu esposo. Essa é a relação - como Cristo alimenta e sustenta a Igreja, assim o esposo alimenta e sustenta sua esposa - e a esposa deve compreender que essa é a sua posição neste rela­cionamento. O marido é o preservador, o salvador do corpo. A esposa deve começar com esta idéia, e deve agir sempre à luz disso.
Mas podemos ir além. Qual a relação do corpo com a cabeça? O que é verdade sobre a Igreja em relação a Cristo, é verdade sobre a esposa em relação ao esposo. Tomemos a ilustração que Paulo usa aqui e nos exemplos que dei anteriormente sobre a Igreja como o corpo de Cristo, tais como os de 1 Co, capítulo 12, e Rm, capítulo 12. Qual é o ensino? A esposa é para o esposo o que o corpo é para a cabeça, o que a Igreja é para Cristo. É de novo a idéia de “complemento”. O essencial no conceito cristão do matrimônio é esta idéia de integralidade, de inteireza. Encontramo-la em Gênesis, capítulo 2 - “adjuntora que esteja como diante dele” (“adjuntora própria para ele”), tirada de Adão, parte dele; sim, mas complementando-o, compondo uma integrali­dade. Essa é precisamente a idéia que você tem inevitavelmente quando pensa no seu corpo, no corpo como um todo. O corpo não é uma coleção de partes, não é um certo número de dedos, mãos e pés grudados uns nos outros, e de membros vagamente interligados. Essa noção do corpo é completamente falsa. O corpo é uma unidade orgânica, vital; é uno; é um todo. Pois bem, essa é a idéia que temos aqui. O marido e sua mulher não são separados, não são como dois reinos que mantêm relações diplomáticas, mas sempre em estado de tensão, e sempre correndo o risco de entrar em conflito. Esse é o exato oposto do conceito cristão daquilo que o casamento realmente é. Cristo e a Igreja são um, como o corpo e a cabeça são um. Mas este ideal coaduna-se com diferentes funções; e é isso que devemos entender - funções diferentes, propósitos diferentes, deveres especiais que somente cada parte pode cumprir. Mas é vital lembrar-nos de que cada parte é parte de um todo, e que todas as ações separadas são parte integrante de uma ação unificada que leva a um resultado incorporado.
Permitam-me desenvolver isto, irmãos, um pouco mais minuciosamente com o fim de esclarecer esta questão do estado e relação matrimonial. Como isto é importante! Já dei algumas razões disso. Creio que muita irreligiosidade dos dias atuais é, em parte, uma reação contra aquele tipo de vida vitoriana na qual muitos maridos e esposas pareciam ser grandes cristãos, porém dos quais o povo dizia: “Se vocês os conhecessem em sua vida privada!” Nada causa maior dano ao cristianismo do que a pessoa não ser a mesma coisa na igreja e no lar, ou na rua e no escritório. E no lar que se conhece realmente um homem. Quais são as relações ali? Por essa razão estas coisas são importantes, não somente pelo que são em si mesmas, mas como parte do nosso testemunho geral como cristãos.
Então, que é que isto nos ensina sobre o relacionamento entre a esposa e o esposo nesta questão de sujeitar-se? Parece claro que não ensina uma pura e simples passividade; a esposa não deve ser inteiramente passiva. E uma interpretação errônea desta convivência dizer que a esposa nunca deve falar, nunca deve dar opinião, mas deve ficar muda ou calada e completamente pusiva. Isso é forçar uma analogia e ilustração a ponto de deixá-la sem sentido. Mas o que significa é isto: a esposa jamais deve tomar-se culpada de ação iimce pendente. A analogia do corpo e da cabeça reforça isso. O que compete ao mte c corpo não é agir independentemente de mim. Eu é que resolvo agir com minha mente, meu cérebro e minha vontade. Meu corpo é o meio pelo qual eu o expresso. Se o meu corpo se puser a agir isoladamente de mim, ficarei sofrendo de uma espécie de “convulsão”. É isto exatamente o que significa “convulsão”: partes do corpo se movem de maneira irracional. Não é uma ação feita com algum propósito; ele não quer que elas ajam, mas não pode detê-las; agem independentemente da sua mente e da sua vontade. Isso é caos, é convulsão. Aqui está a analogia: “Vós, mulheres, sujeitai-vos a vossos maridos; sede em tudo sujeitas e obedientes a vossos maridos”. Por quê? Porque como esposa, e neste relacionamento, você não age independentemente do seu marido. Se o fizer, será o caos será a convulsão.
Ou permitam-me subdividir o ponto ainda mais. A esposa não deve agir antes do marido. O ensino todo indica que ele é a cabeça, é ele que exerce o controle definitivo. Assim, ela não somente não age independentemente dele; não age antes dele. Todavia, deixem-me salientar isso também: assim como é certo dizer que ela não deve agir antes dele, é igualmente certo dizer que ela não pecisa retardar a ação, não deve “fazer cera”, não deve recusar-se a agir. Voltemos à analogia do corpo. Pensemos em alguém que sofreu um derrame. Esta pessoa quer agir, mas o membro está paralisado, de modo que ele não consegue. Embora a pessoa esteja querendo movimento, este não ocorre – o braço não está bem, resiste ao movimento. Esta é uma parte do ensino; a sejeição envolve a idéia de que a mulher não agirá antes do seu marido, nem tampouco retardará nem impedirá a ação, não paralisará a ação. Estes pontos são vitais em todo este relacionamento matrimonial; e é porque as pessoas não percebem e não sabem estas coisas que o casamento está decaindo por toda parte ao redor de nós. Independência, agir antes, não agir, “fazer cera”, recusar-se, é o errado; e tudo isso porque os homens e as mulheres não entendem este conceito cristão do casamento.
Podemos resumi-lo assim: o ensino é que a iniciativa e a liderança cabem em última instância ao marido, mas a ação deve ser sempre coordenada. É esse : sentido dessa figura - ação coordenada, mas a cabeça execendo a liderança. Isto não sugere nenhum sentimento de inferioridade. A esposa não é inferior ao marido; é diferente. Ela tem a sua própria e peculiar posição, cheia de honra e respeito. Por isso, depois, o homem recebe a incumbência de alimentar e sustentar sua esposa, amá-la e cuidar dela, respeitá-la e honrá-la. Isto não e - volve inferioridade. O que Paulo está ensinando é que toda mulher cristã que dg mpreender tudo isso, gostará de agradar seu marido, ser-lhe benéfica, auxiliá- lo, assessorá-lo, habilitá-lo a exercer as suas funções. Não estará fingindo quando prometer “obedecer” (ou “ser submissa”) durante a cerimônia nupcial. Que coisa triste! - recentemente um amigo me contou que um clérigo que ia ministrar numa cerimônia matrimonial dissera que não ia usar a expressão “e obedecer”. Achava que estava sendo moderno, que com isso atrairia “os homens da rua” - mostrando que, afinal de contas, o cristianismo não é estreito! Ele não percebeu que estava rejeitando a doutrina bíblica. E quão completamente incoerente tais pessoas são! Suponho que um homem como esse, se estivesse num jogo de futebol, se gabaria do espírito de equipe. Embora estejam jogando individualmente e todos tenham habilidade, os jogadores dão de si dizendo que só um deles é o capitão. Cada um deles diz: “Não sou o capitão, eu me submeto ao capitão”. Isso é maravilhoso, é o espírito de equipe; cada jogador obedece ao capitão. Mas vocês não diriam isso com relação ao casamento! Isso é deprecia­tivo para a mulher, é antiquado, é Paulo, é o fariseu duro, isso é legalismo, é o Velho Testamento! Entretanto, isso nega a doutrina toda, e é até incoerente em sua pseudo-modemidade. A esposa cristã, compreendendo estas coisas, quer dizer, “e obedecer-lhe” (“e ser-lhe submissa”), “amá-lo, cuidar dele e obedecer- lhe”. Naturalmente! Por que está se casando? Não seria para constituir “uma só carne”, uma integralidade? Não seria para partilhar esta ação coordenada, esta inteireza, que deve ser demonstrada ao mundo? Isso não é escravidão; é viver como a Igreja vive com relação ao seu Senhor; isso manifesta o espírito essencial do cristianismo.
Mas, deixem-me dizer uma palavra final. Observaram que o fim da exortação é, “De sorte que (então, agora então), assim como a igreja está sujeita a Cristo, assim também as mulheres sejam em tudo sujeitas a seus marido”? “Em tudo”! Realmente seria isso que significa? Aqui respondemos de novo em termos da analogia das Escrituras em sua inteireza. Quando as Escrituras fazem uma ampla e geral afirmação como essa, sempre esperam que a interpretemos à luz do seu próprio ensino. Assim, quando lemos aqui a afirmação de que a esposa deve ser sujeita a seu marido em tudo, equivale exatamente a dizer que o cristão deve ser sujeito ao Estado, aos poderes que existem, como em Rm capítulo 13 e noutros lugares. Significaria então, que a esposa terá que fazer literalmente tudo que o seu marido lhe disser que faça, em todas as circunstâncias e condições? Claro que não! Isso seria declarar ridículas as Escrituras. Há condições aqui. Quais? Eis uma delas: uma regra fundamental das Escrituras é que ninguém, homem ou mulher, jamais deve agir contra a própria consciência. Dentro da relação conjugal, dentro dos termos do casa­mento, o marido não tem direito de mandar na consciência da sua esposa.
Aqui poderíamos citar um bom número de casos deveras interessantes. Às vezes há muita confusão entre obedecer à consciência e manter uma opinião. Não são a mesma coisa. As Escrituras nos exortam a obedecer à consciência em todas as circunstâncias; isso porém não é a mesma coisa que ficar agarrado à própria opinião. Deixem-me dar uma ilustração disto. Da leitura do livro do Dr. John Macleod sobre a teologia escocesa, lembro-me de um caso muito interes­sante que ensina justamente este ponto. Havia uma discussão na Escócia, no século dezoito, sobre a relação do cristão com o governo local, e uma parte da igreja dividiu-se em duas seções, conhecidas como as seções “Cidadão” e “ “Anticidadão”. Foi tema de grande controvérsia. Havia um ministro, de nome James Scott, cuja esposa era verdadeiramente notável. Seu nome era Alison. Era filha daquele extraordinário homem, Ecenezer Erskine, um dos fundadores da Secessão, na Escócia. Alison tinha personalidade forte e era esposa de um homem competente. Scott e sua esposa discordaram nesse ponto - ele fazendo parte do partido “ Anticidadão” e ela do partido “Cidadão”. Surgiram muitas situações difíceis, e o Sr. Scott participou de uma reunião sinodal que de fato censurou e depôs o pai, o tio e cunhado de sua esposa - ato deveras corajoso da parte dele. Depois disso feito, teve que ir para casa e contar à esposa o que fizera. Em reposta, Alison Scott fez esta famosa declaração: “James Scott, você continua sendo o meu marido, mas não é mais o meu pastor”. E também pôs isso em prática, pois que todo domingo ia uma das igrejas do partido “Cidadão”, e não à igreja na qual o seu marido dirigia o culto e pregava. Que é que vocês fariam com um caso como esse? Eu não hesito em dizer que Alison Scott estava inteiramente errada, porque estava pondo a opinião acima da consciência. Certamente aí está um exemplo em que, por todos os motivos, ela devia ter-se sujeitado à liderança e à direção do seu marido. Não teria violado sua consciência; era pura questão de opinião. Digo e repito que nunca devemos cometer o engano de confundir consciência com opnião. A mulher pode dar opinião, mas quando vê que o seu marido está determinado, deve cumprir a decisão dele.
Permitam-me dar outra ilustração para contrabalançar a que acabei de contar. Uma das mais extraordinárias e comoventes experiências que tive desde que sou pastor da Capela de Westminster, deu-se há uns dezoito meses, se bem ame lembro. Eu estava pregando à noite, no primeiro domingo após o meu regresso das férias de verão; o texto era, “Somos embaixadores da parte de Cristo” (2 Co 5.20). Dei ênfase ao aspecto da vocação do embaixador, e assim por diante. Saí do púlpito para o meu gabinete, e logo me foi conduzida uma mulher que evidentemente estava muito agitada. Disse-me que o sermão tinha sido pregado para ela. Fazia uns dez anos que se casara. O marido sentiu que estava sendo chamado para o ministério e renunciou a seu cargo de professor numa escola. Ela não concordou, de jeito nenhum. Fez tudo que pôde para impedir seu marido, mas este continuou convicto e foi avante em seu propósito, passando a haver uma grave crise em sua vida conjugal. Contudo, durante o culto aquela mulher ficou profundamente convicta sobre a questão, e me procurou para confessar isto e dizer-me que ia correr para o telefone mais próximo e telefonar ao marido, que estava na região oeste do país para submeter-se, no domingo subseqüente, a um exame para entrar no ministério. Ela viu que estivera errada em fincar o pé em sua opinião e, deste modo, opor- se ao propósito de Deus para a vida do marido. Não era consciência; era insistência numa opinião. Digo que jamais devemos violar a consciência, mas também digo que devemos estar prontos a submeter-nos nas questões de opinião. A posição da mulher na relação matrimonial não deve ser pressionada a ponto de levá-la a ir contra a sua consciência; tampouco deve ela permitir que o seu marido a leve a cometer pecado. Se o marido estiver tentando fazer que a esposa cometa pecado, ela deverá dizer: “Não!” Não dizer isso é tomar as Escrituras ridículas. Se o marido perdesse o equilíbrio mental e se tomasse insano, evidentemente ela não lhe obedeceria em tudo. As Escrituras nunca são ridículas; as Escrituras trazem em seu conteúdo o seu sentido; e aí estão estes limites inevitáveis.
O quarto ponto que defendo é que a esposa não deve sujeitar-se a seu marido a ponto de deixá-lo interferir em sua relação com Deus e com o Senhor Jesus Cristo. Até este limite ela deve fazer tudo, mas isso não!
Finalmente, o adultério rompe o relacionamento conjugal; e se o marido se fizer culpado de adultério, a esposa não estará mais obrigada a prestar-lhe obediência em tudo. Poderá divorciar-se dele; as Escrituras lhe permitem agir assim. Terá o direito de fazê-lo porque o adultério rompe a unidade, rompe o relacionamento. Estarão separados daí em diante, e deixarão de ser um só. Ele terá rompido a unidade, desfazendo-se da união. Portanto, não devemos interpretar esta porção das Escrituras como se ensinasse que a mulher está irrevogável e inevitalmente presa a um marido adúltero pelo resto da sua vida. Ela pode resolver que sim - cabe a ela decidir. Tudo que estou dizendo é que esta passagem bíblica não manda isso, não o torna inevitável. Noutras palavras, há certos limites para estas questões.
Aí estão, pois, como as vejo, as principais deduções desta ilustração maravilhosa. A grande verdade salientada é que a esposa deve ir até os últimos limites da sujeição ao seu marido, por amor a Cristo e pelas razões dadas, sob pena de violar os princípios que acabamos de formular. À esposa que acaso esteja em dificuldades nesta questão, tomo a liberdade de sugerir certos auxílios práticos. Se você está em dificuldade, faça a si mesma as seguintes perguntas: por que me casei com este homem? O que aconteceu? Isso não poderia ser reparado? Procure recuperar aquele objetivo, no espírito de Cristo e do evangelho. “Ah, mas é impossível”, você dirá, “não conseguirei”. Bem, então digo-lhe: como cristã tenha pena do homem, ore por ele. Ponha em prática o ensino do apóstolo Pedro, em sua primeira epístola, capítulo 3, onde ele diz claramente às esposas que sejam sujeitas a seus maridos, e não somente aos que são cristãos: “Vós, mulheres, sede sujeitas aos vossos próprios maridos; para que também, se alguns não obedecem à palavra, pelo porte de suas mulheres sejam ganhos sem palavra; considerando a vossa vida casta, em temor”. Tente pôr isso em prática; procure ganhar seu marido com humildade e mansidão. “O enfeite delas não seja o exterior, no frisado dos cabelos, no uso de jóias de ouro, na compostura de vestidos; mas o homem encoberto no coração; no incorrup­tível trajo de um espírito manso e quieto, que é preciso diante de Deus.” Faça tudo que puder, vá até aos limites, vá além dos limites mínimos estabelecidos por estes princípios. E, finalmente, faça a si mesma esta pergunta: poderei sinceramente comparecer, com minha atual atitude e condição, perante o Senhor que apesar de mim, da minha vileza e da minha pecaminosidade, veio do céu, enfrentou a cruz do Calvário e Se entregou ali por mim? Se você puder encará-lO tudo bem; nada terei que dizer. Mas se você sentir condenada em Sua presença, quanto à sua atitude, quanto ao seu relacionamento nalgum aspecto, vá acertar isso. De maneira que, quando voltar a Ele de novo, estará com a consciência tranqüila, com espírito aberto, e poderá regozijar-se em Sua santa presença.  Esta é uma questão cristã; é semelhante à relação da Igreja com Cristo, o corpo e a cabeça. Tão logo vejamos as coisas nestes termos, não haverá problemas; isso é um grande privilégio, é uma coisa que Deus contempla com agrado e prazer. “Vós, mulheres, sede sujeitas” - “um espírito manso e quieto, que é precioso diante de Deus”, e, por mais que você tenha que sofrer aqui na terra, sua recompensa no céu será grandiosa.